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Tortura e violação de direitos humanos é ignorada no México

Algumas das violências praticadas no país é fruto das próprias autoridades de segurança do país

Helicópteros da Força Aérea sobrevoam a bandeira do México (Bernardo Montoya/Reuters)

Helicópteros da Força Aérea sobrevoam a bandeira do México (Bernardo Montoya/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 16 de outubro de 2012 às 08h01.

México - Expostas a represálias e desamparadas por uma justiça que tacham de ineficaz, as vítimas de tortura e outras violações de direitos humanos no México denunciam que o Estado ignora uma realidade causada, em muitos casos, por seus próprios corpos de segurança.

No dia 16 de fevereiro de 2002 o indígena me'phaa Valentina Rosendo Cantú foi violentada por dois soldados na serra de Guerrero, sul do país. Foi acusada de mentir, teve dificuldades para receber atendimento médico e para fazer a denúncia e, uma vez que a fez, foi fustigada por militares na porta de sua casa.

"Sentia-me mal porque pensava que talvez fosse minha culpa, me perguntava por que fui naquela hora, por que tive que abrir a boca. Eu sentia que não tinha saída, várias vezes tentei me suicidar", lembrou em entrevista à Agência Efe.

Quase uma década depois foi a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH) que exigiu do governo mexicano, através de uma sentença de acatamento obrigatório, reconhecer sua responsabilidade nos fatos e pedir perdão publicamente, um ato que aconteceu em dezembro de 2011.

No entanto, sua vida nunca voltou a ser o que era. Em 2003, menos de um ano depois do sucedido, teve que abandonar junto com sua filha e seu marido a comunidade por causa do assédio dos militares, das ameaças da autoridade local para que desistisse de sua denúncia e da dolorosa discriminação de seus vizinhos.

"Chegamos a Chilpancingo (capital do estado de Guerrero) sem falar espanhol, sem trabalho, nem teto. Meu marido me batia porque tinha que cumprir com meu papel de esposa e dois anos depois daquilo me abandonou com 50 pesos (quase US$ 4)", lembra.

Quando recebeu a sentença da CorteIDH chorou "de emoção" e embora agora viva "mais tranquila" não pode voltar a seu domicílio por segurança. Dez anos depois, os culpados, embora se saiba que pertencem ao 41º batalhão de Infantaria do Exército, não foram identificados nem processados.

O caso de Gerardo Torres, estudante universitário de 19 anos, é mais recente. No dia 12 de dezembro de 2011 foi detido junto com outras 23 pessoas por agentes federais durante um protesto estudantil em Chilpancingo, na qual a Polícia atirou e matou dois dos manifestantes.

Levado a um lugar isolado fora da cidade, foi ameaçado de morte e golpeado no estômago, nas costelas e nos braços, assim como obrigado a apertar o gatilho de uma arma automática para implicá-lo falsamente nos assassinatos anteriores.

"Resisti com eles, não queria que pusessem minhas mãos na arma, lhes disse que nunca tinha disparado e me atacaram com insultos, no final vieram outros dois, puseram meu dedo no gatilho e eles apertaram", relatou à Efe Gerardo.


A preocupação nacional e internacional perante as provas que responsabilizaram a Polícia pela morte dos dois manifestantes e os maus tratos aos presos permitiram que ele e os outros 23 detidos fossem libertados no dia 13 de dezembro.

"É algo muito cruel que ainda se continue praticando a tortura no México, passar por algo assim te muda a perspectiva. É uma sensação muito dolorosa", acrescentou o estudante.

Estes são dois dos casos que aparecem no último relatório da Anistia Internacional (AI) sobre tortura e maus tratos no México, apresentado sob o nome "Culpados conhecidos, vítimas ignoradas", no qual alertam que se trata de uma prática "sistemática" e "generalizada" aguçada nos últimos seis anos.

O relatório recolhe os dados obtidos pela Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que embora "esteja longe de representar o verdadeiro número de torturas", pois só está autorizado a obter aquelas nas quais as autoridades federais estão envolvidas, oferece os dados "mais completos" por enquanto.

De acordo com este registro, nos últimos seis anos aconteceu um aumento de mais do 300% dos casos, pois enquanto em 2007 foram reportadas 392 denúncias, em 2011 esse número subiu para 1.669, só levando em conta os casos do âmbito federal, cujos delitos representam 10% do total.

"A realidade é conhecida, mas não se pode demonstrar, o que permite ao Estado ignorá-la, esse é o resultado mais evidente", disse à Efe Rupert Nox, chefe da área de pesquisa para o México da AI.

O relatório pede ao governo para obter informação "fidedigna" que permita projetar e implementar políticas eficazes para combater esta situação, acrescentou.

De acordo com o documento, o aumento de casos de tortura e maus tratos aconteceu em um contexto de "severa crise de segurança pública" na qual mais de 55 mil pessoas foram assassinadas e pelo menos 160 mil sofreram deslocamentos internos como resultado da violência entre cartéis da droga.

"O governo impulsionou as forças armadas no combate da delinquência organizada, mas não aumentou os controles, prestação de contas e supervisão dessas atuações para garantir o respeito aos direitos humanos", acrescentou o especialista.

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