Fábio Espejo, presidente da Puma no Brasil (Foto/Divulgação)
São Paulo - Qualquer esportista sabe que as conquistas são fruto de trabalho duro e paciência. Foi com essa máxima que a fabricante alemã de produtos esportivos Puma conseguiu reverter o mal momento visto até 2013, em que o lucro e a participação de mercado estavam em queda, e voltar a competir à altura dos demais jogadores.
Desde 2013, quando o ex-jogador de futebol norueguês Bjorn Gulden assumiu a presidência global do grupo para fazer a reestruturação, a primeira ordem foi repensar design e portfólio de produtos para resgatar a essência esportiva que havia perdido e, com isso, reconquistar consumidores. A participação da Puma no mercado de roupas e calçados esportivos ainda está bem atrás dos concorrentes - segundo a consultoria Euromonitor, no Brasil detém apenas 2,4% das vendas ao consumidor, bem atrás das líderes Adidas (19,1%) e Nike (19,0%). O mesmo também se vê no global. Mas a expectativa é de que 2018 seja o ano da virada: globalmente, espera aumentar em 10% a receita, no mínimo, e o Brasil deve crescer ainda mais.
Assim como em outros países a liderança também foi trocada no Brasil e Fabio Espejo, que havia trabalhado por quase 14 anos na Nike, três na Reebok e antes da Puma estava há quase dois anos como diretor financeiro da Alpargatas na Argentina, assumiu, então, a presidência da companhia no país em agosto de 2014. De lá para cá trocou pessoas, reestruturou o e-commerce, investiu em marketing nos pontos de venda e repensou estratégia de patrocínios. “Nestes quatro anos quase triplicamos nossa participação em alguns segmentos de produtos e crescemos dois dígitos”, diz com exclusividade à EXAME.
Confira a entrevista de Espejo:
EXAME - Você chegou com a missão de comandar uma reestruturação na empresa. Como encontrou a empresa?
Fabio Espejo - Eu sempre acompanhei a Puma, mas como concorrente. Trabalhei na Rebook, Nike e Alpargatas. As marcas esportivas sempre tiveram medo de ir para o casual para não perder sua identidade. A Puma criou esse mercado, de moda esportiva. Ao agregar design aos atributos esportivos, mostrou que esporte poderia estar ligado a um estilo de vida. Mas se perdeu quando passou a focar mais no lifestyle do que em performance. Hoje não há mais essa separação. Quando cheguei, a Puma havia perdido bastante participação de mercado, os poucos patrocínios eram de clubes menores e regionais, não havia embaixadores brasileiros da marca além de atletas e, apesar de já vender pelo site, sua contribuição como canal de vendas era inexpressiva.
A Puma hoje tem uma presença de marca maior no país e ganhou participação de mercado. O que mudou na companhia nesses últimos quatro anos?
Enquanto a estratégia de produto já estava sendo pensada na Alemanha, fiz um plano para o Brasil que envolveu pessoas, processos e resultados. Internamente, tivemos mudanças na direção. Demitimos e contratamos novos funcionários, inclusive alguns que estavam na concorrência. Mudar o time foi importante porque qualquer reestruturação é um trabalho de equipe. Procuramos também os parceiros comerciais e fornecedores para mostrar o novo posicionamento e portfólio de produtos da empresa. Leva um tempo para você trocar tudo e temos um produto perecível. Hoje eu estou vendendo a coleção do segundo semestre de 2019. Tenho que limpar o mercado e trazer novidades. Também investimos mais no ponto de venda em alguns parceiros estratégicos para a marca aparecer mais para o consumidor. A partir daí, mexer no marketing e na operação digital. Outro foco importante foi o e-commerce, que ainda é um canal de vendas pequeno (menos de 10%), mas que dobra de tamanho a cada ano, especialmente entre os jovens. Internamente revimos processos, especialmente da logística, e determinamos metas de resultado para os times. Tudo isso sendo criativos porque não tínhamos muitos recursos para fazer as mudanças necessárias. Tivemos, inclusive, de convencer a matriz de que o Brasil era um país viável. Não foi fácil, mas deu certo. A operação brasileira ainda é pequena perto da Europa e dos Estados Unidos, mas já avançamos e o potencial é enorme. Nestes quatro anos a Puma no Brasil quase triplicou sua participação em alguns segmentos de produtos. Hoje crescemos dois dígitos por ano.
O que mudou em estratégia da marca e do produto?
Não adianta fazer reestruturação se não tiver um bom produto. Parte importante das mudanças da Puma no mundo foi no portfólio de produtos. A empresa percebeu que dá para manter a pegada fashion sem perder a essência esportiva. Moda volta, mas com tecnologia embutida voltada para performance e conforto. Temos trabalhado muito com cocriação de produtos, por exemplo. Os influenciadores e embaixadores nos ajudam a imprimir estilo e atitude para os tênis, roupas e acessórios e nós cuidamos da tecnologia por trás. O design é todo feito na Alemanha, mas nós podemos adaptar algumas coisas para o mercado brasileiro. Ampliamos bastante o número modelos. É muito difícil uma pessoa não se identificar com nada. Atendemos todos os consumidores, do que vai à academia, sai para passear ou jogar futebol. Ouvimos o que o consumidor quer e ele está mais informado e exigente. O próprio marketing mudou para mostrar a nova postura da empresa. No mundo, contratamos a cantora Rihanna como diretora de criação. Ela está com a marca desde 2014 e até ganhou um prêmio de design por seu trabalho. Recentemente o rapper Jay-Z foi anunciado como o novo diretor de criação das operações de basquete da marca. O próprio patrocínio do corredor jamaicano Bolt, um dos mais importantes, estava sendo subaproveitado.
A Puma tem ainda a atriz Bruna Marquezine, a Cantora Ludmila e a apresentadora-mirim Maisa Silva como garotas-propaganda, além de a empresa já ter anunciado uma parceria grande com o clube de futebol Palmeiras para 2019. Qual a estratégia para a marca?
Dois públicos que estamos focando é o jovem e o feminino. Nossas embaixadoras no Brasil se identificam com a causa do empoderamento feminino. Apesar de serem jovens, têm muita atitude. Para nós, estilo e atitude estão diretamente ligados. Do lado do esporte, nós patrocinamos diversos jogadores: o Jadson do Corinthians, Moisés do Palmeiras e Nenê do São Paulo. Mas, pela primeira vez estamos patrocinando um time grande, o Palmeiras, e em um modelo de negócios diferente, em que dividimos mais as despesas, o trabalho e os lucros. Já tínhamos patrocinado times no passado, mas menores e regionais. Mais variável e menos fixo. Cada sucesso, todo mundo ganha mais. Já vínhamos planejando isso desde 2015. Já temos pedidos dos produtos para os Estados Unidos, Europa e América Latina. Vamos trabalhar a internacionalização do clube. Decidimos focar apenas no Palmeiras, mas fazer bem feito. Acreditamos que será suficiente para ter o resultado que esperamos.
O que vocês mais vendem no Brasil?
A linha de sport style é uma das mais fortes, tanto roupa quando calçados. Trabalhar de tênis está na moda. Em seguida vem a linha de corrida e treinos esportivos e, em terceiro, futebol. Obviamente alguns produtos-nicho tem uma procura grande que tem gente que fica sem, como o novo tênis desenhado pelo grupo musical sul-coreano BTS, um fenômeno no mundo. Todo dia recebemos mensagens de fãs perguntando quando vão chegar ao Brasil. Prefiro até não divulgar muito para conseguir atender quem realmente deseja. Calçados ainda é nosso maior negócio, mas vestuário cresce mais rápido. Nossas roupas são mais desejadas do que dos concorrentes. Mas, em geral, todas as categorias têm crescido.
Grande parte dos produtos da Puma são importados. O que a empresa fez para driblar a alta do dólar?
Algumas linhas, como chuteiras, podem chegar a 40% de produção local. O custo Brasil pesa nesta decisão também. Agora com o Palmeiras teremos uma produção local maior, mas, mesmo assim, a maior parte do que vendemos aqui é desenhada na Alemanha e fabricada em outros mercados. Contudo, não posso planejar meu negócio só em função do dólar. É preciso pensar no médio e longo prazos. Todas as marcas têm o mesmo desafio de se proteger da variação e equilibrar a produção local com a importada. Quem não faz isso sofre. Sempre acontece algo que pode impactar o negócio, por isso precisa estar preparado.
Quais os planos da Puma Brasil para o ano que vem?
O mais importante da estratégia que construímos nos últimos quatro anos é consistência. A gente acredita que mantendo o foco no ponto de venda, no consumidor através dos nossos embaixadores, e ter produtos e sortimento que atendem ao gosto brasileiro, vamos continuar crescendo dois dígitos. Ano que vem devemos crescer ainda mais. Se neste ano, mesmo com a crise, já estamos em um ritmo forte, ano que vem, sem fazer loucura, vamos avançar mais. Não vamos aumentar freneticamente a distribuição porque queremos controlar a demanda. Não faríamos nada que possa colocar a companhia em risco, mas estamos bem confiantes. Vemos que o consumidor brasileiro já voltou a se identificar com a marca.