Kadhafi lança repressão feroz para salvar regime líbio
Ditador aumenta violência contra manifestantes, apesar da pressão internacional para que ele permita reformas no país
Da Redação
Publicado em 21 de fevereiro de 2011 às 18h20.
Trípoli- O regime líbio do coronel Muamar Kadhafi, no poder há 42 anos, lançou nesta segunda-feira uma feroz repressão para tentar sufocar uma rebelião que tomou o controle de várias cidades e provocou deserções no governo.
A televisão estatal anunciou uma operação das forças de segurança "contra os sabotadores e os que semeiam o terror", durante a qual "várias pessoas morreram", sem informar o local dos confrontos ou o número de falecidos.
Moradores de Trípoli, onde no domingo foram registrados ataques contra meios de comunicação e prédios oficiais, denunciaram um "massacre" nos bairros de Tayura e Fashlum, da capital.
O filho de Kadhafi, Saif al Islam, havia intimado poucas horas antes os líbios a acabar com a rebelião.
"Dirijo-me a vocês pela última vez antes de recorrer às armas", disse Al Islam, antes de advertir que a Líbia não é "Tunísia nem Egito", em referência às revoluções que provocaram nestes países nas últimas semanas a queda de outros regimes autoritários.
A estimativa de mortos desde o início da revolta, do dia 15 de fevereiro até as primeiras horas desta segunda-feira, ia de 230 (segundo a Human Rights Watch) a cerca de 300 a 400 (segundo a Federação Internacional de Direitos Humanos).
Em Tobruk, perto da fronteira com o Egito, dez egípcios morreram baleados por "grupos armados de mercenários líbios", indicou à AFP um médico egípcio, citando compatriotas que fugiram do país em conflito.
No outro extremo do país, tunisianos que deixaram a Líbia informaram à AFP que os policiais de Zauia haviam desertado e que esta região, a 60 km a oeste de Tripoli, estava mergulhada no caos.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, instou Kadhafi em uma conversa por telefone a "cessar imediatamente" a violência, informou o porta-voz de Ban, Martin Nesirky.
E o secretário-geral da Otan, Anders Fogh Rasmussen, urgiu as autoridades líbias a pôr fim à repressão contra civis desarmados e a responder às "aspirações" legítimas da população a uma mudança democrática.
O filho de Kadhafi reconheceu nesta segunda-feira que em Benghazi (leste) "os tanques se deslocam conduzidos por civis" e que em Al-Baida (leste) "as pessoas estão armadas de fuzis e diversos depósitos de munições foram saqueados".
Os confrontos chegaram no domingo à capital, onde a multidão saqueou as instalações de uma rede de televisão e de uma rádio públicas e incendiou delegacias e prédios do governo.
A rebelião provocou discórdia na cúpula do regime: o ministro da Justiça, Mustafá Abdel Yalil, renunciou ao cargo para protestar contra "o uso excessivo da força" na repressão aos protestos, e pelo menos três diplomatas líbios no exterior fizeram o mesmo desde domingo.
Kadhafi não fez nenhuma declaração pública desde o início dos protestos, e nesta segunda-feira o ministro britânico das Relações Exteriores, William Hague, disse em Bruxelas que o coronel líbio poderia ter fugido de seu país e ido para a Venezuela, embora as autoridades venezuelanas tenham desmentido esta versão.
O vice-ministro líbio das Relações Exteriores, Khaled Kaim, afirmou durante à noite a uma rede de televisão que Kadhafi segue na Líbia.
As embaixadas europeias na Líbia "estão coordenando" desde domingo à noite "a saída dos cidadãos europeus que assim o desejarem", explicou a ministra espanhola de Relações Exteriores, Trinidad Jiménez, ao término de uma reunião com representantes da União Europeia (UE) em Bruxelas.
Os Estados Unidos ordenaram a todo o seu pessoal não essencial a abandonar a Líbia e advertiram aos cidadãos americanos que evitem viajar a este país.
A situação na Líbia, um país produtor de petróleo, aumentou os temores sobre o abastecimento, fazendo o barril ser negociado nesta segunda-feira acima dos 105 dólares em Londres, pela primeira vez desde setembro de 2008.
As bolsas europeias registraram baixas importantes, que chegaram a 3,59% em Milão, como consequência da revolta de um dos maiores sócios comerciais da Itália no setor do petróleo e bancário.
A agência de classificação de riscos Fitch rebaixou, por sua vez, em um grau a nota da dívida soberana da Líbia, de BBB+ a BBB, devido à "crescente revolta popular" contra o regime de Kadhafi.