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Na Ford, menos carros e mais verde

Michele Loureiro O ano de 2016 não foi nem de longe tranquilo para as montadoras instaladas no Brasil. Com o mercado encolhendo 20,2%, em sua quarta queda anual consecutiva, os volumes chegaram a 2 milhões de veículos vendidos – quase a metade dos 3,8 milhões vistos em 2012. Mas uma outra mudança chamou a atenção […]

FORD: “Os SUVs são um segmento top de vendas nos Estados Unidos”, disse Mark LaNeve, vice-presidente de marketing, vendas e serviços da Ford nos EUA / Mark Blinch/ Reuters (Mark Blinch/Reuters)

FORD: “Os SUVs são um segmento top de vendas nos Estados Unidos”, disse Mark LaNeve, vice-presidente de marketing, vendas e serviços da Ford nos EUA / Mark Blinch/ Reuters (Mark Blinch/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 31 de janeiro de 2017 às 16h15.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.

Michele Loureiro

O ano de 2016 não foi nem de longe tranquilo para as montadoras instaladas no Brasil. Com o mercado encolhendo 20,2%, em sua quarta queda anual consecutiva, os volumes chegaram a 2 milhões de veículos vendidos – quase a metade dos 3,8 milhões vistos em 2012. Mas uma outra mudança chamou a atenção dos mais atentos: pela primeira vez em 40 anos, a Ford não participou do grupo das quatro maiores montadoras e ficou apenas com a sexta posição de mercado. Tragédia?

Não é o que diz a Ford. Para a companhia, o resultado foi uma estratégia de pisar no freio. Em entrevista exclusiva a EXAME HOJE, Rogelio Golfarb, vice-presidente de Assuntos Corporativos da Ford América do Sul, afirmou que com menos pessoas comprando carros em decorrência da crise econômica, as vendas diretas – aquelas realizadas para locadoras de veículos e empresas, com descontos relevantes – aumentaram de forma expressiva no ano passado. “Tomamos a decisão deliberada de não participar da escalada das vendas diretas com o objetivo de proteger a rentabilidade do negócio”, diz. Mesmo assim, globalmente a Ford teve redução de 37,5% no lucro líquido ao longo do ano na comparação com 2015, para 4,6 bilhões de dólares.

Na última década, as vendas diretas representaram em média 25% do volume comercializado no Brasil. O índice encerrou 2016 em 33,6%, o mais alto já verificado no mercado. Para Milad Kalume Neto, gerente da consultoria especializada em mercado automotivo Jato Dynamics, o alto volume deteriora margens do setor, uma vez que os descontos para empresas e locadoras ficam na casa dos 20%. “O índice acima de 30% não é vantajoso para o mercado”, diz. Isso porque, além de comprometer as margens das montadoras, os carros vendidos para locadoras por valores mais baixos também impactam nas contas das concessionárias. “As locadoras repassam parte dos descontos na hora de comercializar os seminovos e acabam canibalizando o mercado das revendas tradicionais”, diz o gerente.

“Nós continuamos protegendo o mix de produtos. A ideia não é vender apenas os carros compactos. Um dia a indústria vai voltar a crescer e queremos estar bem posicionados”, diz Goldfarb. O executivo destaca que os modelos de maior valor agregado tiveram um bom desempenho no ano passado. “O Focus hatch e o Fusion são líderes em seus segmentos e a picape Ranger está crescendo constantemente. Estamos trabalhando uma estrutura de mix mais equilibrada para o futuro”, afirma.

Ao se descolar das vendas diretas, a Ford aceitou o risco de perder a quarta posição do ranking. E perdeu mesmo, como se sabe. No ano passado, a Ford comercializou 180.225 carros, 73.389 a menos que em 2015. A queda chegou a 29%, bem acima do mercado. A participação da montadora americana caiu de 10,2% para 9% e a companhia foi ultrapassada por Hyundai e Toyota. Sem mergulhar nas vendas diretas, o Ka, modelo com maior volume da montadora, vendeu 13.572 unidades a menos no ano passado. Mesmo assim ficou com a terceira posição entre os carros mais vendidos de 2016, com 76.615 unidades. Já o Fiesta, que era o 17º modelo mais vendido em 2015 caiu para a 30ª posição no ano passado, com uma retração de 57,6% e apenas 16.986 unidades vendidas.

E agora?

Segurar as margens pode ser positivo para a sustentabilidade do negócio. Desde, claro, que quando o mercado retomar a empresa tenha uma estratégia para recuperar o espaço perdido. A Ford afirma saber exatamente como reconquistar o coração e a mente dos brasileiros – tecnologia.

Com a tendência já observada nos Estados Unidos e em países da Europa de que os jovens não teriam mais tanto desejo de adquirir carros, a montadora quer mostrar que veículos eficientes, conectados e econômicos podem evitar que esse comportamento se repita no Brasil. A Ford é a única montadora de grande volume que cumpriu as exigências do programa Inovar-Auto, programa de eficiência energética do governo.

Segundo Golfarb, pensar no futuro é uma obsessão. A montadora é pioneira em sistemas como o assistente de emergência, que faz ligações para o Samu em casos de acidentes e de navegação, o Sync. Além disso, a questão da sustentabilidade ganhou força nos últimos anos. Com o Inovar-Auto, programa do governo lançado em 2012 para proteger a indústria nacional e ampliar a eficiência energética dos carros vendidos no país, a Ford deu um salto de qualidade.

De acordo com a montadora, os índices previstos pelo programa foram atingidos com o esforço da engenharia nacional. “Fomos a única montadora de grande volume a ultrapassar os limites previstos pelo programa. Para nós, isso é um Oscar. Investimos na questão da redução de emissões e melhoria energética”, afirma. Além da Ford, apenas Nissan e Audi cumpriram as medidas estipuladas pelo Inovar-Auto.

Entre as melhorias realizadas pela empresa nos últimos anos estão o motor de três de cilindros, usado no Ka, e a tecnologia Ecoboost, que engloba uma série de soluções como sistema de injeção direta de combustível e permite economia de até 20%. O vice-presidente da Ford acredita que o apelo sustentável será um grande aliado na conquista de novos clientes, especialmente os jovens. “Às vezes a mudança de posição no ranking não conta tanto. Tem algumas coisas que valem mais do que isso na cabeça do consumidor, principalmente dos mais jovens, que buscam mais conectividade e mudança de valores”, diz Golfarb.

Neste ano a Ford aposta em lançamentos, sem revelar os segmentos escolhidos, e acompanha as previsões da Anfavea, associação que representa as montadoras, que espera um crescimento modesto do mercado. “Prevemos uma recuperação ligeira, que deve ser concentrada no segundo semestre e resultar em um crescimento de cerca de 4% a 5% no ano”, afirma. Até o dia 26 de janeiro, as vendas do setor estavam caindo 3,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Em média diária, o volume está 13,7% menor neste mês.

Neste cenário, e com essa estratégia, a Ford só pode respirar fundo e esperar a crise passar. Para, se tudo der certo, conquistar os futuros clientes com seus carros mais seguros e menos poluentes. Voltar ao quarto lugar, nesse ritmo, é um sonho distante.

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