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Eleição de Israel mostrará se vacinas podem salvar governo de Netanyahu

Com governos sem conseguir alianças para governar, Israel terá sua quarta eleição em dois anos. Mas vacinação recorde pode trazer novo cenário

Soldado em frente a cartaz de campanha de Netanyahu: Likud, partido do premiê, deve ter maioria, mas ainda insuficiente (Corinna Kern/Reuters)
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Carolina Riveira

Publicado em 22 de março de 2021 às 06h00.

Última atualização em 22 de março de 2021 às 13h28.

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O país estrela da vacinação na pandemia vai às urnas. Israel realiza na terça-feira, 23 (ainda madrugada no Brasil), sua quarta eleição legislativa em dois anos. O pleito tende a conceder ligeira vantagem ao premiê Benjamin Netanyahu , mas a dúvida é se a perspectiva de um país vacinado poderá finalmente dar ao eleito nesta semana uma aliança forte o suficiente para governar, o que não é visto em Israel há tempos.

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Bibi, como Netanyahu é conhecido, conseguiu a proeza de transformar Israel em cliente preferencial da Pfizer e de ter vacinado fatia recorde da população contra o coronavírus. Desde dezembro, mais de 57% dos israelenses tomaram ao menos a primeira dose (e 50% já tomaram também a segunda).

Entre primeira e segunda dose, Israel já aplicou mais vacinas do que seus 9 milhões de habitantes, e o número de mortes por covid-19 caiu drasticamente.

Em quase qualquer país, não haveria dúvidas de que o governo no poder em meio a tal campanha seria reeleito. Mas, antes que o mundo só falasse de vacinas, Israel vivia às voltas com outras questões próprias — e que voltarão à tona hoje.

Netanyahu, no poder desde 2009 (e antes disso em 1996) pelo partido de direita Likud, responde a três processos por corrupção, a voltarem a julgamento depois da eleição.

A queda em sua popularidade tem feito com que o Likud não consiga manter um governo nos últimos anos. No pleito desta semana, pesquisas apontam que o partido do premiê deve ter mais cadeiras do que os concorrentes, na casa dos 30 de 120 assentos. Mas o número é ainda longe da maioria necessária e coloca novamente o partido sob necessidade de fazer amplas alianças.

Em 2019, o Likud chegou a perder para a coalizão de centro-direita Azul e Branco, recém-formada pelo ex-Chefe do Estado-Maior Benny Gantz, mas a oposição tampouco conseguiu formar um governo. Já na última eleição, em 2020, Netanyahu e Gantz se uniram para tentar um governo conjunto, no qual agora Gantz é ministro da Defesa e premiê rotativo. Mas não só a união não deu certo e novas eleições foram convocadas, como a participação de Gantz no governo não pegou bem e o Azul e Branco despencou nas pesquisas.

Há críticas a Netanyahu mesmo com a vacinação. Neste fim de semana, manifestantes foram às ruas no que foi tido como o maior protesto contra o governo dos últimos anos, com mais de 20.000 pessoas pedindo que Netanyahu deixe a liderança do país. Mas a oposição está mais fragmentada do que nunca, novamente sem um grande grupo capaz de fazer frente ao premiê.

Protestos contra Netanyahu em Tel Aviv: há grupos diversos insatisfeitos com o premiê, mas oposição é fragmentada (Ammar Awad/Reuters)

Israel tem um sistema parlamentarista peculiar: a cláusula de barreira para entrada de partidos no Parlamento é de 3,25%, o que faz com que o Legislativo tenha a cada eleição mais de uma dezena de legendas. Em democracias parlamentaristas europeias, por exemplo, a barreira costuma ser mais alta, de mais de 5% ou até 8% dos votos, e com o poder concentrado em três ou quatro grandes partidos.

Por isso, é historicamente difícil formar um governo em Israel. Em 70 anos, foram mais de 30 governos, média de um governo a cada dois ou três anos. Mas os últimos anos têm sido atípicos até para os habituados. Se um candidato não conseguir formar e manter um governo, como já aconteceu nos pleitos anteriores, o país pode ter de convocar sua quinta eleição, o que seria uma situação sem precedentes e indesejada.

Neste cenário, Netanyahu enxergou na vacina oportunidade importante para melhorar sua imagem. E empregou nela grandes esforços: reza a lenda que tenha ligado para o presidente da Pfizer dezenas de vezes e negociado pessoalmente a compra de vacinas. "Acredito que você precisa de liderança pessoal aqui. É como checar as munições em uma guerra", disse neste ano no Fórum Econômico Mundial.

"Netanyahu é muito bom em transformar proezas nacionais em proezas dele, como o fato de Israel ter uma economia pujante em alta tecnologia e ter PIB per capita crescente", diz o cientista político André Lajst, diretor no Brasil da organização pró-Israel StandWithUs. "Com a vacina não é diferente."

Lajst lembrou que Netanyahu e o Likud chegaram nos últimos dias a ser proibidos pelas autoridades eleitorais de usar na campanha o slogan da vacinação do Ministério da Saúde (algo como "voltando à vida", em português).

Além disso, antes da vacinação, as quarentenas da covid-19 em Israel, que estiveram entre as mais restritas do mundo, também haviam enfraquecido o governo. Com metade da população vacinada, o país começou agora um processo de reabertura no qual espera não retroceder. Em discursos, Netanyahu tem prometido que Israel será "o primeiro país do mundo a sair da pandemia".

Outros temas recorrentes no país, no entanto, não sairão do radar dos eleitores — e aí estão as fraquezas de Netanyahu. Além dos questionamentos contra ele e seu governo por corrupção, estão na pauta as frequentes preocupações com segurança. A eleição medirá, por exemplo, a popularidade ou não dos acordos de paz de Netanyahu com países árabes. Foram feitos no ano passado acordos com Bahrein, Emirados Árabes Unidos e Sudão, costurados pelo presidente americano, Donald Trump.

"Pode haver uma percepção por parte dos eleitores de que Netanyahu decidiu fazer acordos com países do Golfo à custa da soberania israelense na Cisjordânia. A pergunta é quantos são esses eleitores", diz o professor Samuel Feldberg, da USP e da Universidade de Tel Aviv, em evento sobre as eleições israelenses organizado pela StandWithUs.

Com a queda do Azul e Branco de Gantz, outro nome que tenta capitalizar na oposição às políticas de aproximação com os árabes é o ex-ministro Gideon Sa'ar, que deixou o Likud e fundou no ano passado o partido de direita New Hope (que, apesar de jovem, espera liderar a oposição).

Até mesmo as pesquisas de opinião em Israel não dividem os partidos em esquerda ou direita, mas em blocos pró e contra Netanyahu. No mesmo grupo de oposição se misturam desde representantes árabes até os nomes que questionam a aproximação com os vizinhos, como Gideon Sa'ar e Gantz.

A prova da confusão: o segundo partido mais votado, o centrista Yesh Atid, que se diz representante da classe média (e defende pautas tidas como sociais, como o casamento civil, o fim da corrupção e retirada de assentamentos judaicos em território palestino), já esteve tanto em governos do Likud quanto na coalizão do Azul e Branco.

A eleição será, portanto, novamente um referendo sobre Netanyahu e a pandemia. Mas, desta vez, será também uma das primeiras ocasiões em que o poder das vacinas na política será posto à prova. O resto do mundo estará observando.

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