Minhas Finanças

O que fazer com o seu dinheiro extra de fim de ano

Analistas dão dicas de como quitar dívidas, formar uma reserva de emergência ou investir

IR 2018: Mais de 3 bilhões de reais serão pagos neste lote (Uelder-ferreira/Thinkstock)

IR 2018: Mais de 3 bilhões de reais serão pagos neste lote (Uelder-ferreira/Thinkstock)

Júlia Lewgoy

Júlia Lewgoy

Publicado em 6 de novembro de 2017 às 18h21.

Última atualização em 7 de novembro de 2017 às 15h58.

Quem tem recursos extras para receber neste fim de ano, como 13º salário, gratificações, participação nos lucros e resultados (PLR) ou restituição de Imposto de Renda, pode aproveitar o momento para acertar dívidas, realizar planos de consumo e/ou, com algum esforço e planejamento, fazer o que mais da metade dos brasileiros ainda não consegue: iniciar uma reserva financeira de segurança.

Pesquisa feita pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e quantificada pelo Datafolha mostra que 52% dos brasileiros não possuem reserva financeira para despesas inesperadas, apesar de a maioria (85%) ter consciência da necessidade de guardar dinheiro para uma emergência.

Também de olho no orçamento dos brasileiros, o Indicador de Propensão ao Consumo, apurado pelo SPC Brasil e Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) — realizado em setembro e projetando o orçamento de outubro, sinaliza que seis em cada 10 consumidores (59,1%) pretende cortar gastos. Outros 32% esperam manter o mesmo nível de gastos e 4,9% aumentarão despesas.

Falando sobre a pesquisa, José Vignoli, educador financeiro do SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), lembra que os efeitos da crise se destacam entre as justificativas para os que irão diminuir o consumo: 22,6% mencionam como fator que os motiva os altos preços ,17,5% o desemprego e 8,2% a redução da renda. Outros 11% citam o endividamento e a situação financeira difícil. Mas apenas 8,9% mencionam a intenção de fazer reserva financeira — apesar de 22,2% citarem que “estão sempre tentando economizar”.

Ainda de acordo com o levantamento, grande parte dos consumidores (42,8%), refletindo sobre a situação de suas finanças em setembro, disse estar no ‘zero a zero’, isto é, sem sobra nem falta de recursos. Já 36% dos consultados disseram estar ‘no vermelho’, isto é, sem conseguir pagar todas as contas. E 14,9% afirmaram estar ‘no azul’ (com sobras de recursos), sendo que desses, 3,6% devem gastar as sobras (ir para o consumo) e uma fatia de 11,3% pretende poupar.

A pesquisa abrangeu 12 capitais das cinco regiões brasileiras. A amostra, de 800 casos, foi composta por pessoas com idade superior ou igual a 18 anos, de ambos os sexos e de todas as classes sociais. A margem de erro é de 3,5 pontos percentuais.

Os números, de acordo Vignoli, mostram o impacto da crise nos orçamentos pessoais e familiares, mas, em muitos casos, também a negligência das pessoas com as próprias finanças. Isso, segundo ele, acaba tendo reflexos sobre o consumo, seja pela decisão do próprio consumidor de adiá-lo ou pela restrição de crédito.

“Temos hoje perto de 59 milhões de consumidores inadimplentes. A situação dificil reflete a crise econômica. Mas, em grande parte, também questões comportamentais”, analisa Vignoli. A percepção do educador é que “independentemente de classes sociais, muitos criam padrões de consumo incompatíveis com sua situação financeira, além de ter dificuldades para lidar racionalmente com dinheiro, fazer reservas ou se planejar.”

Segundo Vignoli, para os que têm alguma entrada de recursos extras neste fim de ano, o momento é bastante oportuno para dar início a uma mudança de hábitos, buscando montar reserva financeira ou retomar uma poupança já iniciada.

“Apesar de vermos um começo de recuperação da economia, a situação continua exigindo muita cautela, e ainda teremos pela frente um ano eleitoral”, alerta. Lembra também que apesar de os juros básicos (Selic) estarem em baixa, essa queda ainda não se reflete com a mesma intensidade na ponta das taxas de empréstimos ou de consumo, exigindo cuidados na tomada de crédito e compras a prazo.

Diante desse cenário, para os que já estão sonhando com presentes e as festas de Natal e Ano Novo, Vignoli destaca que planejamento e educação financeira não significam “não comprar nada”, mas comprar de forma racional, da maneira certa e na hora certa. “O ideal, por enquanto, seria segurar os gastos de consumo, priorizar o acerto de contas e dívidas, começando pelas mais caras, com juros maiores”, orienta.

Quitação, troca de linhas de crédito e antecipação de parcelas

Para os que estão ‘no vermelho’ e tomaram empréstimos bancários, a principal dica do professor de economia da Saint Paul Escola de Negócios Alan Ghani também é usar os recursos extras para quitar o máximo possível de dívidas,”pois mesmo aquelas com juros menores têm taxas muito superiores às que são pagas pelos bancos na remuneração das aplicações financeiras”.

Além de valer a pena, de acordo com os especialistas, trocar o perfil das dívidas, passando de linhas mais caras (cartão de crédito, cheque especial) para mais baratas (consignado, crédito pessoal), outra possibilidade é antecipar o pagamento de parcelas de empréstimos, usando recursos extras recebidos, pois os bancos deverão fazer a redução proporcional dos juros embutidos.

Feito isso, diz Vignoli, e ainda havendo condições, parte dos recursos poderia ir para consumo e outra, mesmo que pequena, para investimento. Mas o mais importante, no entendimento do educador financeiro, é a mudança de atitude, com adoção de um orçamento planejado, que inclua o indíviduo e toda a família. “Uma das principais armadilhas ao montar um orçamento é fazer isso de maneira que não se adapte à forma de viver das pessoas”, completa.

Na visão de Ricardo Gomes, planejador financeiro certificado pela Associação Brasileira de Planejadores Financeiros (Planejar), usar de forma inteligente os recursos que entram, sejam os normais ou eventuais extras de fim de ano, não implica necessariamente em sacrifícios ou deixar de consumir. “Dinheiro é para ser gasto”, destaca. Mas acrescenta que o importante, e que muitos não percebem, “é a decisão de em que momento gastar, tentando fazer isso da maneira mais equilibrada possível.”

Para facilitar o entendimento dessa ideia, ele diz que as pessoas podem dividir esse momento em três tempos: passado, presente e futuro. Exemplifica como ‘passado’ as dívidas (gastos fora dos limites do orçamento, que geraram pendências com bancos, amigos, familiares). No ‘presente’, poderiam estar lembranças e presentes de Natal, viagens ou festas de fim de ano, e no ‘futuro’, investimentos para demandas mais adiante como aposentadoria, troca de casa ou de automóvel, entre outras.

Separando esses diferentes tempos em escaninhos, explica Gomes, a pessoa ou a família conseguem enxergar melhor sua situação, podendo optar por aplicar todo o ganho extra, por exemplo, em um único momento, ou dividir os recursos, destinando um pouco para cada um dos tempos.

Os que tiverem dívidas, diz Gomes, não precisarão, necessariamente, gastar todo o recurso com o ‘passado’. Se a dívida estiver controlada, com juros baixos (por exemplo um financiamento imobiliário), com prestações cabendo confortavelmente no orçamento — e se a pessoa não possuir nenhuma reserva financeira, poderá ser mais interessante guardar (aplicar) uma parte do ganho extra. “Com isso, ela terá mais possibilidade de fazer frente a possíveis emergências, sem ter de recorrer a empréstimos, do que se optar por ‘quitar’ todo o passado”, destaca.

Outro exemplo seria o de uma pessoa que esteja “no azul”, portanto sem dívidas, e que já guarda uma quantia mensalmente. Considerando que já tenha formado uma reserva razoável (lembrando sempre que cada caso é um caso), em tese, ao receber um ‘extra’, poderia tranquilamente poupar uma parte (futuro) e gastar outra (presente) em consumo, em coisas que considere importantes para sua qualidade de vida.

Já um cenário em que a pessoa ou família não tenha dívidas nem reservas (esteja no ‘zero a zero’, como 43% dos consultados na pesquisa SPC/CNDL), segundo Gomes, pode ser bastante interessante para começar reserva pensando no momento ou no ‘futuro’. “Existem inumeráveis cenários, em que as pessoas terão de ponderar e buscar equilíbrio. Mas sabemos que o ser humano nem sempre toma decisões racionais.”

Recursos extras facilitam início de poupança

O analista de research e alocação da Guide Life Hugo Paixão acredita que, para quem ainda não têm reservas formadas, o recebimento de rendas extras no fim de ano é um estímulo e um facilitador para começar. “Mas poupar pelo simples ato de poupar não é o indicado; o mais recomendado é a pessoa buscar, desde o início, algum sentido, uma função para aquela quantia que estará sendo guardada”, alerta.

O analista lembra que, no caso da reserva de segurança, o objetivo é a pessoa/família estar mais preparada financeiramente. Seja para enfrentar desde grandes problemas — como uma possível perda de renda, advinda de desemprego, problemas de saúde na família — até problemas menores, como uma falha mecânica do carro, manutenção emergencial da casa e outros, que podem levar a despender uma quantia considerável de recursos quando menos se espera.

Mas nem sempre existe a consciência de que, sem tal reserva, a pessoa ou família poderá ser levada a vender algum bem que não desejava. Ou se desfazer deste mesmo bem a um preço abaixo daquele considerado justo ou até mesmo recorrer a um financiamento, que, dependendo das condições de crédito, pode sair bem mais caro do que o esperado.

Também lembrando que ‘cada caso é um caso’, Paixão explica que um valor considerado razoável como meta seria o equivalente a seis meses de renda mensal ou a seis meses de despesas da pessoa/família, mas nada impede que se fixe um valor intermediário.

Com planejamento adequado, afirma, se poderá encontrar a melhor solução para destinar os recursos a finalidades emergenciais, respeitando os três principais atributos necessários de uma reserva de emergência: utilidade, rentabilidade e liquidez.

Quatro passos para montar reserva de segurança ideal

O analista da Guide Life preparou quatro passos para montagem da reserva de segurança que considera ideal. Confira:

Passo 1: Registre seu fluxo de caixa de forma a gerenciar seu orçamento. Faça um controle bem apurado (no mínimo três meses, de todas suas despesas pessoais e/ou familiares). Repita o mesmo processo com suas receitas liquidas (já descontados Imposto de Renda, deduções, contribuições etc.). Para isso, se pode buscar ajuda de um planejador financeiro, mas também de planilhas, sites e aplicativos;

Passo 2: Separe aquilo que considera importante daquilo que considera irrelevante. Aqui reside a essência do atributo utilidade. Para que uma reserva seja útil no momento em que se faz necessária, ela obrigatoriamente deve cobrir aquelas despesas consideradas importantes; após o gerenciamento do seu orçamento, você terá uma nova visão da sua situação financeira familiar.

Faça uma análise profunda, identificando os itens mais importantes do orçamento que não poderão ser cortados em situações de emergência e, simultaneamente, elimine aqueles itens que considera irrelevantes em uma situação emergencial mais crítica. Isso será fundamental para ter um ponto de partida ao dimensionar sua reserva financeira, necessária para as despesas básicas em um evento de ausência de rendas estáveis e, portanto, do quanto você deve destinar à formação dessa reserva;

Passo 3: Defina um valor a ser poupado periodicamente. Dimensionada sua necessidade de cobertura no passo anterior, você poderá ter noção de qual deve ser o tamanho de uma reserva de emergência considerada segura.

Caso o valor recebido como gratificação e outros no seu final de ano não seja o suficiente para compor uma reserva de emergência ideal, defina um valor fixo mensal a ser poupado ou um percentual da renda familiar para começar a aplicar naquele investimento financeiro que classificar como adequado para sua reserva de emergência.

Ainda que o valor poupado mensalmente seja pequeno, é importante realizar este passo para que o hábito de investimento seja estabelecido;

Passo 4: Escolha investimentos aderentes ao seu perfil de risco e que possuam uma rentabilidade atrativa.

Rentabilidade não precisa ser o quesito principal. Mas é um dos atributos importantes para uma reserva de emergência ideal, afinal, se é um recurso que vai ficar parado, ainda mais

um dinheiro que não se sabe ao certo se será utilizado ou não, que ao menos fique parado gerando uma rentabilidade atrativa, e com baixíssimo risco.

Como escolher os investimentos

De acordo com Paixão, para decidir qual será o destino do dinheiro a ser poupado é muito importante levar em consideração o perfil da pessoa como investidora (conservador, moderado ou agressivo), bem como o valor de aplicação mínima aceito pelo ativo escolhido, e também a experiência da pessoa com investimentos.

“Uma das armadilhas nesse momento é aplicar sem ter informações, ou por indicação de amigos e conhecidos que pouco conhecem do mercado. Antes de optar por qualquer investimento, deve-se buscar o máximo de informações e, se possível, orientação profissional, agindo com racionalidade e não por impulso”, orienta Paixão.

“Deve-se também observar as questões tributárias (impostos e incentivos) e custos administrativos de cada produto, que precisam ser compreendidos”, diz o analista. “Percebemos que maioria dos investidores tem perfil conservador, e a reserva de emergência, além disso, precisa de baixo risco e principalmente liquidez, dando à pessoa a possibilidade de sacar os recursos no momento de necessidade”, completa.

Algumas opções que combinam rentabilidade, segurança e liquidez, segundo Paixão, são títulos públicos como Tesouro Selic, títulos privados como CDBs, LCA/LCI com liquidez diária.

Ele menciona alguns exemplos de aplicações (em bancos) para uma pessoa que tenha recebido recursos extras, por exemplo, de R$ 15 mil neste fim de ano, e decida aplicar 80% desse valor (R$ 12 mil) para inciar uma reserva de segurança.

Tipo: Tesouro Selic

Data da aplicação – 25/10/2017

Período: 18 meses

Valor aplicado: R$ 12 mil

Valor líquido a resgatar: R$ 13.189,00

*(Ref: Selic a 8,25% ao ano)

Tipo: Caderneta de poupança

Data da aplicação: 25/10/2017

Período: 18 meses

Valor aplicado: R$ 12 mil

Valor líquido a resgatar: R$ 13.054,35

*(Ref: 70% da Selic de 8,25% ao ano + TR)

—-

Tipo: LCI/LCA

Data da aplicação: 25/10/2017

Período: 18 meses

Valor aplicado: R$ 12 mil

Valor líquido a resgatar: R$ 13. 181,00

*(Ref: 80% do CDI)

Tipo: CDB

Data da aplicação: 25/10/2017

Período: 18 meses

Valor aplicado: R$ 12 mil

Valor líquido a resgatar: R$ 13.181,54,

*(Ref: 90% do CDI)

Este conteúdo foi originalmente publicado na Arena do Pavini

 

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