Novo Museu do Holocausto em Budapeste, Hungria (Bernadett Szabo/Reuters)
Gabriela Ruic
Publicado em 21 de outubro de 2018 às 06h00.
Última atualização em 21 de outubro de 2018 às 06h00.
Um museu construído na Hungria para lembrar os horrores do Holocausto está colocando setores da maior comunidade judaica do leste da União Europeia uns contra os outros.
O primeiro-ministro Viktor Orbán, o porta-voz dos movimentos nacionalistas na Europa, planeja inaugurar a Casa dos Destinos no ano que vem para homenagear as crianças que morreram no Holocausto. Mas o projeto suscitou críticas dos que afirmam que encobre o papel da Hungria no assassinato dos judeus durante a guerra e dividiu as organizações judaicas entre as aliadas ao governo e as que se opõem a ele.
“Nós éramos rivais e passamos a ser inimigos”, disse o rabino-chefe de Budapeste, Róbert Frölich, sobre a divisão dos grupos judeus do país. “E quando a rivalidade se transforma em guerra, não há vencedores, só perdedores.”
A briga é o mais recente conflito envolvendo os nativistas e o Holocausto depois que a Polônia criminalizou o ato de sugerir responsabilidade nacional na morte de milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial. A situação também ilustra a abordagem de dividir e conquistar de Orbán, que vai consolidando seu poder e busca uma “democracia iliberal”, o que o colocou em conflito com a UE.
O museu coincide com uma campanha cultural de Orbán, que instou seus partidários a incorporarem seus valores mais profundamente no tecido social da Hungria após sua terceira vitória eleitoral consecutiva em abril. Desde então, os meios de comunicação pró-governo denunciaram acadêmicos, artistas e ativistas que são considerados incompatíveis com a visão de Orbán de uma Europa homogênea e cristã, publicando listas com os nomes dessas pessoas e fazendo com que algumas perdessem o emprego.
O dono de uma publicação, o semanário Figyelö, é responsável pela Casa dos Destinos. O projeto em Budapeste, onde já existe um museu do Holocausto, ficou congelado durante anos porque Orbán prometeu inaugurá-lo só quando as agrupações judaicas chegassem a um acordo a respeito.
Tudo mudou quando o governo conseguiu o apoio da EMIH, uma organização judaica fundada em 2004. O líder da EMIH, o rabino Slomó Köves, disse neste mês que o museu possibilitaria que as novas gerações se conectassem emocionalmente com o Holocausto. Ele também disse que isso ainda era algo que não havia terminado.
Para outros, o lugar, situado nos prédios de uma estação ferroviária reformada, é, na melhor das hipóteses, uma manobra de Orbán para dividir a comunidade judaica de Budapeste e, na pior das hipóteses, uma tentativa de encobrir fatos sobre o assassinato de mais de meio milhão de judeus húngaros em campos de exterminação ou mortos sob governos húngaros aliados aos nazistas.
Um funcionário do museu Yad Vashem, de Jerusalém, disse que a exposição planejada era “claramente enganosa”, a ponto de falsificar a história. O Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos, em Washington, afirmou que a exposição é “muito seletiva” e “distorcida”. O instituto responsável pelo novo museu não respondeu aos pedidos de comentários.
“É um encobrimento da história”, disse András Kovács, diretor de estudos judaicos da Central European University em Budapeste. “Os líderes da Polônia e da Hungria estão tentando desviar a responsabilidade pelos capítulos desagradáveis de suas histórias.”