Oxfam investiga 26 novos casos de abuso e assédio sexual
Além das consequências jurídicas, a ONG já perdeu cerca de 7.000 doadores regulares nos últimos dez dias
AFP
Publicado em 20 de fevereiro de 2018 às 12h22.
Depois da revelação de abuso cometido por membros da Oxfam no Haiti, mais casos estão vindo à tona: a ONG britânica disse, nesta terça-feira (20), que investiga 26 novos casos de comportamento sexual inadequado .
Pelo menos 16 desses casos têm relação com os programas internacionais da Oxfam, uma confederação de cerca de 20 organizações humanitárias que emprega 10 mil pessoas ao redor do mundo e que conta com milhares de voluntários.
Esses casos dizem respeito "a acontecimentos recentes, assim como a outros, historicamente mais antigos", declarou o diretor-geral da Oxfam, Mark Goldring, diante dos membros de uma comissão parlamentar britânica.
"Nós queremos, realmente, que as pessoas se manifestem", frisou, acrescentando que as investigações podem voltar a ser realizadas sobre esses casos mais antigos.
Nos últimos dias, outras revelações já tinham surgido. Vários funcionários da Oxfam também são acusados de estupro ao longo de missões humanitárias no Sudão do Sul e de abuso sexual na Libéria.
A Oxfam investiga ainda acusações de abuso sexual nas Filipinas, após a passagem de um tufão devastador em 2013. A diretora-geral na Ásia, Lan Mercado, disse ter conhecimento de queixas nesse país, assim como em Bangladesh e no Nepal no período de 2009 a 2013, mas garantiu que sua extensão "não é comparável" com o Haiti.
No ano passado, "87 ocorrências de incidentes" foram relatadas nesta ONG, no Reino Unido e no exterior. Destas, 35 foram comunicadas à comissão beneficente, a instituição britânica que controla as organizações humanitárias. Segundo Goldring, esses 87 casos vão de "episódios menores a muito graves".
O diretor-geral pediu desculpas "pelos danos que a Oxfam causou".
Queda no número de doadores: sete mil a menos
A ONG enviou para o governo haitiano a investigação feita em 2011 sobre a missão humanitária nesse país. Nela, um funcionário de alto perfil da organização admite ter pago prostitutas, enquanto outros são acusados de assédio e de intimidação. Uma testemunha foi ameaçada fisicamente.
Uma jovem haitiana contou ao jornal "The Times" ter tido uma relação com o agora ex-diretor da Oxfam no Haiti Roland Van Hauwermeiren. Na época, ela tinha 16 anos, e ele, 61.
Roland teria dado a ela dinheiro e fraldas para o recém-nascido. Segundo a jovem, o então diretor da Oxfam convidava para sua casa mulheres que iam pedir emprego e, às vezes, dava-lhes dinheiro.
Na semana passada, Van Hauwermeiren negou ter organizado orgias com jovens que se prostituíam e disse ter tido relações sexuais com "uma mulher honrada e de idade madura". Também garantiu que não havia dinheiro envolvido.
Sete funcionários da Oxfam no Haiti deixaram a ONG em meio à investigação interna. Quatro foram demitidos por "falta grave", enquanto que três pediram para deixar a instituição. Entre eles, estão Roland Van Hauwermeiren, a quem se propôs "uma saída digna, sob a condição de que ele coopere plenamente com o restante da investigação".
Depois de deixar a Oxfam, Roland van Hauwermeiren trabalhou para a organização francesa Ação contra a Fome em Bangladesh, de 2012 a 2014. Esta última lamentou não ter sido avisada sobre o comportamento do belga no Haiti, nem ter tido informada sobre as razões de sua demissão.
"Deveríamos ter sido mais pró-ativos", reconheceu Goldring, acrescentando que "deveríamos ter dito 'por favor, entre em contato. Há motivo para preocupação'".
Como consequência do escândalo da Oxfam, cerca de 7.000 doadores regulares interromperam o repasse de recursos nos últimos dez dias e alguns se questionam sobre a manutenção de seu apoio à ONG, relatou o diretor-geral.
Para conter os efeitos da crise, a Oxfam anunciou uma série de medidas, que inclui a criação de uma comissão "independente" que passará em revista a cultura e as práticas da organização.
O escândalo se estendeu a outras organizações humanitárias, como a Save the Children. A ONG britânica é acusada de não aplicar qualquer sanção a Brendan Cox, marido da deputada assassinada Jo Cox, quando se apontou um comportamento sexual inadequado, de sua parte, com colegas mulheres.
Interrogado pela comissão parlamentar, o diretor-geral da Save the Children, Kevin Watkins, explicou que a ONG elaborou dois relatórios que alertavam contra a propensão de "predadores masculinos" a se envolverem no setor humanitário para cometer abusos.
Segundo Watkins, apenas em 2016 a ONG identificou "193 casos" problemáticos envolvendo crianças, os quais levaram a cerca de 20 investigações policiais e a 11 demissões.