Abiy Ahmed: líder etíope conseguiu acordo para acabar com conflito de 20 anos na África (Tiksa Negeri/Reuters)
AFP
Publicado em 11 de outubro de 2019 às 16h32.
Última atualização em 11 de outubro de 2019 às 16h46.
O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, vencedor do Prêmio Nobel da Paz em 2019, cresceu em uma família humilde e foi diretor da Agência Nacional de Inteligência, antes de iniciar mudanças profundas em seu país, que geraram esperança, mas também críticas.
Desde que assumiu o governo do país com a segunda maior população da África, em abril de 2018, Abiy Ahmed, 43 anos, conseguiu abalar as bases de um regime pesado após mais de 25 anos de exercício autoritário do poder, modificando a dinâmica da região do Chifre da África.
Apenas seis meses depois de sua posse, ele assinou a paz com a vizinha Eritreia, libertou milhares de dissidentes, pediu perdão pela brutalidade do Estado e recebeu de braços abertos os integrantes de grupos exilados que seus antecessores haviam chamado de "terroristas".
Recentemente apresentou o programa de abertura da economia, amplamente controlada pelo Estado, e atualmente investe todos os seus esforços para que as eleições legislativas, que ele promete que serão inclusivas, aconteçam em maio de 2020.
Desta maneira, o jovem chefe de Governo se colocou em uma situação delicada, de acordo com analistas. Suas principais medidas são muito radicais e repentinas para a velha guarda do antigo regime, mas não suficientemente ambiciosas e rápidas para uma juventude ávida por mudanças e perspectivas de futuro.
Seu processo de abertura também liberou as ambições territoriais locais e antigas divergências intercomunitárias, que desencadearam atos de violência em diversas regiões do país.
Mas os simpatizantes de Abiy confiam em sua inesgotável ambição pessoal para obter avanços do país.
"Sempre disse a meus amigos: quando este cara chegar ao poder, vocês verão mudanças enormes na Etiópia", afirmou o empresário Tareq Sabt, próximo ao primeiro-ministro.
Filho de pai muçulmano e mãe cristã, nascido em Beshasha, uma pequena comunidade do centro-oeste do país, Abiy Ahmed cresceu em uma casa que não tinha energia elétrica nem água corrente. E ele dormia no chão.
"Nós buscávamos água no rio", recordou em uma entrevista concedida em setembro à rádio Sheger FM, durante a qual ele contou que só conheceu energia elétrica e asfalto aos 10 anos.
Na adolescência se envolveu com a luta armada para combater o regime do ditador Mengistu Haile Mariam.
O jovem Abiy, operador de rádio, aprendeu por necessidade o idioma da região de Tigray, grupo étnico majoritário na luta armada e que formou o núcleo duro do regime após a queda de Mengistu, em 1991.
Abiy começou então a avançar na coalizão de governo, a Frente Democrática Revolucionária do Povo Etíope (EPRDF), primeiro na área de segurança e depois no lado político.
Ele progrediu no exército até obter a patente de tenente-coronel e em 2008 foi um dos fundadores da Agência Nacional de Inteligência (INSA), que comandou de fato por dois anos. Em 2010, trocou o uniforme pelo figurino de político, tornando-se deputado do partido Oromo, membro da coalizão no poder e, em 2015, assumiu o ministério da Ciência e Tecnologia.
No fim do mesmo ano, um movimento de protesto contra o governo ganhou força entre as principais comunidades do país, os oromo, a qual pertence Abiy Ahmed, e os amhara.
Apesar da repressão violenta do movimento, as manifestações provocaram a queda do primeiro-ministro Hailemariam Desalegn, símbolo de uma coalizão incapaz de apresentar respostas às aspirações da juventude. A EPRDF designou então Abiy Ahmed para solucionar a situação e ele se tornou o primeiro oromo a assumir o posto de chefe de Governo.
"É o único que poderia salvar a EPRDF", explica Mohamed Ademo, jornalista que acompanhou Abiy durante sua primeira visita à diáspora etíope nos Estados Unidos, em 2018.
Uma vez no poder, Abiy multiplicou as iniciativas a nível regional. Além da espetacular aproximação com a Eritreia, desempenhou um papel importante de mediador na crise política sudanesa e tentou revitalizar o frágil acordo de paz do Sudão do Sul.
Resta saber se as medidas terão sucesso.
"Abiy teve êxito na política externa, mas aconteceu uma forma de otimismo imprudente do exterior, pelo qual acredita que pode transformar o Chifre da África", destaca James Barnett, especialista na região leste da África do American Enterprise Institute.
"A região do Chifre da África é volátil. Duvido que um único líder possa acabar com décadas de receios e disputas de influências", completa.
O próximo desafio de peso de Abiy Ahmed será a organização de eleições livres e justas que, em caso de vitória, representariam uma legitimidade das urnas.
Também resta esperar que não seja prejudicado pelas inimizades provocadas por suas reformas, a violência entre comunidades e os importantes movimentos dentro do aparato de segurança.
A ativista sueca de 16 anos, Greta Thumberg e o líder indigenista brasileiro Raoni eram alguns dos favoritos entre os indicados ao Nobel da Paz deste ano. A adolescente liderou um movimento pelo mundo. A ação levou a união de milhões de crianças do planeta que passaram a cobrar maior atuação das lideranças globais em relação às mudanças climáticas.
Já o cacique Raoni ficou conhecido internacionalmente como ativista ambiental nos anos 1980, ao lado do músico Sting. O cacique caiapó se tornou símbolo da luta contra o desmatamento na Amazônia, e um grupo de ambientalistas e antropólogos apresentou o nome dele como candidato ao Nobel da Paz por sua defesa da floresta ao longo da vida.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também foi indicado ao prêmio por causa de medidas tomadas enquanto ocupava o cargo máximo do Executivo brasileiro para retirar cidadãos que viviam abaixo da linha da pobreza.