Trump impõe sua marca à cúpula do G20, a mais dividida de sua história
Encontro em Buenos Aires foi marcado por tensão pelo conflito entre Rússia e Ucrânia e pela "guerra comercial" entre Estados Unidos e China
AFP
Publicado em 30 de novembro de 2018 às 21h43.
Última atualização em 30 de novembro de 2018 às 21h45.
O presidente americano, Donald Trump , impôs sua marca à cúpula do G20 , que é realizada em Buenos Aires em um ambiente de tensão pelo conflito entre Rússia e Ucrânia e pela "guerra comercial" entre Estados Unidos e China.
E nada leva a pensar que haverá um consenso no fórum que reúne até sábado as 20 economias mais potentes e emergentes do planeta, e que tem entre seus polêmicos convidados o presidente russo, Vladimir Putin , o chinês Xi Jinping, e o príncipe herdeiro saudita, Mohamed bin Salman.
Depois que Trump cancelou o encontro que os dois haviam marcado, Putin mostrou seu espírito combativo ao denunciar as "práticas viciosas" das "sanções unilaterais" e do protecionismo comercial.
No que é um dos poucos momentos de consenso, Estados Unidos, México e Canadá assinaram um novo tratado de livre-comércio após meses de tensão, idas e vindas. Batizado T-MEC pelos mexicanos, o acordo substitui o Nafta, que regia o comércio entre esses três países desde 1994 e que foi derrubado por Trump.
Os principais líderes mundiais também deram as boas-vindas ao príncipe herdeiro saudita, evitando isolá-lo nesta viagem, a primeira que ele realiza desde que o jornalista Jamal Kashoggi foi assassinado no consulado de seu país em Istambul.
Presidente do México, Enrique Pena Nieto, presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o presidente do Canadá, Justin Trudeau, assinam o novo tratado comercial T-MEC
Um militar sai de um tanque no dia de início da reunião do G20 na capital argentina, Buenos Aires. 30 de novembro de 2018
Donald Trump e príncipe herdeiro saudita envolvido no assassinato do jornalista Jamal Khashoggi
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"Fora Trump"
Dezenas de milhares de argentinos se manifestaram em uma Buenos Aires praticamente deserta e sob um forte dispositivo de segurança que limitou ao mínimo o serviço de transporte público.
Com grandes cartazes que dizem "Fora Trump" e "Fora FMI", os manifestantes percorreram a central Avenida 9 de Julho, cujas ruas adjacentes foram bloqueadas com cercas metálicas vigiadas por 2.500 agentes e guardas de infantaria.
"Viemos nos manifestar, repudiar os representantes das potências imperialistas e queremos que saibam que não são bem-vindos em nosso país", disse à AFP Florence di Llelo.
Devido à cúpula do G20, esta sexta-feira foi declarada feriado. Também suspenderam o serviço de metrô e de trens, que vão principalmente à periferia de Buenos Aires.
Comandando a marcha que ocupou seis quarteirões da avenida mais larga de Buenos Aires, avançaram líderes de organismos de defesa dos direitos humanos. A maioria dos manifestantes foi organizada, principalmente, por partes de esquerda e movimentos antiglobalização. "Acreditamos que o G20 atenta contra o país", criticou Matías Gómez, delegado de uma cooperativa.
Trump-Xi
A reunião de sábado entre Trump e seu homólogo chinês será o ponto alto do primeiro G20 na América do Sul. Governos, mercados e empresas aguardarão os resultados dessa reunião.
O presidente americano disse ver "bons sinais" nas relações comerciais entre os dois países. Mas também se mostrou reticente a um acordo nas últimas horas. "Acho que estamos muito perto de fazer algo com a China, mas não sei se quero fazê-lo", disse Trump antes de iniciar sua viagem.
Ao exigir que Pequim acabe com as práticas comerciais, Trump impôs tarifas que chegaram a 300 bilhões de dólares, incluindo 250 bilhões de dólares sobre produtos chineses, e afetaram as importações de aço e alumínio de outros países.
E a China não demorou a reagir com medidas recíprocas, o que alimentou a "guerra comercial" que os analistas temem que possa atingir a economia mundial. A próxima série de aumentos está prevista para 1º de janeiro, quando as tarifas dos Estados Unidos sobre as importações chinesas no valor de 200 bilhões de dólares podem subir de 10% a 25% se os dois gigantes não chegarem a um acordo.
Não a Putin
Antes de deixar Washington, Trump cancelou o seu encontro previsto na na Argentina com seu colega russo, devido ao conflito com a Ucrânia. As tensões entre Kiev e Moscou alcançaram o seu auge após a Rússia reter três navios militares ucranianos em frente à costa da Crimeia. A seguir, o presidente ucraniano, Petro Poroshenko, alertou sobre "a ameaça de uma guerra total" com a Rússia.
A anulação do encontro acontece em meio à controvérsia nos Estados Unidos sobre novas revelações na investigação de uma suposta interferência da Rússia na campanha presidencial de 2016.
O presidente americano reiterou a sua inocência em relação a um acordo imobiliário com Moscou que fez parte da investigação. "Caça às bruxas", tuitou. A polêmica está mais viva depois que seu ex-advogado Michael Cohen se declarou culpado de mentir ao Congresso sobre este negócio imobiliário para limitar a investigação sobre a ingerência russa na campanha eleitoral.
Trump também deve medir forças com o presidente da França, Emmanuel Macron, que pretende incluir o aquecimento global nos primeiros pontos da agenda do G20, antes da conferência sobre clima COP24, em 2 de dezembro, na Polônia.
Mas o presidente americano, que não se cansa de colocar a mudança climática em dúvida, retirou o seu país dos acordos ambientais de Paris em junho de 2017, pouco depois de chegar à Casa Branca.
Nesse contexto, será difícil que este G20 cumpra a promessa que fez em sua primeira cúpula, 10 anos atrás: o multilateralismo para assegurar a "prosperidade" no mundo.