LYUBOMIR VASSILEV: para ele, a Europa é a responsável pela solução dos problemas econômicos do país / Boryana Dimitrova Katsarova/The New York Times
Da Redação
Publicado em 31 de janeiro de 2017 às 16h27.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.
Boryana Dzhambazova
© 2017 New York Times News Service
Sofia, Bulgária – Quando a Bulgária correu o risco de uma corrida aos bancos em meados de 2014, Lyubomir Vassilev entrou em pânico.
Desempregado e vivendo de um pacote de compensação por causa de um acidente de trabalho, perdeu o acesso à sua conta bancária e se juntou a outras pessoas nas ruas para protestar quando um banco com problemas foi à falência, desencadeando uma crise financeira – e política.
Meses depois, com seus pais precisando pedir dinheiro emprestado a parentes para ajudá-lo a sobreviver, Vassilev finalmente conseguiu seus US$ 6 mil de volta.
“Depois que o banco foi à falência, perdi a confiança no sistema bancário”, conta ele.
Vassilev culpa os líderes da Bulgária e, como muitos de seus compatriotas, atribui a solução da crise à União Europeia.
Por grande parte da Europa Ocidental, críticos se queixam dos tecnocratas distantes e insensíveis de Bruxelas, que aplicam regras insondáveis ao pé da letra, com pouco conhecimento das necessidades e nuances locais. A votação da Grã-Bretanha em junho para deixar o bloco foi um golpe pungente contra a unidade regional em um momento em que a confiança na União Europeia já não era boa.
Mas Vassilev e seus compatriotas pintam um quadro diferente – em que autoridades regionais responsabilizam as autoridades nacionais, estabelecem padrões mais elevados e são mais confiáveis do que seus homólogos locais.
A Bulgária se uniu à União Europeia em 2007, junto com a Romênia. Na época, as pesquisas indicavam que uma pequena maioria da população era favorável à adesão, na esperança de que ela fortaleceria a economia e as instituições políticas do país balcânico.
Desde então, a Bulgária se manteve como o estado-membro mais pobre do bloco, com um produto interno bruto de cerca de metade da média regional. Ainda assim, os salários subiram acentuadamente, bilhões foram aplicados em infraestrutura e pesquisas mostram que os búlgaros permanecem convictos de que se unir à UE foi um passo na direção certa.
“A Bulgária claramente se beneficiou desde que ingressou na União Europeia. Estamos mais ricos, com mais escolhas em termos de empregos e educação em todo o bloco”, afirma Ruslan Stefanov, analista do Centro de Estudos da Democracia, um think tank de Sofia.
O búlgaro médio ganha hoje cerca de US$ 470 por mês, duas vezes mais do que quando o país se juntou à UE. O comércio aumentou significativamente, já que as empresas aproveitaram a adesão ao mercado comum. As exportações a países da UE dobraram desde a adesão, e as vendas para outros membros agora representam dois terços de todas as exportações do país.
Houve outros benefícios. Dezenas de milhares de búlgaros estão estudando em um dos 28 países da União Europeia – uma proporção maior de sua população do que membros com dimensões comparáveis como a Áustria, a República Checa ou a Hungria. (No entanto, isso acontece em parte por causa da má qualidade do sistema educacional da Bulgária.)
Ainda mais búlgaros trabalham e viajam pelos países do bloco, aproveitando a livre circulação de mão de obra na região. Isso, segundo Stefanov, ajudou a manter o desemprego relativamente baixo, em cerca de oito por cento – se os búlgaros não conseguem encontrar trabalho em casa, diz ele, procuram no exterior.
A União Europeia também forneceu bilhões para ajudar o país a construir novas rodovias e estradas, para desenvolver a agricultura em áreas rurais e proteger o meio-ambiente. Relatórios regulares publicados pela Comissão Europeia sobre corrupção e crime organizado – problemas persistentes na Bulgária – mantiveram políticos locais em alerta (embora Sofia tenha feito pouco progresso no sentido de acabar com a corrupção e reformar seu sistema judiciário).
“O fato de a Bulgária ser um membro da União Europeia e de haver uma série de reformas acontecendo nos faz acreditar que o país está definitivamente no caminho certo”, diz Olivier Marquette, diretor administrativo da operação búlgara da AES, empresa de energia com sede em Arlington, na Virgínia.
A AES começou a considerar projetos na Bulgária no ano 2000, quando o país ainda era apenas um candidato a se juntar à União Europeia. Desde então, investiu cerca de 1,72 bilhão em três projetos aqui – uma usina termelétrica de 600 megawatts, um parque eólico e um centro de descarte de lixo.
Mas nem tudo foi tranquilo: ela levou dois anos para resolver uma disputa com uma empresa estatal de serviços públicos, que lhe devia US$ 322 milhões. No entanto, Marquette diz que a AES está feliz com sua aposta no país.
A combinação de ajuda financeira, orientação e supervisão da UE fez com que, dentro da Bulgária, a confiança no bloco e em suas instituições permanecesse forte e muito mais elevada do que na maioria dos outros países da União.
Cerca de 49 por cento dos búlgaros dizem que confiam na UE, comparados com 33 por cento que não confiam, segundo a empresa Eurobarometer de 2016, que faz pesquisas na região. Esse é o terceiro nível mais elevado de confiança entre os países membros (atrás apenas da Lituânia e de Malta), e cerca de duas vezes mais do que o crédito que os búlgaros dão a seu governo, às instituições públicas e ao sistema legal.
“As pessoas não reconhecem o Estado como sendo algo seu e assim veem Bruxelas como um poder aliado externo”, explica Marin Lessenski, diretor do Programa de Políticas Europeias e Participação Cívica do Open Society Institute.
O peso de Bruxelas ficou claro em 2014.
Em junho daquele ano, o Corporate Commercial Bank, ou KTB, sofreu retiradas em massa depois de uma disputa entre um político local e o maior acionista do banco. Como a confiança diminuiu, um quinto dos ativos do KTB foram retirados em uma semana, e a instituição acabou sob supervisão do banco central.
O pânico se espalhou rapidamente e, no mês seguinte, o banco central da Bulgária afirmou que iria começar um processo de falência contra o KTB.
Vassilev era um dos vários titulares de contas cujas vidas se tornaram caóticas. Atraído pelas promessas de altas taxas de juros, ele perdeu o acesso a todas as suas economias durante meses. Mais de dois anos depois, a investigação sobre o colapso do KTB continua.
“Até a existência de um banco como esse indica algumas deficiências sérias nas leis e na transparência da Bulgária”, afirma Dimitar Bechev, diretor do Instituto de Política Europeia de Sofia.
A Comissão Europeia, o braço executivo do Bloco, e a Autoridade Bancária Europeia, um órgão financeiro fiscalizador regional, pediram repetidamente a Sofia que cumprisse a garantia governamental sobre a poupança dos clientes do banco. Ambos abriram investigações para descobrir se as autoridades búlgaras haviam violado uma lei regional ao atrasar os pagamentos.
Ao enfrentar a perspectiva de acusações formais, o governo finalmente começou a devolver o dinheiro aos donos das contas em dezembro de 2014 (os dois inquéritos foram encerrados desde então).
As empresas também se beneficiam da atuação de Bruxelas como um baluarte contra os políticos búlgaros, assim como do acesso ao mercado comum da região e da possibilidade de exportar seus produtos sem restrições para todos os países do bloco.
Nos últimos anos, várias fabricantes de componentes de veículos – com clientes como a Volkswagen, a Daimler, a Mercedes e a Renault – se estabeleceram na Bulgária. O número de empresas do setor de autopeças triplicou desde que o país aderiu à UE, totalizando cerca de 120 e, no ano passado, a indústria representou 3,5 por cento da economia.
Uma pequena comunidade de startups também está sendo montada, e dois fundos com sede em Sofia investiram mais de US$ 21,5 milhões em cerca de 200 empresas nos últimos quatro anos, graças a uma iniciativa patrocinada pela UE.
Entre os negócios que receberam fundos estão um mercado on-line que conecta pequenos fazendeiros a potenciais clientes; um fabricante de brinquedos cujos produtos usam a energia gerada pela brincadeira das crianças para ativar luzes e sons; e uma companhia que desenvolveu um software de reconhecimento e organização de imagens.
E não são apenas as empresas principiantes que contam com vantagens – as mais antigas também.
“Desde que aderimos à União Europeia, o país se tornou mais estável e menos arriscado para os negócios”, afirma Manol Peykov, que administra a editora da família na segunda maior cidade da Bulgária, Plovdiv.
“Se não fosse pelas diretrizes e regras da UE, os políticos da Bulgária seriam intocáveis.”