Quem é Salman Rushdie, o "escritor amaldiçoado" por uma fatwa
O escritor indiano naturalizado britânico foi vítima de um atentado terrorista e vive sob ameaça há mais de trinta anos após uma sentença de morte
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Carlo Cauti
Publicado em 12 de agosto de 2022 às 21h10.
Última atualização em 12 de agosto de 2022 às 21h12.
O escritor indiano naturalizado britânico, Salman Rushdie, sofreu um atentado nesta sexta-feira, 12, pouco antes de realizar uma palestra em Chautauqua, no estado de Nova York.
O ataque, realizado com uma faca, teria sido motivado pela fatwa, uma espécie de "sentença jurídico-religiosa" islâmica, que o condenou a morte, emitida em 1989 pelo líder religioso muçulmano xiita do Irã, Ruhollah Khomeini.
A fatwa foi emitida após Rushdie publicar a obra que se tornaria um divisor de águas em sua vida: "Versos satânicos".
O livro é uma reinterpretação ficcional da inspiração diabólica sobre a vita do profeta e fundador do Islã, Maomé, um episódio considerado blasfemo por clérigos islâmicos.
A partir da emissão da fatwa por parte de Khomeini, foi alimentado um ódio generalizado contra Rushdie, que sofreu uma série de atentados e foi forçado a se refugiar no Reino Unido e a viver sob proteção das autoridades de Londres.
Em muitos países islâmicos a publicação do livro ainda é proibida, incluindo o Egito, Emirados Árabes Unidos e Índia.
Em muitos protestos públicos, cópias foram queimadas em praças do Paquistão, Irã e até no próprio Reino Unido.
Em agosto de 1989, seis meses após a emissão da fatwa, uma bomba explodiu em um hotel de Londres perto da estação de Paddington e matou o homem-bomba Mustafa Mahmoud Mazeh.
Em 2005 um repórter do Times descobriu uma lápide em um cemitério de Teerã comemorando o atentador como o "primeiro mártir a morrer em uma missão para matar Salman Rushdie".
O caso da fatwa contra Rushdie levou ao rompimento das relações diplomáticas entre o Reino Unido e o Irã.
Quem é Salman Rushdie
Rushdie nasceu em Mumbai, na Índia, em 1947, de uma família rica de religião islâmica.
Aos 12 anos escreveu seu primeiro conto, " Além do Arco Íris", uma crônica fantástica inspirado no Mágico de Oz, e que acabará sendo perdida.
Aos 14 anos mudou-se com a família para Londres e mais tarde frequentou a Universidade de Cambridge. Desde 2000 ele vive em Nova York.
Sua estreia literária aconteceu em 1975 com o conto de fadas "Grimus", que passa despercebido pela crítica e pelo público.
O autor foi casado quatro vezes e separou-se de sua última esposa, a modelo e atriz indiana Padma Lakshmi, em 2007.
O sucesso vem com o romance seguinte, "Os filhos da meia-noite", com o qual ganhou o James Tait Black Memorial Prize e o Booker Prize em 1981, entrando no ranking dos 100 livros do século segundo o jornal francês Le Monde.
A obra lhe causa um processo por parte da líder indiana Indira Gandhi e o ódio de seu próprio pai, que se reconhece em um dos personagens do livro.
Mas é com outra obra, "Vergonha", escrita em 1983, que começam os casos internacionais.
O Paquistão proíbe o romance e também baniu fisicamente o autor do país, onde ainda hoje não pode entrar.
De acordo com sua ex-esposa, a romancista Marianne Wiggins, o casal se mudou 56 vezes, ou uma vez a cada três dias nos primeiros meses após a emissão da fatwa.
A maldição dos "versos satânicos"
A sentença de morte irrevogável emitida por Khomeini atingiu também o mundo editorial em torno de Rushdie, além de todos aqueles que entraram em contato com " Versos Satânicos".
Em 1991 o tradutor do livro para o japonês, Hitoshi Igarashi, foi morto em Tóquio. No mesmo ano também Ettore Capriolo, tradutor de "Versos satânicos" para o italiano, foi esfaqueado em sua casa em Milão. Em 1993 o editor norueguês da obra, William Nygaard, foi baleado.
Em 2008 a fatwa foi reiterada pelo sucessor de Khomeini, Alí Khamenei, e novamente em 2017 e 2019 via Twitter (rede social proibida no Irã, mas que é amplamente utilizada pelos líderes religiosos e políticos locais.
Em 2015 na Feira do Livro de Frankfurt, na Alemanha, o Irã boicotou a manifestação em protesto contra a inauguração do evento, onde Rushdie era convidado de honra.
Mesmo após essa sentença de morte proclamada pelo governo iraniano, Rushdie continua escrevendo, abordando sem medo histórias e temas que mais o fascinam: do terrorismo ao ataque às Torres Gêmeas.
O penúltimo e décimo segundo livro de Rushdie, The Golden House, é uma história ambientada no período da presidência de Barack Obama à eleição de Donald Trump.