“Minha mulher já fala que eu não tenho juízo”, diz Luis Arnál, presidente da Insitum (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 29 de abril de 2014 às 12h57.
São Paulo – Esqueça as pesquisas de opinião e grupos focais por um instante. É possível saber exatamente qual o produto ou serviço tem mais aderência ao cotidiano do cliente? Parece enigma da esfinge, mas os pensadores do chamado design thinking garantem que não é - desde que estejam dispostos a topar os desafios mais inusitados para conseguir a melhor solução em inovação e novos negócios
A ideia é pensar em novas soluções para aumentar a aderência de produtos e serviços aos consumidores – e, consequentemente, melhorar os resultados da empresa.Para eles, todo o exercício é calcado na experiência de consumo – e não somente no produto em si. Novato no mundo dos negócios, o design thinking, fundado oficialmente em 2009 em Stanford, propõe um exercício simultaneamente racional e criativo.
Um desses "extreme CEOs" que encaram desafios corporativamente "radicais" é Luís Arnál, no comando da Insitum, consultoria de design thinking. O mexicano prefere sentir na pele – literalmente – a necessidade de seu público alvo antes de propor inovações às empresas que contratam seus serviços. Arnál tem curiosas histórias no currículo. "Sempre faço uma imersão no mundo que estou pesquisando e documento todas as minhas experiências", diz.
Mulher (por três dias)
Precisar, ele não precisava. Mas tinha clareza que teria melhores ideias se abraçasse de fato a rotina das mulheres antes de elaborar algum projeto para um fabricante de absorventes femininos. “Você só entende como um leão caça quando vai à savana ver como ele faz isso”, diz.
A curiosidade o fez encarar o desafio que colocou a si mesmo: usar absorventes por três dias para ver, de perto (mesmo) como é a rotina de uma mulher em período menstrual. Em sua incursão pelo mundo feminino, descobriu que a cola das abas não só incomodava como estragava as peças íntimas.
Para reforçar a experiência, pediu a algumas mulheres relatos hipotéticos de, por exemplo, como seria a vida se não existissem “aqueles dias”, o que fariam, por onde andariam, o que vestiriam, entre outros. Aquelas que toparam encarar a pesquisa chegaram a mandar fotos do produto, antes (e depois) do uso. Dura a vida do presidente.
Nu pela arte (e pelos negócios)
Em uma pesquisa sobre a organização de eventos e manifestações em redes sociais, Arnál acompanhou de perto a organização de uma sessão de trabalho do fotógrafo americano Spencer Tunick – conhecido por clicar grandes aglomerações de pessoas, com uma peculiaridade: todos nus.
“Estávamos interessados em saber como as pessoas usavam as redes sociais para se organizar e se motivar para os encontros e eventos”, diz Arnál. Não por acaso, escolheram a sessão de fotos de Tunick – é necessário muita motivação para ir a público tirar a roupa por um movimento artístico.
Arnál e mais três pesquisadores foram a campo, se cadastraram e fizeram todo o processo normalmente. “Ficamos durante uma hora ainda de roupa entrevistando as pessoas, colhendo percepções daquele momento e cruzando a experiência com a tencologia”, diz. Como previsto, acabaram também nus para as lentes de Tunick – junto com as outras 20 000 pessoas que também aderiram ao projeto.
Nem tudo são flores
Experiências como essas são curiosas e encaradas com um significativo bom humor. No entanto, nem sempre o objetivo do projeto traz experiências tão leves. Arnál conta sobre a marcante experiência quando foi a campo no México compreender quais eram as dificuldades e rejeições dos portadores de HIV na hora de tomar a medicação para o tratamento da doença. “Foi muito duro ver como viviam essas pessoas o alto risco de contaminação dos outros ao redor”, diz.
O objetivo era descobrir quais os caminhos mais adequados para inserir uma nova medicação na rotina desses pacientes.
Quando o projeto pessoal encontra o profissional
Para Arnál, a experiência como design thinker casa perfeitamente com o que ele tinha por objetivo de vida. “Trabalho com isso justamente para ter a oportunidade de aprender constantemente e aguçar minha curiosidade”, afirma. “A cada novo projeto experimento coisas novas, estou mais sensível e mais flexível.”
Em casa, a coisa não é sempre tão simples. Quem no começo ficava espantada era sua esposa, que hoje está acostumada com a curiosidade nada convencional do marido empreendedor. “Minha mulher já fala que eu não tenho juízo”, diz.