Grã-Bretanha divide-se sobre participação na UE
País é grande comprador do bloco e tem relações comerciais equilibradas com o resto do mundo; já a UE tem maior dependência dos ingleses
Da Redação
Publicado em 18 de dezembro de 2011 às 12h16.
Londres - A decisão do premiê britânico David Cameron de vetar, em 9 de dezembro, o tratado da União Europeia extrapolou até mesmo a cartilha do partido do qual faz parte, o Conservador – que, apesar da histórica postura crítica em relação à Europa, sempre primou pela diplomacia, em vez do rompimento. A Grã-Bretanha ficou, assim, isolada no mapa do euro e hoje é profunda a barreira política entre Cameron, de um lado, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e a chanceler alemã, Angela Merkel, de outro. Contudo, essa distância não é intransponível. Ambos têm reiterado que querem a Grã-Bretanha como parte do bloco, e a explicação está nos números.
Europa precisa dos britânicos – Em coluna publicada no jornal The Independent, o jornalista Hamish McRae compilou uma série de dados do chamado "Pink Book" (ou livro rosa, por conta da cor de sua capa) – uma publicação anual da Secretaria Nacional de Estatísticas que disseca a economia britânica. Os números, publicados oficialmente em 23 de novembro e referentes ao ano passado, mostram que a Europa precisa muito mais da Grã-Bretanha do que o contrário.
De acordo com o Pink Book, a Europa teve em 2010 uma balança comercial positiva de 66 bilhões de libras esterlinas (cerca de 200 bilhões de reais) com os britânicos. Deste total, cerca de 20 bilhões de libras equivaliam a vendas externas da Alemanha, de Merkel. No tocante a sua relação com a economia global, o Reino Unido reequilibrou suas contas com o auxílio das exportações de serviços aos Estados Unidos e à Oceania, com importante contribuição das operações dos bancos estabelecidos na City of London – o maior centro financeiro do continente. Somente a operação financeira da City rendeu, de acordo com a publicação do governo, 32 bilhões de libras aos cofres britânicos no ano passado – dinheiro suficiente para aliviar a metade do déficit da balança com a Europa.
Pertecer ou não pertencer
Esse laço “mal dado” entre a Grã-Bretanha e a Europa, que já dura 38 anos, pode ser esmiuçado em frias análises econômicas, mas o sentimento de pertencimento ao bloco extrapola essas questões. Influenciada por razões históricas e culturais, a população britânica divide-se sobre o assunto.
“O britânico é, em sua maioria, contra a participação do país na União Europeia. Mas se você for perguntar o porquê, muita gente não vai saber dizer a razão", afirmou o especialista em política do jornal Financial Times, Kiran Stacey, em comentário ao veto de Cameron.
De acordo com pesquisas da Comissão Europeia, a Letônia, a Grã-Bretanha e a Hungria estão no topo da lista dos países mais divididos sobre a aliança com o bloco econômico. Cerca de 30% dos britânicos rechaçam a UE, enquanto outros 30% aprovam a participação do país. Os 40% restantes se dizem indiferentes ou neutros.
A força dos eurocéticos – O partido conservador de David Cameron representa esses 30% contrários à aliança com o bloco. O grupo, chamado de eurocético, argumenta que o dinheiro britânico se perde em burocracia e corrupção, apontando que a União Europeia não presta contas como deveria. Analistas previam, antes de Cameron assumir o poder, que seu governo seria o mais eurocético da história – e acertaram em cheio.
Líderes conservadores do passado, como Margaret Thatcher e John Major, usaram da diplomacia para conseguir tudo o que queriam da zona do euro, sem ceder à sua influência direta. Thatcher obteve em 1984 um desconto nas contribuições da Grã-Bretanha ao orçamento europeu. Em 1993, Major driblou o Tratado de Maastricht, deixando o país fora do alcance da moeda única. Cameron foi além e praticamente rompeu com o bloco.
No período do governo trabalhista de Tony Blair e Gordon Brown (1997-2010), a Grã-Bretanha foi oficialmente pró-União Europeia e os eurocéticos protestaram, seguidas vezes, contra a aproximação. Agora, a ordem está invertida. O vice-primeiro-ministro Nick Clegg, do partido liberal democrata, também favorável ao alinhamento ao bloco econômico, passou a protestar, assim como a fatia da população britânica que defende laços mais firmes com a UE.
"Há uma imagem romântica e vaidosa do país, e os conservadores eurocéticos usam essa versão de que a Grã-Bretanha não vai se render aos nossos 'inimigos' no continente. É uma posição míope e perigosa, porque precisamos de aliados nesse período de incertezas", defende o estudante britânico Anthony Harris, de Birmingham, a segunda maior cidade da ilha.
Londres - A decisão do premiê britânico David Cameron de vetar, em 9 de dezembro, o tratado da União Europeia extrapolou até mesmo a cartilha do partido do qual faz parte, o Conservador – que, apesar da histórica postura crítica em relação à Europa, sempre primou pela diplomacia, em vez do rompimento. A Grã-Bretanha ficou, assim, isolada no mapa do euro e hoje é profunda a barreira política entre Cameron, de um lado, e o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e a chanceler alemã, Angela Merkel, de outro. Contudo, essa distância não é intransponível. Ambos têm reiterado que querem a Grã-Bretanha como parte do bloco, e a explicação está nos números.
Europa precisa dos britânicos – Em coluna publicada no jornal The Independent, o jornalista Hamish McRae compilou uma série de dados do chamado "Pink Book" (ou livro rosa, por conta da cor de sua capa) – uma publicação anual da Secretaria Nacional de Estatísticas que disseca a economia britânica. Os números, publicados oficialmente em 23 de novembro e referentes ao ano passado, mostram que a Europa precisa muito mais da Grã-Bretanha do que o contrário.
De acordo com o Pink Book, a Europa teve em 2010 uma balança comercial positiva de 66 bilhões de libras esterlinas (cerca de 200 bilhões de reais) com os britânicos. Deste total, cerca de 20 bilhões de libras equivaliam a vendas externas da Alemanha, de Merkel. No tocante a sua relação com a economia global, o Reino Unido reequilibrou suas contas com o auxílio das exportações de serviços aos Estados Unidos e à Oceania, com importante contribuição das operações dos bancos estabelecidos na City of London – o maior centro financeiro do continente. Somente a operação financeira da City rendeu, de acordo com a publicação do governo, 32 bilhões de libras aos cofres britânicos no ano passado – dinheiro suficiente para aliviar a metade do déficit da balança com a Europa.
Pertecer ou não pertencer
Esse laço “mal dado” entre a Grã-Bretanha e a Europa, que já dura 38 anos, pode ser esmiuçado em frias análises econômicas, mas o sentimento de pertencimento ao bloco extrapola essas questões. Influenciada por razões históricas e culturais, a população britânica divide-se sobre o assunto.
“O britânico é, em sua maioria, contra a participação do país na União Europeia. Mas se você for perguntar o porquê, muita gente não vai saber dizer a razão", afirmou o especialista em política do jornal Financial Times, Kiran Stacey, em comentário ao veto de Cameron.
De acordo com pesquisas da Comissão Europeia, a Letônia, a Grã-Bretanha e a Hungria estão no topo da lista dos países mais divididos sobre a aliança com o bloco econômico. Cerca de 30% dos britânicos rechaçam a UE, enquanto outros 30% aprovam a participação do país. Os 40% restantes se dizem indiferentes ou neutros.
A força dos eurocéticos – O partido conservador de David Cameron representa esses 30% contrários à aliança com o bloco. O grupo, chamado de eurocético, argumenta que o dinheiro britânico se perde em burocracia e corrupção, apontando que a União Europeia não presta contas como deveria. Analistas previam, antes de Cameron assumir o poder, que seu governo seria o mais eurocético da história – e acertaram em cheio.
Líderes conservadores do passado, como Margaret Thatcher e John Major, usaram da diplomacia para conseguir tudo o que queriam da zona do euro, sem ceder à sua influência direta. Thatcher obteve em 1984 um desconto nas contribuições da Grã-Bretanha ao orçamento europeu. Em 1993, Major driblou o Tratado de Maastricht, deixando o país fora do alcance da moeda única. Cameron foi além e praticamente rompeu com o bloco.
No período do governo trabalhista de Tony Blair e Gordon Brown (1997-2010), a Grã-Bretanha foi oficialmente pró-União Europeia e os eurocéticos protestaram, seguidas vezes, contra a aproximação. Agora, a ordem está invertida. O vice-primeiro-ministro Nick Clegg, do partido liberal democrata, também favorável ao alinhamento ao bloco econômico, passou a protestar, assim como a fatia da população britânica que defende laços mais firmes com a UE.
"Há uma imagem romântica e vaidosa do país, e os conservadores eurocéticos usam essa versão de que a Grã-Bretanha não vai se render aos nossos 'inimigos' no continente. É uma posição míope e perigosa, porque precisamos de aliados nesse período de incertezas", defende o estudante britânico Anthony Harris, de Birmingham, a segunda maior cidade da ilha.