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Avanços ambientais e sociais poderão vir durante o governo Trump, diz CEO da Global Citizen

Hugh Evans lembra que republicano já apoiou iniciativa para plantar 1 trilhão de árvores e que presidentes do mesmo partido já apoiaram campanhas contra a AIDS

Hugh Evans, CEO da Global Citizen, durante evento no Rio de Janeiro em 17 de novembro (Buda Mendes/Divulgação)
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 18 de novembro de 2024 às 06h01.

Rio de Janeiro - O segundo governo deDonald Trump nos Estados Unidos trará desafios, mas exemplos do passado apontam que poderá haver avanços ambientais nos próximos anos, diz Hugh Evans, CEO da Global Citizen, um dos maiores grupos ativistas do mundo.

Trump promete retirar os Estados Unidos do Acordo Climático de Paris, como já fez em seu primeiro mandato, retirar benefícios para energias renováveis e reforçar a exploração de petróleo, entre outras medidas.

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“Não é apenas a política progressista que tem sido um bastião da mudança social. Se você pensar em grandes iniciativas como o Pepfar, foi criado [em 2003] para combater a Aids em toda a África e impulsionado por George W. Bush. Ou se você considerar o estabelecimento da agência de proteção ambiental nos Estados Unidos, também criada pelos republicanos. É possível impulsionar o apoio bipartidário para grandes desafios sociais”, diz Evans, em entrevista à EXAME.

Evans conversou com a reportagem no domingo, 17, dia em que a Global Citizen realizou um evento paralelo ao G20, no Rio de Janeiro, para debater saídas para a pobreza e a crise climática, que reuniu autoridades como a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, o premiê canadense Justin Trudeau, e o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa, além de representantes da sociedade civil, como o DJ Alok. No evento, foi anunciada uma parceria entre a União Europeia e a África para expandir as energias renováveis no continente africano.

A Global Citizen tem 12 milhões de pessoas cadastradas no mundo e busca engajar a sociedade civil e governos para combater a pobreza e as mudanças climáticas. Na entrevista, Evans comentou movimentos recentes do Brasil, como a ampliação de metas ambientais, anunciadas na COP29, e o lançamento de uma aliança global contra a pobreza. Leia a seguir a íntegra da conversa.

Qual sua expectativa sobre o que poderá ser alcançado pelo G20 no Brasil?

No Global Citizen, estamos focados em enfrentar as mudanças climáticas, acabar com a pobreza extrema e entender que essas duas questões estão fundamentalmente interconectadas. O G20 deve lançar um ano realmente ambicioso de ações climáticas, desde esta semana até a COP30, em Belém, no ano que vem. O G20, neste momento, é como um precipicio muito importante, onde você tem múltiplas crises afetando o mundo de uma só vez. Você tem os resquícios da pandemia da COVID-19. Vimos flutuações econômicas ao redor do mundo. Há uma crise climática em andamento. Há conflitos como nunca antes, e neste ambiente competitivo onde há tantos desafios para o mundo encarar ao mesmo tempo, os líderes do G20 têm o desafio moral e de liderança de garantir que cada cidadão prospere, mas também que protejamos nosso planeta, para que haja um planeta onde prosperar. Esse é realmente o desafio do G20 este ano.

Como o Global Citizen atua para ajudar nisso?

Nosso objetivo é tentar ajudar as nações do G20 a ver que a Floresta Amazônica, a qual 50% de suas fronteiras estao aqui no Brasil, seja vista como um benefício público. Existem ecossistemas no mundo que devem ser tratados como um benefício público, como a camada de gelo da Groenlândia, o permafrost na Sibéria, a floresta temperada no Canadá e, claro, a Floresta Amazônica. Eles estão mantendo todo o planeta estável e temperado, e precisamos impulsionar ações para que o mundo perceba que cada um desses ecossistemas beneficie não apenas as nações que vivem dentro de suas fronteiras, mas que sejam considerados como investimentos no futuro de toda a humanidade.

Imagens da COP29, em Baku

Como vê a possibilidade de se chegar a consensos em um momento de tanta polarização, especialmente após a vitória de Donald Trump nos EUA?

É preciso lembrar que não é apenas a política progressista que tem sido um bastião da mudança social. Se você pensar em grandes iniciativas como o Pepfar, criado [em 2003] para combater a Aids em toda a África e impulsionado por um governo republicano, de George W. Bush. Ou se você considerar o estabelecimento da agência de proteção ambiental nos Estados Unidos, também criada pelos republicanos, então é possível impulsionar o apoio bipartidário para grandes desafios sociais. Esse é o desafio dos tempos modernos. Como você garante que sob a presidência de Trump nos próximos quatro anos, o mundo alcance um consenso sobre as questões mais urgentes? Precisamos acabar com os conflitos que estão ocorrendo ao redor do mundo. Há uma forte correlação entre pobreza e conflitos. Quanto mais os conflitos se perpetuam, mais pessoas serão empurradas para a pobreza. Esse é um desafio urgente. Precisamos garantir que o desafio das mudanças climáticas seja enfrentado de frente. No primeiro mandato, Trump defendeu uma iniciativa chamada 1 trilhão de árvores, que se concentrava em garantir que o mundo entendesse o poder das árvores na redução de carbono da atmosfera, e planejava apoiar o plantio de um trilhão delas ao redor do mundo. Não temos nenhuma alternativa política agora, em sistemas democráticos que muitas vezes podem ser muito complexos. Temos que impulsionar o consenso sobre os maiores desafios do mundo, olhar para exemplos históricos e encorajar os líderes que nos representam a serem realmente grandes em um momento em que são urgentemente necessários.

Como vê as ações do Brasil em ampliar metas ambientais e em defender uma aliança global contra a pobreza?

A contribuição nacionalmente determinada do Brasil, anunciada em Baku, é um exemplo de política que, embora mais ambiciosa do que a anterior, ainda carece de clareza em várias questões. Precisamos de maiores compromissos sobre desmatamento, progresso mais claro nas metas de emissões, eliminação gradual de combustíveis fósseis e, obviamente, engajamento da comunidade indígena. Há uma forte conexão entre o alívio da pobreza e as mudanças climáticas e, portanto, juntamente com os compromissos que o governo brasileiro fez em Baku, também precisamos garantir que a maneira como o desenvolvimento econômico é promovido seja sustentável.

Como fazer isso?

Por muito tempo, as nações mais ricas do mundo se industrializaram usando combustíveis fósseis sujos. Essa foi basicamente a história do desenvolvimento econômico moderno, e dado que agora o Ocidente está encorajando algumas nações a serem os pulmões do planeta, e não há maior exemplo disso do que o Brasil. Então, outras nações deveriam, sob o Acordo de Paris, contribuir com 100 bilhões de dólares anualmente em financiamento climático para garantir que esses benefícios públicos sejam protegidos e restaurados. É fundamental que o mundo veja a proteção da Amazônia e o desenvolvimento econômico sustentável das pessoas aqui no Brasil e qualquer nação que toque a Amazônia como um interesse do mundo, não apenas do Brasil.

Poderia detalhar mais sobre a parceria entre a Europa na África para desenvolver novos modelos de energia na África?

Hoje [domingo], lançamos uma campanha com a presidente Ursula von der Leyen, da Comissão Europeia, e o Presidente Cyril Ramaphosa, da África do Sul,, chamada Scale up Renewables in Africa (escalar os renováveis na África). Ela inclui vários marcos e culminará em uma conferência de compromissos financeiros daqui a um ano. Nosso objetivo é garantir compromissos de governos e do setor privado e também de bancos multilaterais de desenvolvimento, para de triplicar a capacidade de energia renovável em toda a África até 2030 e abordar as necessidades energéticas não atendidas. Há 675 milhões de pessoas que ainda não têm acesso à eletricidade, e 600 milhões delas estão na África.

E como isso será feito?

Nossa meta para os próximos 12 meses é convocar a comunidade internacional a aumentar os investimentos em energia renovável, especialmente em regiões com alto potencial solar, como a África. Nossa meta é atingir a meta da COP 28 de triplicar a capacidade de energia renovável até 2030. A campanha culminará na África do Sul na reunião do G20 do ano que vem em Joanesburgo, onde a Global Citizen convocará um evento Global Citizen Now, e vamos convocar governos, setor privado, bancos multilaterais de desenvolvimento e fundações, para todos trabalharem juntos em direção a essa meta.

Qual o tamanho do desafio na África?

A África precisaria, no mínimo, mais do que triplicar a capacidade de energia renovável. O continente atualmente atrai apenas 3% do investimento global em energia. Isso é cerca de US$ 100 bilhões, apesar de representar 18% da população mundial. Haverá um crescimento demográfico na África, dado que ela tem a população mais jovem e, no futuro, terá cerca de um quarto a um terço da população ativa do mundo, mas a capacidade de energia renovável da África é de apenas 7,6% do consumo total de energia do continente. No entanto, o continente é responsável por 60% das melhores áreas de recursos solares do mundo. Isso sem contar a energia eólica, hidrelétrica e geotérmica. Então, novas energias renováveis ​​precisam se tornar uma das principais fontes de energia para atender às crescentes necessidades de energia na África. Essa população em expansão pode se tornar um passivo, ou um ativo se empregos forem criados.Estamos pedindo investimento urgente em energia renovável, porque, em última análise, ela é um criador de empregos em todo o continente.

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