O que ensinar aos jovens sobre dinheiro
Especialista dá oito dicas sobre como agir em relação à mesada, cartões de crédito e gastos individuais e familiares
Da Redação
Publicado em 29 de julho de 2011 às 07h36.
São Paulo – Além das mudanças físicas e comportamentais, passar pela adolescência significa aprender a lidar com dinheiro como gente grande. No meio do caminho, decisões como poupar a mesada, dispensá-la no momento do primeiro estágio, consumir a partir das próprias economias e usar o cartão de crédito dão pistas de como o jovem vai se virar sozinho dali a alguns anos.
Eloisa Vasconcellos, agente autônoma de investimento e responsável pela área educacional da corretora Magliano, percebeu que a demanda por ensinamentos voltados especificamente para os adolescentes era grande nas aulas de educação financeira que organizava para mulheres.
"Muitas já atuavam como economistas de plantão dentro de casa: o controle da ansiedade, a escolha da hora certa para a melhor compra e a alocação do capital de forma diversificada e flexível elas já usavam, sem saber, no orçamento doméstico", afirma a especialista. Mas chegado o momento da adolescência, o exemplo familiar não parecia ser o suficiente para livrar os filhos do consumismo desenfreado.
Segundo ela, os jovens naturalmente passam a absorver mais estímulos dos amigos e dos meios de comunicação à medida que ficam mais velhos. Portanto, devem estar conscientes sobre a impossibilidade (e tantas vezes falta de necessidade) de comprar tudo que lhes vem à cabeça.
Com o objetivo de passar os ensinamentos para frente, Eloisa passou a montar cursos de educação financeira voltados para adolescentes em Piracicaba, interior de São Paulo. Veja a seguir as dicas da especialista sobre como os pais devem introduzir conceitos de poupança e consumo em diferentes fases da adolescência:
A importância do não
Muitas vezes vemos uma criança fazendo escândalo na porta de uma loja e os parentes cedendo por vergonha. Este é o começo do fim porque o comportamento vai repercutir lá na frente, na adolescência e juventude. Na vida moderna muitos pais presenteiam para compensar a ausência. Mas desta forma a criança não aprende quando ela pode e não pode, ou quando uma coisa é cara ou barata. E esse questionamento, quando interiorizado, é uma coisa que fica no inconsciente pelo resto da vida. Por isso, saiba dizer não.
A lição vem de casa
O ensino de finanças não é obrigatório nas escolas, então você acaba aprendendo na vida. Mas é importante quebrar esse ciclo e repassar o conhecimento para os filhos. Vejo muitos profissionais adultos lamentando não terem recebido lições para se organizarem financeiramente desde muito cedo. E os ensinamentos são simples.
O tabu de se falar sobre sexo vem sendo quebrado há mais de 50 anos, mas as famílias ainda relutam em falar de dinheiro. As contas de casa devem estar em planilhas abertas, com pais e filhos por dentro de tudo. Ao invés de ser visto como um elemento facilitador da vida, o dinheiro acaba sendo enxergado apenas como uma ferramenta de poder e isso é errado.
Primeiro passo
Estabelecer uma verba mensal para gastos extras, como roupas, sapatos, lanches, ida ao cinema e outros passeios é uma boa saída. Minha dica é que o próprio adolescente tome a iniciativa de anotar durante dois meses o que gasta. Em seguida, ele deve apresentar esse levantamento para os pais e pedir a liberdade de administrar esse dinheiro sozinho. É com esses recursos que ele terá a chance de economizar nos supérfluos com o objetivo de poupar por um plano mais audacioso: uma bicicleta, uma viagem, um carro lá na frente.
Toda economia precisa de um objetivo, senão lá pelo terceiro mês você deixa de poupar. Para o adolescente é a mesma coisa. Incentive um sonho, a compra de algo que fará a diferença. Se o plano é economizar para uma excursão no exterior, por exemplo, o filho pode poupar para gastar quando estiver no outro país enquanto o pai fica responsável pelo passeio em si, com passagens e acomodação.
Alternativa à mesada
Se a família não tem condições de pagar uma mesada ao jovem, uma alternativa é delegar a tarefa de supervisionar os gastos da casa a ele. Nesse caso, o filho fica responsável por cuidar e comparar mensalmente as contas de supermercado, de luz, de gás. O que conseguir ser economizado a partir de um parâmetro inicial, isto é, da soma paga no mês anterior à implantação deste sistema, ficará para o adolescente, que será uma espécie de xerife das finanças domésticas.
Gastos diários e escolhas duradouras
A partir destes recursos, o adolescente deve montar uma lista de prioridades e necessidades. O segredo para poupar é anotar todos os gastos efetuados ao longo do dia. Pode ser no celular, no computador, em um bloquinho de papel. Essa é a única forma de fazer um levantamento diário das despesas e identificar onde dá para fazer cortes.
É essencial que o jovem tenha aprendido que enquanto estava crescendo, com o pé mudando de tamanho de um ano para outro, não valia a pena trocar de sapatos com tanta frequência. Entrar na vida adulta é também fazer escolhas mais duradouras. Para que gastar todo o dinheiro da mesada em games se você sabe que no ano seguinte terá vontade de comprar todos os jogos que forem lançados?
Trabalho
É importante que o adolescente saiba em que ele é bom: computação, inglês ou música, por exemplo. A partir daí ele pode dar aulas particulares e incrementar seu orçamento. Qualquer ganho adicional a partir de 15 anos é uma vitória, seja em um estágio, como professor particular ou como monitor de recreação. Os pais devem ter a sensibilidade para perceber esse talento e incentivá-lo, independente do filho já gozar de uma situação financeiramente confortável ou não. Desta jogada entre pais e filhos é que resulta o empreendedorismo e a responsabilidade em administrar o dinheiro ganho por contra própria.
Cartão de crédito e débito
Com 11 anos o adolescente já tem condições de lidar com um cartão adicional da conta dos pais, que deve ser introduzido em situações de pequenos gastos, como a compra de um lanche ou ingresso de cinema. Ao invés de esperar o troco, lidando com cédulas, o adolescente anota e guarda as notinhas para mostrar mais tarde para os pais, que também poderão manter o controle eletrônico através do extrato bancário.
O limite para gastos será gradualmente modificado com a mudança nas necessidades do adolescente, acordadas em conjunto com a família. É interessante e importantíssimo que o cartão seja utilizado, porque a realidade é que ele fará parte da vida adulta de qualquer pessoa. Normalmente quem gasta além do que pode no cheque especial ou cartão é o indivíduo que não foi educado para lidar com estes instrumentos como faria com o dinheiro físico, e sim como uma extensão do crédito.
Pé no freio na gastança
As famílias enfrentam problemas porque de uma hora para outra os filhos viram escravos do consumo. Entre 12 e 13 anos, você nota que os adolescentes já têm muita vontade de ter. Mas até aí eles ainda respeitam os limites colocados pelos pais. A partir de 14 anos eles se sentem mais libertos. Mas vivemos em um país com juros altos e as pessoas estão aprendendo a consumir coisas a que não tinham acesso em um passado recente. Por isso, é preciso frisar a importância do planejamento financeiro. E a noção de muitas vezes é preciso desistir de algo para ter condições de desfrutar de uma situação melhor para todos.
Hoje em dia os pais dão muito e os filhos muitas vezes não retribuem na mesma medida. Estamos em um momento de estudar essa transformação. Se o orçamento apertar, acho válido abrir o jogo e expor para o filho que será preciso fazer uma parada técnica, tirá-lo da ginástica ou da natação para ajudar nas contas de casa. É bom incluí-lo nessas decisões. Quem passa por uma experiência assim potencialmente fará questão de ajudar nos gastos de casa quando começar a trabalhar, ou mesmo abrirá mão da mesada. Mas no Brasil, 90% das famílias consideram que um episódio como este é sinônimo de derrota. E muitas mantêm as aparências em nome de uma estrutura que pode ruir lá no futuro.
São Paulo – Além das mudanças físicas e comportamentais, passar pela adolescência significa aprender a lidar com dinheiro como gente grande. No meio do caminho, decisões como poupar a mesada, dispensá-la no momento do primeiro estágio, consumir a partir das próprias economias e usar o cartão de crédito dão pistas de como o jovem vai se virar sozinho dali a alguns anos.
Eloisa Vasconcellos, agente autônoma de investimento e responsável pela área educacional da corretora Magliano, percebeu que a demanda por ensinamentos voltados especificamente para os adolescentes era grande nas aulas de educação financeira que organizava para mulheres.
"Muitas já atuavam como economistas de plantão dentro de casa: o controle da ansiedade, a escolha da hora certa para a melhor compra e a alocação do capital de forma diversificada e flexível elas já usavam, sem saber, no orçamento doméstico", afirma a especialista. Mas chegado o momento da adolescência, o exemplo familiar não parecia ser o suficiente para livrar os filhos do consumismo desenfreado.
Segundo ela, os jovens naturalmente passam a absorver mais estímulos dos amigos e dos meios de comunicação à medida que ficam mais velhos. Portanto, devem estar conscientes sobre a impossibilidade (e tantas vezes falta de necessidade) de comprar tudo que lhes vem à cabeça.
Com o objetivo de passar os ensinamentos para frente, Eloisa passou a montar cursos de educação financeira voltados para adolescentes em Piracicaba, interior de São Paulo. Veja a seguir as dicas da especialista sobre como os pais devem introduzir conceitos de poupança e consumo em diferentes fases da adolescência:
A importância do não
Muitas vezes vemos uma criança fazendo escândalo na porta de uma loja e os parentes cedendo por vergonha. Este é o começo do fim porque o comportamento vai repercutir lá na frente, na adolescência e juventude. Na vida moderna muitos pais presenteiam para compensar a ausência. Mas desta forma a criança não aprende quando ela pode e não pode, ou quando uma coisa é cara ou barata. E esse questionamento, quando interiorizado, é uma coisa que fica no inconsciente pelo resto da vida. Por isso, saiba dizer não.
A lição vem de casa
O ensino de finanças não é obrigatório nas escolas, então você acaba aprendendo na vida. Mas é importante quebrar esse ciclo e repassar o conhecimento para os filhos. Vejo muitos profissionais adultos lamentando não terem recebido lições para se organizarem financeiramente desde muito cedo. E os ensinamentos são simples.
O tabu de se falar sobre sexo vem sendo quebrado há mais de 50 anos, mas as famílias ainda relutam em falar de dinheiro. As contas de casa devem estar em planilhas abertas, com pais e filhos por dentro de tudo. Ao invés de ser visto como um elemento facilitador da vida, o dinheiro acaba sendo enxergado apenas como uma ferramenta de poder e isso é errado.
Primeiro passo
Estabelecer uma verba mensal para gastos extras, como roupas, sapatos, lanches, ida ao cinema e outros passeios é uma boa saída. Minha dica é que o próprio adolescente tome a iniciativa de anotar durante dois meses o que gasta. Em seguida, ele deve apresentar esse levantamento para os pais e pedir a liberdade de administrar esse dinheiro sozinho. É com esses recursos que ele terá a chance de economizar nos supérfluos com o objetivo de poupar por um plano mais audacioso: uma bicicleta, uma viagem, um carro lá na frente.
Toda economia precisa de um objetivo, senão lá pelo terceiro mês você deixa de poupar. Para o adolescente é a mesma coisa. Incentive um sonho, a compra de algo que fará a diferença. Se o plano é economizar para uma excursão no exterior, por exemplo, o filho pode poupar para gastar quando estiver no outro país enquanto o pai fica responsável pelo passeio em si, com passagens e acomodação.
Alternativa à mesada
Se a família não tem condições de pagar uma mesada ao jovem, uma alternativa é delegar a tarefa de supervisionar os gastos da casa a ele. Nesse caso, o filho fica responsável por cuidar e comparar mensalmente as contas de supermercado, de luz, de gás. O que conseguir ser economizado a partir de um parâmetro inicial, isto é, da soma paga no mês anterior à implantação deste sistema, ficará para o adolescente, que será uma espécie de xerife das finanças domésticas.
Gastos diários e escolhas duradouras
A partir destes recursos, o adolescente deve montar uma lista de prioridades e necessidades. O segredo para poupar é anotar todos os gastos efetuados ao longo do dia. Pode ser no celular, no computador, em um bloquinho de papel. Essa é a única forma de fazer um levantamento diário das despesas e identificar onde dá para fazer cortes.
É essencial que o jovem tenha aprendido que enquanto estava crescendo, com o pé mudando de tamanho de um ano para outro, não valia a pena trocar de sapatos com tanta frequência. Entrar na vida adulta é também fazer escolhas mais duradouras. Para que gastar todo o dinheiro da mesada em games se você sabe que no ano seguinte terá vontade de comprar todos os jogos que forem lançados?
Trabalho
É importante que o adolescente saiba em que ele é bom: computação, inglês ou música, por exemplo. A partir daí ele pode dar aulas particulares e incrementar seu orçamento. Qualquer ganho adicional a partir de 15 anos é uma vitória, seja em um estágio, como professor particular ou como monitor de recreação. Os pais devem ter a sensibilidade para perceber esse talento e incentivá-lo, independente do filho já gozar de uma situação financeiramente confortável ou não. Desta jogada entre pais e filhos é que resulta o empreendedorismo e a responsabilidade em administrar o dinheiro ganho por contra própria.
Cartão de crédito e débito
Com 11 anos o adolescente já tem condições de lidar com um cartão adicional da conta dos pais, que deve ser introduzido em situações de pequenos gastos, como a compra de um lanche ou ingresso de cinema. Ao invés de esperar o troco, lidando com cédulas, o adolescente anota e guarda as notinhas para mostrar mais tarde para os pais, que também poderão manter o controle eletrônico através do extrato bancário.
O limite para gastos será gradualmente modificado com a mudança nas necessidades do adolescente, acordadas em conjunto com a família. É interessante e importantíssimo que o cartão seja utilizado, porque a realidade é que ele fará parte da vida adulta de qualquer pessoa. Normalmente quem gasta além do que pode no cheque especial ou cartão é o indivíduo que não foi educado para lidar com estes instrumentos como faria com o dinheiro físico, e sim como uma extensão do crédito.
Pé no freio na gastança
As famílias enfrentam problemas porque de uma hora para outra os filhos viram escravos do consumo. Entre 12 e 13 anos, você nota que os adolescentes já têm muita vontade de ter. Mas até aí eles ainda respeitam os limites colocados pelos pais. A partir de 14 anos eles se sentem mais libertos. Mas vivemos em um país com juros altos e as pessoas estão aprendendo a consumir coisas a que não tinham acesso em um passado recente. Por isso, é preciso frisar a importância do planejamento financeiro. E a noção de muitas vezes é preciso desistir de algo para ter condições de desfrutar de uma situação melhor para todos.
Hoje em dia os pais dão muito e os filhos muitas vezes não retribuem na mesma medida. Estamos em um momento de estudar essa transformação. Se o orçamento apertar, acho válido abrir o jogo e expor para o filho que será preciso fazer uma parada técnica, tirá-lo da ginástica ou da natação para ajudar nas contas de casa. É bom incluí-lo nessas decisões. Quem passa por uma experiência assim potencialmente fará questão de ajudar nos gastos de casa quando começar a trabalhar, ou mesmo abrirá mão da mesada. Mas no Brasil, 90% das famílias consideram que um episódio como este é sinônimo de derrota. E muitas mantêm as aparências em nome de uma estrutura que pode ruir lá no futuro.