Mundo

Hruban, da Bertelsmann: o populismo foi derrotado na Alemanha?

Pela primeira vez, um partido de extrema-direita vai ocupar assentos no parlamento alemão, o Bundestag

Emily Hruban: Para especialista, o fato de uma parcela da população da Alemanha apoiar um partido de extrema-direita é chocante; assunto é tabu no país, que foi berço do nazismo (foto/Divulgação)

Emily Hruban: Para especialista, o fato de uma parcela da população da Alemanha apoiar um partido de extrema-direita é chocante; assunto é tabu no país, que foi berço do nazismo (foto/Divulgação)

CR

Carolina Riveira

Publicado em 22 de setembro de 2017 às 20h39.

Última atualização em 24 de setembro de 2017 às 13h44.

É bem provável que a chanceler alemã Angela Merkel seja eleita para um quarto mandato no domingo. Os eleitores vão às urnas para escolher a nova configuração do Parlamento, chamado de Bundestag, e o partido da atual comandante do país, o União Democrata-Cristão (CDU), deve manter a maioria, levando cerca de 36% dos votos. Uma vitória sobre o partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), que deve conquistar 11% dos votos – se tornando a primeira legenda ultra-conservadora a conquistar cadeiras no legislativo em meio século.

Nesse cenário, é possível afirmar que o populismo foi vencido? Para a antropóloga Emily Hruban, diretora de relações transatlânticas na fundação alemã Bertelsmann, instituição especializada em participação social, as raízes que deram força a políticos extremistas permanecem. E, para um país que foi berço do nazismo, o fato de um partido como esse conquistar 10% do eleitorado é considerado chocante.

O AfD deve conseguir 11% dos votos  e ser o primeiro partido de extrema-direita a chegar ao Bundestag em meio século. Ainda assim, a eleição gira em torno de dois candidatos de centro. Isso é prova de que o populismo não teve tanta força na Alemanha como teve na França?

A ascensão dos movimentos extremistas não acabou, e vamos continuar falando sobre isso no futuro. Mas a Alemanha é um caso particular. Por causa do nazismo e do comunismo, somos muito cuidadosos com qualquer tipo de extremismo. O fato de que o Alternativa para a Alemanha pode ficar com mais de 10% dos votos é chocante, sim. Sempre dissemos que não deveria haver partido à direita do CDU, justamente por causa desse histórico. Mas o CDU e o SPD [partido social-democrata, de Martin Schulz] perderam apoio. Embora Schulz e Merkel sejam os principais candidatos, eles vêm perdendo apoio. E uma coisa importante a dizer sobre o sistema alemão é que eles não votam necessariamente nos candidatos, votam nos partidos para o Parlamento.

A Alemanha sofreu menos com a crise que o restante dos países europeus. o desemprego no país, por exemplo, está em cerca de 4%, menor que os quase 10% na França. É a economia que dá força a Merkel?

A Merkel é menos popular na Alemanha do que é fora, e o sucesso econômico dos anos de crise é menos atribuído a ela na Alemanha do que no exterior. Mesmo com os números bons da economia, trabalhadores têm experimentado muito essa crise, sobretudo os menos escolarizados. E as pessoas estão descontentes não só com a economia, mas também com a imigração. Muitas pessoas estão descontes com a Merkel por causa dos refugiados.

Por que o Schulz não engrenou como alternativa a Merkel?

Para o SPD, é muito difícil se diferenciar do CDU. Eles têm toda a bagagem de já terem estado no poder e foram responsáveis pelas decisões do governo nos últimos anos. Jovens, por exemplo, estão descontentes com o status quo. Nos Estados Unidos, votariam pelo Bernie Sanders [pré-candidato do partido Democrata para as eleições presidenciais de 2016]. Mas o SPD não se mostra uma alternativa para eles. Também tem gente que não deve votar no domingo porque não acredita nem em Merkel nem em Schulz, e um terço da população ainda está indecisa.

O eleitor do AfD é o mesmo que apoiou, por exemplo, Marine Le Pen [candidata ultraconservadora da Frente Nacional] na França? Se a economia voltar a piorar, o partido pode se tornar uma ameaça maior?

As pessoas que votam pelo AfD são as que estão mais descontentes. É o mesmo tipo de descontentamento que levou ao Brexit, no Reino Unido, ou à eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos. Mas apoiar o AfD ainda é um tabu, não é tão aceito socialmente. É um partido que vai contra os valores dos outros partidos, que quebra regras sociais. Ser populista e mais extremista não foi um tabu para o Trump, tanto quanto é na Alemanha. Por enquanto, não tem condição de um partido formar coalizão com o AfD, eles devem ficar isolados no Bundestag. O que pode acontecer em alguns anos é as pessoas passarem a se acostumar com eles. Até porque, dentro do partido, há pessoas focadas em assuntos sociais, não tão contrárias à União Europeia. Como todo partido, não é unificado. Essas vozes mais moderadas podem ganhar força, mas é um perigo real que eles fiquem mais massificados.

Acompanhe tudo sobre:AlemanhaAngela MerkelEleiçõesExame Hoje

Mais de Mundo

Exportações da China devem bater recorde antes de guerra comercial com EUA

Yamandú Orsi, da coalizão de esquerda, vence eleições no Uruguai, segundo projeções

Mercosul precisa de "injeção de dinamismo", diz opositor Orsi após votar no Uruguai

Governista Álvaro Delgado diz querer unidade nacional no Uruguai: "Presidente de todos"