Guerra na Ucrânia: mulheres vão para o front (Mihir Melwani/SOPA Images/LightRocket via Getty Images/Getty Images)
AFP
Publicado em 30 de julho de 2022 às 19h08.
Katerina nunca tira fotos de seus companheiros antes de partir para o front. Considera que dá azar. Karina não conta à mãe que irá para o que chama de "linha zero". Iana usa as redes sociais para tentar animar seus familiares.
Em mais um dia de guerra no leste da Ucrânia, as três descansam com sua unidade em um vilarejo, antes de um novo rodízio. Elas aceitam conversar sobre sua vida na frente de batalha, sobre o conflito, que não esperavam, e sobre os últimos cinco meses, que "pareceram anos".
Katerina Novakivska, 29, é subcomandante de uma unidade no Donbas, região industrial que os russos tentam controlar e onde os combates causam estragos. Pequena, morena, magra e de olhos pretos, a jovem, natural de Vinnytsia (centro), havia acabado de se formar na academia do Exército quando a guerra começou.
Katerina é responsável principalmente pelo apoio moral e psicológico às tropas. Após o discurso habitual sobre o "ânimo satisfatório" dos soldados e a legitimidade de sua luta, ela explica que "o mais difícil para eles é perder companheiros", e, para ela, distanciar-se dos relatos de horror.
"Confiam em mim porque há muitas coisas que não podem contar às pessoas queridas", diz a subcomandante. O maior medo deles é de serem abandonados, mortos ou feridos, no campo de batalha.
Katerina lembra o dia fatídico de 28 de maio, em que 11 soldados morreram e cerca de 20 desapareceram. No estrondo da invasão, homens desaparecem e ninguém pode dizer o que aconteceu com eles.
A subcomandante confessa que seu maior medo é o de ser sequestrada por soldados russos. "Mas já planejei tudo", conta, mencionando a possibilidade de se suicidar antes de cair nas mãos dos inimigos.
Katerina tem uma pequena cicatriz no nariz deixada por uma explosão ocorrida em março, e, no antebraço, uma flor de lótus, tatuagem feita em 2017 na cidade de Volnovakha, ocupada pelos russos e que, segundo ela, "não existe mais".
Nas redes sociais, Iana Pazdri brinca com o estereótipo de ser um soldado e exibe suas unhas perfeitamente pintadas enquanto dirige um blindado ou manuseia uma arma.
Aos 35 anos, Iana está em combate desde o começo da invasão à Ucrânia e, como seus companheiros, não vê os filhos há cinco meses. "Eu me ofereci como voluntária porque sou patriota e achei que poderia ser útil aqui", conta ela, que se refere ao Exército como uma família.
Sempre que sobra tempo, Iana publica extratos da vida militar no Instagram e no Tik Tok. "Alguns soldados têm que viver na linha zero, sob bombardeios", conta, citando o termo usado com frequência na Ucrânia para se referir à linha de frente. "Mas honestamente, às vezes é difícil."
Dezenas de soldados são mortos diariamente na linha de frente do leste ucraniano, onde as forças russas fizeram grandes avanços em maio e junho, tomando praticamente toda a região de Lugansk. Desde então, a linha de frente se moveu pouco, mas as batalhas de artilharia se intensificaram.
Karina, ex-trabalhadora da área têxtil de origem tadjique, entrou para o Exército em 2020, com um contrato de dois anos. Ela dirige um blindado na linha de frente.
"Quando você está posicionado, é difícil pensar em seus companheiros, com a esperança de que ninguém seja morto ou ferido, que você mesma não fique sob ataque", conta a jovem, que também é formada em mecânica.
O marido de Karina a aguarda com ansiedade em casa, mas ela ressalta: "Ninguém me diz o que devo fazer." Quando telefona para sua mãe, não conta que está na linha de frente, "e ela finge que acredita", conta.
Karina não acredita que a guerra terá um fim próximo. "Os russos já conquistaram bastante território." Já para Iana, a derrota não é uma opção. "Aconteça o que acontecer, venceremos. Não temos o direito de perder", ressalta a combatente, que deseja viajar para o Caribe e a América do Sul após o conflito."Preciso realizar meus sonhos. Acho que mereço", diz, com um sorriso.
Veja também: