Boko Haram se torna espelho africano do Estado Islâmico
O grupo extremista endureceu cruzada de terror pelo norte da Nigéria para declarar um califado, um novo rumo que segue o caminho do Estado Islâmico
Da Redação
Publicado em 25 de setembro de 2014 às 13h46.
Lagos/Nairóbi - Nos últimos meses, o grupo extremista Boko Haram endureceu sua cruzada de terror pelo norte da Nigéria com centenas de assassinatos e ocupação de territórios para declarar um califado islâmico, um novo rumo que segue o caminho do grupo jihadista Estado Islâmico (EI).
Ao mesmo tempo em que o EI buscava mais visibilidade, se tornando uma das ameaças internacionais mais temíveis pela brutalidade de suas ações, com as quais tomou o controle de um amplo território no Iraque e na Síria, Boko Haram lançava uma nova campanha semelhante.
"A decisão do Boko Haram de se apoderar de territórios e declarar um califado é a indicação mais clara até agora que o grupo se vinculou, seja física ou ideologicamente, com os jihadistas do EI", explicou à Agência Efe o analista político nigeriano Olu Ajayi.
Embora o Boko Haram sempre tenha se caracterizado pela exagerada violência de ataques indiscriminados contra a população, a milícia agora atua com um objetivo claro: tomar povoados e cidades para içar sua bandeira e declarar um califado islâmico nos territórios capturados.
Até o momento, mais de 15 localidades no norte da Nigéria estão sob o controle dos terroristas, que já assassinaram centenas de pessoas, a maioria cristã. Isso representa o primeiro passo do grupo rumo à meta de implantar o estado islâmico no país.
"Não é difícil identificar o vínculo entre Boko Haram e EI: dois grupos sunitas que pretendem proclamar um califado islâmico, que estão tomando à força novos territórios e que realizam brutais assassinatos sem sentido", acrescentou Ajayi.
O analista também lembrou a vinculação de Boko Haram com a Al Qaeda no Magreb Islâmico (AQMI), ao citar que a Al Qaeda "é o grande precursor do EI".
Os últimos seis meses foram o período mais sangrento na história de Boko Haram, que em línguas locais significa "a educação não islâmica é pecado" e luta por impor a lei islâmica na Nigéria, país de maioria muçulmana no norte e predominantemente cristã no sul.
Os números confirmam: neste ano, o grupo assassinou cerca de três mil pessoas e mais de 12 mil desde 2009, segundo os cálculos do governo nigeriano.
Entre os ataques recentes, o que mais comoveu o país e o resto do planeta foi o sequestro de mais de 200 meninas em uma escola de Chibok, no estado de Borno, no dia 14 de abril.
As crianças foram capturadas com a iminente ameaça de serem vendidas como escravas. A comunidade internacional se mobilizou militar e socialmente para colaborar com a busca, mas com a exceção de algumas que conseguiram escapar pouco após o sequestro, nada se sabe sobre elas.
Na opinião do diretor-executivo da Associação Cristã da Nigéria, o pastor Akande, a violência praticada pelo Boko Haram aumentou devido à aproximação com o EI.
"Boko Haram já é muito brutal, mas a conexão e a comunicação com o EI vai gerar mais brutalidade", afirmou Akande, que reivindica maior envolvimento dos exércitos internacionais na sua luta contra o grupo radical.
"Boko Haram, Al Shabab e EI são farinha do mesmo saco", disse Ishaq Akintola, diretor de Assuntos sobre Direitos Muçulmanos da Nigéria (Muric, sigla em inglês).
Apesar da aparente relação entre Boko Haram e Estado Islâmico, fontes do exército nigeriano, que pediram anonimato, garantiram à Efe que não se preocupam com a semelhança dos ataques.
"A captura de territórios e a declaração de um califado são apenas ferramentas de propaganda dos terroristas, que se deram conta de que precisam aproveitar o embalo das ações do EI", explicaram.
Desde que a milícia radical foi fundada em 2002 pelo clérigo muçulmano Mohammed Yousef, sua atividade terrorista se caracterizou por constantes mudanças de rumo.
No início, a seita manteve uma relação íntima com o governo do estado de Borno, reduto espiritual e base de operações que proporcionou apoio financeiro e imunidade ao grupo.
À medida que o grupo ficou mais forte, se tornou um ímã para milhares de jovens - a maioria analfabetos e desempregados - e se estendeu pelos estados vizinhos de Yobe, Bauchi e Adamawa.
A relação com Borno começou a enfraquecer após as eleições de 2007, devido a um desacordo sobre os pagamentos mensais que o grupo islamita recebia. O governo da Nigéria iniciou então uma campanha para acabar com a seita, que culminou com o assassinato de seu fundador, Mohammed Yousef, em 2009.
Naquele momento, as autoridades garantiram que era o fim de Boko Haram, mas os islamitas se reagruparam sob o comando de um novo líder, Abubakar Shekau, que já foi dado como morto pelo exército em três ocasiões.
Sob a liderança de Shekau, a seita conseguiu notoriedade internacional devido à crueldade de ações que o exército se mostra incapaz de conter.