Com uma série de ordens executivas, o presidente dos EUA, Donald Trump, demonstrou que tem apetite para uma luta audaciosa para refazer a educação pública à imagem de seu movimento político populista "anti-woke". No entanto, em um país marcado pelo controle local das escolas, é provável que o esforço do republicano se depare com problemas legais, logísticos e de financiamento ao testar os limites do poder federal sobre o ensino fundamental e médio.
Na noite de quarta-feira (29), Trump assinou duas ordens executivas. Uma delas focadaem raça, gênero e história americana.Ela procura impedir que as escolas reconheçam as identidades transgênero ou ensinem conceitos comoracismo estrutural, “privilégio branco” e “preconceito inconsciente”, ameaçando seu financiamento federal.
A ordem também promove uma educação “patriótica” que retrata a fundação americana como “unificadora, inspiradora e enobrecedora”, ao mesmo tempo em que explica como os Estados Unidos “se aproximaram admiravelmente de seus nobres princípios ao longo de sua história”.
O segundo decreto orienta uma série de órgãos federais a procurar maneiras de expandir o acesso a vouchers de escolas particulares, um sistema de financiamento governamental que permite aos pais escolherem a escola que os seus filhos frequentarão.
Ambas as ordens ecoam a enérgica legislação conservadora nos estados. Nos últimos cinco anos, o número de crianças que usam o dinheiro do contribuinte para pagar os custos da educação particular ou da educação domiciliar dobrou, chegando a um milhão. Mais de 20 estados restringiram a forma como raça, gênero e história americana podem ser discutidos nas escolas. Além disso, alguns estados e conselhos escolares proibiram milhares de livros.
Não está claro o efeito real que as novas determinações federais podem ter em lugares onde as mudanças ainda não estão em andamento. Os estados e as localidades fornecem 90% do financiamento para a educação pública, com o poder exclusivo de definir currículos, testes, métodos de ensino e políticas de escolha de escolas.
É provável que as ordens se choquem com os limites do papel do governo federal no ensino fundamental e médio, um papel que Trump disse que deveria ser reduzido.
Esse paradoxo é “confuso”, disse Derrell Bradford, presidente da 50CAN, um grupo apartidário que apoia a escolha de escolas particulares. Ele aplaudiu a ordem executiva sobre vouchers e disse que, juntas, as duas ordens marcam um momento importante no debate secular sobre os valores que as escolas do país devem transmitir.
— Você pode gostar ou não, mas não teremos escolas neutras em termos de valores — disse ele.
Ainda assim, há muitas questões legais sobre a capacidade do governo de restringir o financiamento federal para pressionar as escolas.
O principal fluxo de financiamento que apoia as escolas públicas, conhecido como "Title I", é enviado aos estados em uma fórmula definida pelo Congresso, e o presidente tem pouco poder para restringir seu fluxo.
— Parece que uma parte significativa da estratégia é estabelecer prioridades por meio de ordem executiva e fazer com que o Congresso ou a Suprema Corte respondam, como deveriam fazer em um sistema de freios e contrapesos — disse Bradford.
O Poder Executivo controla parcelas menores de financiamento discricionário, mas elas podem não ser suficientes para persuadir os distritos escolares a mudar suas práticas.
Ainda assim, há muitas questões legais sobre a capacidade do governo de restringir o financiamento federal para pressionar as escolas.
O principal fluxo de financiamento que apoia as escolas públicas, conhecido como "Title I", é enviado aos estados em uma fórmula definida pelo Congresso, e o presidente tem pouco poder para restringir seu fluxo.
— Parece que uma parte significativa da estratégia é estabelecer prioridades por meio de ordem executiva e fazer com que o Congresso ou a Suprema Corte respondam, como deveriam fazer em um sistema de freios e contrapesos — disse Bradford.
O Poder Executivo controla parcelas menores de financiamento discricionário, mas elas podem não ser suficientes para persuadir os distritos escolares a mudar suas práticas.
Um grande limite para a agenda de Trump é que, apesar das políticas oficiais federais, estaduais e distritais, os professores individuais têm uma influência significativa sobre o que é ensinado e como. Mesmo em regiões conservadoras de estados administrados por republicanos, os esforços para controlar o currículo às vezes fracassam.
Em Oklahoma, por exemplo, onde o superintendente do estado, Ryan Walters, é um aliado de Trump, alguns educadores conservadores têm resistido aos esforços para inserir a Bíblia no currículo.
Em nível nacional, pesquisas com professores mostram que a maioria não alterou seus materiais ou métodos de aula em resposta às leis conservadoras. Alguns educadores relataram que conseguem resistir sutilmente às tentativas de controlar como assuntos como o racismo são abordados, por exemplo, ensinando os alunos sobre o debate a favor e contra políticas curriculares restritivas.
A Flórida tem sido, em muitos aspectos, um caso excepcional, e um caso que serviu de modelo para o governo Trump. Por lá, o governador republicano Ron DeSantis criou incentivos poderosos para que os professores adotassem prioridades como enfatizar as crenças cristãs dos pais fundadores e restringir as discussões sobre gênero e racismo.
Os docentes poderiam ganhar um bônus de 3 mil dólares por fazer um curso de treinamento sobre os novos padrões de aprendizagem cívica. Se seus alunos tivessem um desempenho ruim em um teste padronizado da matéria, suas próprias classificações de avaliação seriam prejudicadas.
Em relação à raça e ao gênero, as restrições de DeSantis eram amplas e vagamente escritas. As escolas acusadas de violar as leis poderiam ser processadas por danos financeiros, e os professores eram ameaçados de perder suas licenças profissionais.
Isso levou muitas escolas e educadores a interpretar as leis de forma ampla. Às vezes, eles as interpretavam de forma mais ampla do que pretendiam, segundo o governo local. A proibição de livros com conteúdo sexual levou um distrito a anunciar que “Romeu e Julieta” seria retirado do currículo.
A proibição do reconhecimento de identidades transgênero levou as escolas a enviarem aos pais autorizações para o uso de apelidos, o que era necessário mesmo que um aluno chamado William quisesse ser chamado de Will.
Os educadores de escolas públicas geralmente têm medo de ter problemas com autoridades de nível superior. É possível, e até provável, que as ordens executivas de Trump levem a alguma medida de autocensura.
Adam Laats, historiador da educação da Universidade de Binghamton, disse que um possível antecedente histórico para o decreto de Trump foi o Red Scare em meados do século XX, durante o qual muitos professores acusados de simpatia pelo comunismo perderam seus empregos ou foram levados aos tribunais.
— Na minha opinião, essa ordem executiva é uma explosão de vapor. Perigosa, especialmente porque pode incentivar o ativismo agressivo local — disse ele, e acrescentou: — As tentativas políticas de banir ideias da sala de aula raramente foram bem-sucedidas.
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