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Putin quer sair do isolamento e ter papel central na Síria

Quando o movimento de protesto contra o poder de Bashar Al-Assad começou, em março de 2011, na Síria, o Kremlin se alinhou desde o início junto ao presidente

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, discursa na ONU: "Desde o começo está claro que para a Rússia é melhor um Khadafi, um Assad, inclusive um Saddam Hussei, que o EI", afirma Alexei Machenko, do Instituto Carnegie (Mike Segar/Reuters)
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Da Redação

Publicado em 28 de setembro de 2015 às 17h57.

Quando Vladimir Putin evocou, no final de junho, a ideia de uma coalizão ampliada contra o "terrorismo" na Síria, até mesmo o chefe da diplomacia de Damasco mostrou-se cético. Seria necessário "um grande milagre", dizia Walid Muallem.

Três meses depois, o presidente russo percorreu mais da metade do caminho rumo a este objetivo.

Embora sua proposta de uma coalizão contra o grupo Estado Islâmico (EI) não tenha ainda sido aceita, o chefe de Estado russo, isolado pelos ocidentais devido ao seu papel na crise ucraniana, já se relocalizou no centro do grande jogo diplomático.

A primeira partida

Quando o movimento de protesto contra o poder de Bashar Al-Assad começou, em março de 2011, na Síria, o Kremlin se alinhou desde o início junto ao presidente.

Aliada desde a época soviética dos Assad, pai e filho, a Rússia, que demostrou pouco apreço pelos movimentos de protesto na Geórgia e na Ucrânia, vê com maus olhos qualquer "revolução" que ocorra, seja em Tunísia, Egito ou Síria.

Três princípios guiam os atos do Kremlin: opor-se a qualquer "revolução" ou intervenção militar que possam conduzir à desintegração do Estado, como no Iraque e na Líbia, alertar sobre o perigo "terrorista" islâmico e seu apoio incondicional ao regime "legítimo" de Damasco.

Durante mais de dois anos, a posição da Rússia ficou marginalizada. Em junho de 2012, uma primeira conferência em Genebra lança um comunicado que previa "um governo de transição" na Síria. Mas as grandes potências fracassam sobre fixar um calendário para a partida de Bashar Al-Assad.

Em 21 de agosto de 2013, ocorreu um ataque com armas químicas na periferia de Damasco: 1.429 mortos. Imediatamente, americanos, britânicos e franceses consideram realizar ataques para "castigar" Assad.

O presidente russo põe, então, na balança um plano para a destruição das armas químicas sírias. Seu colega americano, Barack Obama, acata a opinião do Congresso e renuncia a tomar medidas. Al-Assad salva-se de sofrer ataques e Putin aparece como um interlocutor válido.

Pária e isolado

Quando ordenou no final de fevereiro de 2014 seus comandos a tomar à força o Parlamento da Crimeia, Putin passou da linha.

A reanexação desta península ucraniana, após o desencadeamento da guerra no leste da Ucrânia transformou o líder do Kremlin em um pária, e seu país sofre os efeitos das sanções impostas pelos ocidentais.

Mas Moscou não abandonou a esperança de pesar no conflito sírio. Os grupos opositores no exílio e tolerados por Damasco passam sucessivamente por Moscou, seguidos por representantes do regime sírio.

Enquanto isso, na Síria os grupos jihadistas adquirem cada vez maior relevância. Um destes é o EI, que se apodera de amplas partes do território.

Moscou anima-se a confirmar: sem Assad, a Síria ficará à mercê dos "terroristas" islamitas.

Com os pés na Síria e a cabeça na ONU

"Desde o começo está claro que para a Rússia é melhor um Khadafi, um Assad, inclusive um Saddam Hussei, que o EI", afirma Alexei Machenko, do Instituto Carnegie.

Em 29 de junho passado, Putin recebe em Moscou Muallem e evoca sua ideia de uma coalizão ampliada aos países da região, com o apoio terrestre dos exércitos sírio e iraquiano.

Turqia, Jodânia, Arábia Saudita... "Todos nossos contatos com os países da região permitem ver que enquanto se tratar de combater o EI, todos estão dispostos", destaca Putin.

O líder sírio não acredita muito nesta ideia, mas durante todo o verão (boreal), seu colega russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, multiplica suas consultas.

Ao mesmo tempo, a opinião pública, em particular a europeia, coloca seu olhar na afluência de combatentes islamitas europeu na Síria e na crise migratória.

Não se trata somente de pesar no conflito sírio. "Putin busca sair de seu isolamento. Para ele, encontrou um pretexto genial: a luta contra o Estado Islâmico", no entanto a situação nunca esteve tão calma no terreno da Ucrânia, destaca Malachenko.

É o momento no qual um balé de navios de guerra russos começa no estreito de Bósforo. Os russos reforçam sua presença no porto sírio de Tartus, mas sobretudo constroem uma base aérea perto de Latakia, bastião favorável a Assad no noroeste da Síria.

Os satélites americanos detectam um aumento da atividade militar russa: tanques, aviões, helicópteros, e até 2.000 soldados, segundo a imprensa russa.

A entrega de armas ao exército de Assad se intensifica. Além disso, líderes militares russos, iranianos, iraquianos e sírios reúnem-se em Bagdá.

A Rússia surpreende todo o mundo, primeiramente os americanos. Ao aproximar-se a Assembleia Geral da ONU, Washington deve render-se diante da evidência: é preciso falar com Putin, transformado em imprescindível, e talvez pensar na ideia de que a partida de Assad não seja imposta neste momento.

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Quando Vladimir Putin evocou, no final de junho, a ideia de uma coalizão ampliada contra o "terrorismo" na Síria, até mesmo o chefe da diplomacia de Damasco mostrou-se cético. Seria necessário "um grande milagre", dizia Walid Muallem.

Três meses depois, o presidente russo percorreu mais da metade do caminho rumo a este objetivo.

Embora sua proposta de uma coalizão contra o grupo Estado Islâmico (EI) não tenha ainda sido aceita, o chefe de Estado russo, isolado pelos ocidentais devido ao seu papel na crise ucraniana, já se relocalizou no centro do grande jogo diplomático.

A primeira partida

Quando o movimento de protesto contra o poder de Bashar Al-Assad começou, em março de 2011, na Síria, o Kremlin se alinhou desde o início junto ao presidente.

Aliada desde a época soviética dos Assad, pai e filho, a Rússia, que demostrou pouco apreço pelos movimentos de protesto na Geórgia e na Ucrânia, vê com maus olhos qualquer "revolução" que ocorra, seja em Tunísia, Egito ou Síria.

Três princípios guiam os atos do Kremlin: opor-se a qualquer "revolução" ou intervenção militar que possam conduzir à desintegração do Estado, como no Iraque e na Líbia, alertar sobre o perigo "terrorista" islâmico e seu apoio incondicional ao regime "legítimo" de Damasco.

Durante mais de dois anos, a posição da Rússia ficou marginalizada. Em junho de 2012, uma primeira conferência em Genebra lança um comunicado que previa "um governo de transição" na Síria. Mas as grandes potências fracassam sobre fixar um calendário para a partida de Bashar Al-Assad.

Em 21 de agosto de 2013, ocorreu um ataque com armas químicas na periferia de Damasco: 1.429 mortos. Imediatamente, americanos, britânicos e franceses consideram realizar ataques para "castigar" Assad.

O presidente russo põe, então, na balança um plano para a destruição das armas químicas sírias. Seu colega americano, Barack Obama, acata a opinião do Congresso e renuncia a tomar medidas. Al-Assad salva-se de sofrer ataques e Putin aparece como um interlocutor válido.

Pária e isolado

Quando ordenou no final de fevereiro de 2014 seus comandos a tomar à força o Parlamento da Crimeia, Putin passou da linha.

A reanexação desta península ucraniana, após o desencadeamento da guerra no leste da Ucrânia transformou o líder do Kremlin em um pária, e seu país sofre os efeitos das sanções impostas pelos ocidentais.

Mas Moscou não abandonou a esperança de pesar no conflito sírio. Os grupos opositores no exílio e tolerados por Damasco passam sucessivamente por Moscou, seguidos por representantes do regime sírio.

Enquanto isso, na Síria os grupos jihadistas adquirem cada vez maior relevância. Um destes é o EI, que se apodera de amplas partes do território.

Moscou anima-se a confirmar: sem Assad, a Síria ficará à mercê dos "terroristas" islamitas.

Com os pés na Síria e a cabeça na ONU

"Desde o começo está claro que para a Rússia é melhor um Khadafi, um Assad, inclusive um Saddam Hussei, que o EI", afirma Alexei Machenko, do Instituto Carnegie.

Em 29 de junho passado, Putin recebe em Moscou Muallem e evoca sua ideia de uma coalizão ampliada aos países da região, com o apoio terrestre dos exércitos sírio e iraquiano.

Turqia, Jodânia, Arábia Saudita... "Todos nossos contatos com os países da região permitem ver que enquanto se tratar de combater o EI, todos estão dispostos", destaca Putin.

O líder sírio não acredita muito nesta ideia, mas durante todo o verão (boreal), seu colega russo das Relações Exteriores, Serguei Lavrov, multiplica suas consultas.

Ao mesmo tempo, a opinião pública, em particular a europeia, coloca seu olhar na afluência de combatentes islamitas europeu na Síria e na crise migratória.

Não se trata somente de pesar no conflito sírio. "Putin busca sair de seu isolamento. Para ele, encontrou um pretexto genial: a luta contra o Estado Islâmico", no entanto a situação nunca esteve tão calma no terreno da Ucrânia, destaca Malachenko.

É o momento no qual um balé de navios de guerra russos começa no estreito de Bósforo. Os russos reforçam sua presença no porto sírio de Tartus, mas sobretudo constroem uma base aérea perto de Latakia, bastião favorável a Assad no noroeste da Síria.

Os satélites americanos detectam um aumento da atividade militar russa: tanques, aviões, helicópteros, e até 2.000 soldados, segundo a imprensa russa.

A entrega de armas ao exército de Assad se intensifica. Além disso, líderes militares russos, iranianos, iraquianos e sírios reúnem-se em Bagdá.

A Rússia surpreende todo o mundo, primeiramente os americanos. Ao aproximar-se a Assembleia Geral da ONU, Washington deve render-se diante da evidência: é preciso falar com Putin, transformado em imprescindível, e talvez pensar na ideia de que a partida de Assad não seja imposta neste momento.

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