Petrobras: disputa entre estatal e companhia italiana pode ser resolvida por um projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso (Paulo Witaker/Reuters)
Reuters
Publicado em 16 de julho de 2018 às 15h59.
São Paulo - Uma importante termelétrica no Ceará está desligada desde o final de junho em meio a uma disputa nos tribunais entre a italiana Enel e a estatal brasileira Petrobras, que fornecia o gás necessário à operação do empreendimento.
A briga começou após a Petrobras exigir um reajuste nos valores do combustível, negado pelos italianos, que entendem que as condições de fornecimento à usina foram estabelecidas por um programa federal de incentivo na década passada e não poderiam ser alteradas, informou a Enel à Reuters.
O chamado Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT) foi criado em 2000, quando o país estava à beira de um racionamento de energia, e previa um preço especial de gás para viabilizar novas usinas térmicas e diversificar a matriz energética do país, então muito dependente das hidrelétricas.
"A Enel sempre atendeu às regras do PPT e entende que todas partes precisam fazê-lo. Nós estamos honrando nossas obrigações sob o PPT no momento, mesmo que a Petrobras não esteja", disse o diretor da Enel para o Brasil, Carlo Zorzoli, em nota.
A Enel chegou a conseguir uma liminar na Justiça que obrigava a Petrobras a fornecer o gás nas condições estabelecidas pelo programa, mas recentemente a decisão foi derrubada, o que levou no mês passado ao desligamento da usina, a Termofortaleza, com cerca de 326 megawatts em capacidade.
"Pelo PPT, a Petrobras é delegada pelo Estado brasileiro a fornecer o gás, então nós não vemos como atender ao PPT sem a Petrobras retomar o fornecimento de gás", adicionou Zorzoli.
Procurada, a Petrobras disse que não iria comentar a situação da termelétrica.
Já a Enel disse estar "confiante" em uma solução negociada com autoridades para o caso, uma vez que a Termofortaleza possui custos menores que grande parte das usinas acionadas para atender à demanda no Brasil no momento, uma vez que chuvas fracas têm reduzido a produção de hidrelétricas e exigido maior uso de geração térmica mais cara.
O diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Luiz Eduardo Barata, disse à Reuters que a térmica da Enel em Fortaleza é uma das mais baratas do país, com um custo de operação de cerca de 140 reais por megawatt-hora.
Atualmente, as usinas térmicas mais caras acionadas para atender à demanda no sistema elétrico têm custo superior a 550 reais por megawatt-hora.
"Seria natural a usina ser despachada, mas neste momento, como a liminar foi revogada, ela não está sendo despachada", apontou Barata.
Ele adicionou que o ONS tem se manifestado em meio ao embate judicial entre as empresas para tentar sensibilizar todas as partes envolvidas sobre a importância de uma saída que permita a retomada das operações da termelétrica.
"Nós nos manifestamos sobre a importância da usina. Nem a favor da Enel, nem da Petrobras, mas pela necessidade de despacho da térmica, principalmente nesse período seco que estamos vivenciando. Não contar com a usina significa despachar uma energia muito mais cara", explicou Barata.
O ONS estima que o volume de chuvas que tem caído sobre o lago das hidrelétricas não deve ser suficiente para permitir o desligamento das termelétricas antes da reta final do ano, quando começa o chamado "período úmido" e há expectativa de melhoria nas precipitações.
A disputa entre Enel e Petrobras pode ser resolvida por um projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso Nacional.
Um projeto originalmente dedicado a reduzir passivos de distribuidoras de energia da Eletrobras que serão privatizadas recebeu de deputados uma emenda que autorizaria repassar para os consumidores, via tarifa, eventual aumento de custos no gás para empreendimentos do Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT).
Se a medida for aprovada no Senado e sancionada pelo presidente Michel Temer, os custos extras de termelétricas como a de Fortaleza seriam bancados pela Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), um fundo abastecido por encargos cobrados nas contas de luz.
O atendimento nessas condições, segundo o projeto, exigiria como contrapartida a desistência pelas empresas de ações judiciais e arbitrais referentes aos contratos de gás natural.