Solo ressecado é visto na represa de Jaguary, em Bragança Paulista: crise é consequência da contaminação e da exploração insustentável (Nacho Doce/Reuters)
Da Redação
Publicado em 22 de março de 2014 às 16h24.
Última atualização em 19 de março de 2018 às 11h11.
São Paulo — São Paulo vive atualmente a pior crise hídrica de sua história já que o conjunto de açudes que abastece a cidade, entre outras, está com seu nível de água abaixo de 15% da capacidade, segundo os últimos dados do governo regional.
O chamado Sistema Cantareira, que reúne seis açudes conectados por túneis e canais, tem capacidade para cerca de um trilhão de litros e é a fonte de água que a companhia regional de saneamento distribui a 8,8 milhões de residências.
No local onde havia uma imensa reserva, hoje em dia só se vê um vale de terra, segundo constatou a Agência Efe em uma visita realizada hoje, quando é celebrado o Dia Mundial de Água.
Para fazer frente à crise e amenizar os efeitos da seca provocada pelo verão mais quente dos últimos 70 anos, o governo de São Paulo anunciou nesta semana um plano de emergência para aproveitar as águas do rio Paraíba, que é a principal fonte de abastecimento do estado do Rio de Janeiro.
O projeto, que o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, apresentou perante a presidente Dilma Rousseff, foi imediatamente criticado pelo governo do Rio de Janeiro, que também está preocupado com seu próprio abastecimento.
A atual escassez de água contrasta não só com a geografia, mas também com a própria história de São Paulo, cidade que os jesuítas portugueses fundaram para precisamente aproveitar um local com abundância de rios e cursos de água.
Um estudo que a ONG SOS Mata Atlântica realizou para lembrar o Dia Mundial de Água mostra que mais de 82% das fontes de água de São Paulo estão com a qualidade inadequada e apenas 18% com qualidade regular.
Nenhum dos rios tem uma qualidade de água considerada boa, segundo o relatório.
'A crise em São Paulo não obedece à falta de água. Estamos em uma região com certa abundância de disponibilidade hídrica. A crise é consequência em primeiro lugar da contaminação e depois da exploração insustentável e do esbanjamento', disse à Agência Efe a coordenadora da Rede de Águas da organização, Malu Ribeiro.
Segundo Ribeiro, é precisamente a abundância que gera uma mentalidade de esbanjamento e de falta de cuidado, com consequências que a população começa a sentir.
'Se São Paulo recebesse um maior investimento em saneamento, não estaria na atual crise', assegura a especialista ao lembrar que só 37,5% das águas produzidas pelo Brasil recebem algum tipo de tratamento.
Ribeiro também questiona que o país dê prioridade ao uso de água para a produção de energia ao invés do abastecimento e que alguns açudes estejam destinados a ambos usos.
'Quando se aproveita a matriz energética dos rios para gerar energia se esquece ou se descartam outros usos possíveis', assegura a militante, que cita como exemplo a represa Billings, localizada na própria região metropolitana de São Paulo.
Com uma área total de 1.560 quilômetros quadrados, apenas as áreas marginais desta represa são consideradas adequadas para o abastecimento devido a sua função energética prioritária. Uma maior captação de água para o consumo comprometeria o potencial elétrico.
A especialista assegura que a crise em Cantareira pode ser administrada e prevista, e lembra que o sistema tem um histórico de fortes secas, a mais recente em 2001.
'Se não é uma novidade para ninguém (a seca), por que não se investe em medidas que possam compensar ou minimizar esses eventos extremos para que não haja situações de crise?', questiona a especialista. EFE