Montagem de veículos da BMW: plano da empresa é estar vendendo no Brasil carros produzidos no país já em setembro de 2014 (Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 11 de agosto de 2013 às 13h54.
Araquari (SC) - Hektik. A palavra que traduz para o alemão o termo "agitação" tem representado o dia a dia do tradicionalmente pacato município de Araquari, ao norte de Santa Catarina. Lar de pouco mais de 24 mil catarinenses tranquilos, Araquari é hoje conhecida como "a cidade do maracujá". A partir deste segundo semestre, porém, mudará de patamar e passará a ser "a sede da BMW".
Uma das maiores montadoras do mundo, a BMW escolheu Araquari para levantar sua primeira unidade de produção de veículos na América Latina. A multinacional e a cidade estão pulando etapas para que, a partir de setembro de 2014, os carros da marca sejam vendidos no País com o selo "made in Brazil".
O terreno de 500 mil metros quadrados que receberá a fábrica tem hoje mais de 200 operários de construção civil trabalhando 24 horas por dia para colocar de pé a fábrica. Mesmo sem ainda produzir um único veículo no País, a BMW já acertou até a sua primeira concessionária, que deverá ser inaugurada em Joinville ainda este ano.
Não é apenas a indústria automobilística que se agita. Araquari sequer tem metalúrgicos, uma vez que os trabalhadores do município ainda serão qualificados para a função, mas a cidade já conta, desde a semana passada, com um sindicato de metalúrgicos filiado à Força Sindical.
Até o início de julho, Araquari não tinha hotel, mas o casal Claudete e Rudgiero Zanella Jasper resolveu apostar e levantou o primeiro da cidade. Mesmo sem ter sido oficialmente inaugurado, o que só deve ocorrer no mês que vem, o novo hotel já causou alvoroço: com cinco andares, o edifício é o mais alto de Araquari.
Investimento
A agitação não é sem razão. O investimento de R$ 500 milhões da montadora alemã na cidade representa, de uma vez só, uma injeção de recursos que supera em 40% o total de riquezas produzidas em Araquari - o Produto Interno Bruto (PIB) da cidade é de R$ 297,3 milhões, segundo dados do IBGE.
Na cidade, o assunto único é a BMW. "Estamos ansiosos, né? A cidade não tinha nada, e agora terá uma empresa dessas. Araquari vai mudar muito", disse Adejanilson Alves, comerciante que deseja emplacar os dois filhos, de 22 e 18 anos, como funcionários da fábrica.
Este também é o desejo de Samuel, conhecido como "Samuca", que espera fazer do sobrinho um metalúrgico. Samuca é o único taxista de Araquari. A prefeitura iniciou há duas semanas um curso gratuito de inglês para preparar os moradores para o contato com os novos vizinhos. Todas as 400 vagas iniciais foram preenchidas. "Outros municípios têm montadoras, nós ganhamos mais do que isso", disse o vice-prefeito Clenílton Carlos Pereira. "Ganhamos uma grife."
Invasão
Mas a perspectiva de mudança assusta. Durante os dias em que o Grupo Estado esteve em Araquari, os moradores apontaram para o fato de que o município pode ser "por moradores de cidades maiores, como Joinville (17 km), Curitiba (115 km), Florianópolis (150 km) e até São Paulo (520 km). O prefeito João Woitexem disse que a "ocupação" será bem-vinda.
"O crescimento econômico é importante, mas ele não pode ignorar a realidade da cidade. Nós somos tranquilos, todo mundo se conhece e reconhecemos o legado sócio-cultural que herdamos de nossos pais. Isso não pode se perder com a chegada de uma multinacional", afirmou Sueli Hreisenmnou, diretora da Fundação Cultural do município. Seu pai, Laércio Hreisenmnou, foi o único araquariense a integrar as Forças Expedicionárias Brasileiras (FEB), tendo lutado na Segunda Guerra Mundial.
Já para o prefeito Woitexem, a chegada de novos moradores deve melhorar o padrão de vida da "cidade do maracujá". "Nós sempre seguramos o crescimento populacional, não liberamos loteamentos. Agora vamos fazer o contrário. Já estamos liberando as construções, e vamos inverter essa lógica de Araquari como cidade dormitório", disse. A estimativa da prefeitura é que a população aumente cinco vezes nos próximos dez anos, chegando a 130 mil habitantes.
Preços
A agitação em Araquari começou no mercado imobiliário. Segundo a prefeitura, o metro quadrado de um terreno às margens das duas rodovias federais que cortam o município, as BRs 101 e 280, custava cerca de R$ 8, em média, em 2010 - hoje, o valor foi multiplicado por dez. "Os corretores de imóveis de Joinville fazem mais negócio aqui em Araquari do que lá", disse o prefeito. Como resultado, o caixa da administração municipal saltou enormemente no período. A arrecadação saiu de R$ 18 milhões, em 2009, para estimados R$ 76 milhões, este ano.
Mesmo com esse dinheiro, a cidade que vai produzir BMWs ainda tem diversas ruas sem asfalto. A cidade do maracujá também não conta com hospitais e maternidades - as crianças nascem nas cidades vizinhas. De acordo com o vice-prefeito Clenílton Pereira, esses problemas serão resolvidos com a entrada de recursos fiscais após o início da operação da BMW, no ano que vem. Até lá, a montadora está livre de taxas municipais.
Mas nem todo mundo está contente com a chegada da BMW. De bom humor, o mecânico Fernando Braga Olivera diz que seus tempos de sucesso na cidade acabaram. Conhecido como "Fernando da BMW" por praticamente todos os araquarienses, ele é o único morador que conseguiu juntar suas economias e realizar o sonho de ter um veiculo da montadora alemã - um modelo usado, fabricado em 1994 na Alemanha. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo