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Irã: o lento avanço dos negócios

A retomada das exportações do petróleo não tem tido como contrapartida um ressurgimento dos negócios nos outros setores da economia. E isso por dois motivos. O primeiro é de ordem prática e diz respeito às mesmas dificuldades financeiras observadas no setor de petróleo. Os bancos têm muito receio de realizar operações com o Irã, depois […]

GARÇONS EM TEERÃ: os iranianos não podem usar cartão de crédito por sanções impostas após a revolução de 1979 / Majid Saeedi/ Getty Images

GARÇONS EM TEERÃ: os iranianos não podem usar cartão de crédito por sanções impostas após a revolução de 1979 / Majid Saeedi/ Getty Images

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Da Redação

Publicado em 7 de junho de 2016 às 12h31.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h39.

A retomada das exportações do petróleo não tem tido como contrapartida um ressurgimento dos negócios nos outros setores da economia. E isso por dois motivos. O primeiro é de ordem prática e diz respeito às mesmas dificuldades financeiras observadas no setor de petróleo. Os bancos têm muito receio de realizar operações com o Irã, depois do trauma sofrido em 2014 pelo BNP-Paribas, multado em 9 bilhões de dólares por violar as sanções. O secretário de Estado americano, John Kerry, já procurou tranquilizar os bancos estrangeiros de que não haverá retaliações, mas o setor se mostra cauteloso.

Um funcionário de uma empresa de exportação e importação em Teerã conta que foi um dia ao banco ver se já podia fazer transferência entre uma instituição estrangeira e uma iraniana, mas recebeu um “não” como resposta. “Os bancos não se atrevem”, diz ele. “Têm medo de perder benefícios dos Estados Unidos.” Outro empregado numa agência de turismo afirma que, para cada pacote que vende no valor de 4.000 euros, por exemplo, tem de pagar de 200 a 300 euros de comissão para bancos chineses fazerem a triangulação entre o país do cliente e o Irã. Cartões de crédito não funcionam no Irã desde a imposição das sanções relacionadas à revolução de 1979.

Depois das sanções relativas ao programa nuclear, em 2006, os bancos estrangeiros deixaram o Irã e não voltaram ainda. “O levantamento das sanções é como uma rodovia recém-construída, mas que ninguém usa”, define um funcionário do governo iraniano.

Muitas delegações de empresários vêm e vão, mas não concretizam negócios nem sequer trocam cartões de visita com medo de deixar “pegadas”. No Irã, os maiores e mais lucrativos segmentos da economia estão vinculados à Guarda Revolucionária, as forças armadas de elite, subordinadas ao líder espiritual Ali Khamenei. A guarda, que distribui oportunidades de negócios e de privilégios para uma plutocracia em troca de apoio político ao líder, está sob sanção dos Departamentos de Estado e do Tesouro dos Estados Unidos, sob acusação de envolvimento no programa nuclear e de abusos de direitos humanos. E o governo iraniano como um todo está na lista do Departamento de Estado de patrocinadores do terrorismo.

Essa realidade política não tende a mudar. Embora no Iraque estejam lutando contra o inimigo comum do Ocidente, o Estado Islâmico, a Guarda Revolucionária e as milícias xiitas sustentadas pelo Irã estão metidas até o pescoço na defesa do regime de Bashar Assad na Síria, por exemplo. Internamente, está havendo um recrudescimento do líder espiritual. Khamenei tem feito discursos hostis ao Ocidente e em favor da imposição rígida do código de conduta moral do islamismo conservador.

Os sinais são de que o líder espiritual, que controla o Conselho Guardião da Constituição, que aprova e reprova candidatos, não apoiará a candidatura do presidente Hassan Rohani à reeleição no ano que vem. Khamenei tem se reaproximado do ex-presidente Mahmud Ahmadinejad, com o qual rompera por causa de sua influência crescente sobre a Guarda Revolucionária e também por sua retórica provocativa, que acirrou os ânimos do Ocidente na crise nuclear e levou à imposição das sanções. Outro possível protegido na eleição presidencial do ano que vem seria Qassem Suleimani, comandante da Força Quds, a legião estrangeira da Guarda Revolucionária.

Apesar de tudo isso, não se deve subestimar o impacto benéfico do levantamento das sanções — espécie de retirada do bode da sala — sobre a economia iraniana no curto prazo. Em relatório no dia 1o de abril, o Banco Mundial projetou um crescimento de 4,2% do PIB para este ano e de 4,6% para 2017, impulsionado principalmente pela produção de petróleo e gás. Os índices foram -1,9% em 2013; 4,3% em 2014; e 1,9% no ano passado. Com a melhora das receitas provenientes das exportações, o déficit deve cair de 1,8% em 2016 para 1% no ano que vem. E o balanço das contas-correntes poderá ser superavitário em 2017, de novo por causa das exportações de petróleo.

Agora imagine se a política não atropelasse a economia? Bem, mas isso não acontece só no Irã.

(Lourival Sant’Anna) 

 

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