Chilenos ignoram políticos e escolhem civis para escrever Constituição
Constituição chilena será escrita por um grupo de civis eleitos no ano que vem, com 50% homens e 50% mulheres
Carolina Riveira
Publicado em 26 de outubro de 2020 às 08h17.
Última atualização em 26 de outubro de 2020 às 09h49.
Além da escolha por ter uma nova Constituição para o país, os chilenos que foram às urnas neste domingo tomaram uma outra decisão: que os próprios cidadãos ajudem a escrevê-la.
No referendo sobre ter ou não uma nova Carta, uma das perguntas era o formato da Assembleia Constituinte que será formada a partir do ano que vem.
Venceu a opção de ter um grupo de legisladores popular: exclusivamente formado por membros da sociedade civil. A regra é que haja também uma igualdade de gênero, com 50% homens e 50% mulheres. Será um marco na elaboração de constituições pelo mundo, historicamente escritas com maioria masculina.
A outra opção no referendo era que a Constituição fosse escrita de forma mista, com grupo formado parte por parlamentares já eleitos e a outra parte por novos eleitos da sociedade civil.
Os membros totalizarão uma Assembleia de 155 pessoas, e serão escolhidos em nova eleição em 11 de abril do ano que vem. Depois, terão um ano para escrever um rascunho da Constituição.
No Brasil, a última Constituinte aconteceu em 1987, durando 20 meses e levando à Constituição de 1988. A Constituinte não foi exclusiva, isto é, parlamentares já eleitos trabalharam no texto exercendo simultaneamente suas funções como congressistas. Dos 590 parlamentares, só 26 eram mulheres, todas deputadas e nenhuma senadora.
Aprovação no Chile
A decisão de mudar a Constituição chilena foi majoritária. Com mais de 99% das urnas apuradas na madrugada desta segunda-feira, 26, foram favoráveis ao "Aprovo" 78,28% dos eleitores.
A Carta chilena vinha desde os tempos da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), que matou mais de 40.000 pessoas no Chile.
O texto já foi reformado algumas vezes desde o fim da ditadura, a partir da década de 90, mas protestos em massa sobre as injustiças sociais do país no ano passado levaram a novas críticas sobre pontos da Constituição.
Parte crescente dos chilenos passou a questionar o estado social fraco das leis do país, como o alto custo do transporte, da saúde e da educação e o sistema previdenciário, que funciona em um modelo de capitalização desde a ditadura de Pinochet.
Os dilemas foram intensificados pela pandemia da covid-19, que pressionou o sistema de saúde e o modelo social chileno.
Com os resultados do referendo, festas e comemorações explodiram nas ruas do Chile na madrugada desta segunda-feira.
No Twitter, o presidente de centro-direita Sebastian Piñera escreveu que "nossa democracia se fortaleceu graças à participação cidadã. Hoje nosso dever é seguir construindo um país melhor", disse.
Os níveis de popularidade do presidente caíram em meio aos protestos, e Piñera entrou em frequentes embates com os manifestantes em suas declarações no ano passado.Piñera está no poder no Chile desde 2017, e o país terá também novas eleições presidenciais em 2021.