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Empresas irregulares prometem ganhos irreais com criptomoedas

Só neste ano, a CVM divulgou alertas de atuação irregular de pelo menos quatro empresas que ofereciam investimentos em bitcoins e outra moedas

Bitcoin: lista inclui o Zero10 Club, a Unick, a FX Trading e a F3 Tech (Chris Ratcliffe/Bloomberg)

Bitcoin: lista inclui o Zero10 Club, a Unick, a FX Trading e a F3 Tech (Chris Ratcliffe/Bloomberg)

Marília Almeida

Marília Almeida

Publicado em 23 de maio de 2019 às 10h56.

Última atualização em 24 de maio de 2019 às 14h18.

O Bitcoin é o novo avestruz. Quem conhece a história da Avestruz Master e de outras empresas relacionadas a bichos, como Gallus e Fazendas Reunidas Boi Gordo, vê a história se repetindo: empresas oferecem opções de investimentos exóticas com promessas de ganhos mirabolantes em mercados que poucos dominam e atraem milhares de investidores. O fim da história também é bem conhecido: as empresas crescem enquanto os investidores estão entrando, até uma hora em que o dinheiro novo para de entrar e não há como pagar os resgates, e o esquema desmorona, deixando uma legião de aplicadores no prejuízo.

Uma situação semelhante às modas do avestruz e do boi parece ter tomado conta do mercado nos últimos dois anos, desta vez usando como personagem principal as moedas virtuais, como Bitcoin e seus assemelhados. Só neste ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou alertas de atuação irregular de pelo menos quatro empresas que ofereciam investimentos em criptomoedas no Brasil ou no mercado internacional de moedas, o Forex, prometendo ganhos muito acima aos do mercado. A lista inclui o Zero10 Club, a Unick, a FX Trading e a F3 Tech.

Em alguns casos, a coisa já foi além da CVM. Ontem, a Polícia Federal cumpriu 10 mandados de prisão contra os responsáveis pela InDeal Investimentos, de Novo Hamburgo, acusada de montar uma pirâmide financeira que desviou cerca de R$ 700 milhões de investidores, usando como argumento o investimento em moedas virtuais.

Em comum, quase todas as empresas citadas pela CVM ofereciam investimentos em criptomoedas geridos por elas mesmas, com rentabilidades muito acima das de mercado e sem risco de perdas. A FX Trading oferecia simulações em que a aplicação dobrava a cada três meses, enquanto a F3 garantia 40% de ganho em dois meses. E três dizem atuar com Forex, tipo de negociação de moedas que não é regulamentado no Brasil. A exceção é o Zero10 Club, que oferece intermediação de negócios e ativos digitais, e não Forex, “retornando um percentual mensal que varia entre 5% e 15%”, conforme o site da empresa.

Além do ganho extraordinário, essas empresas têm em comum a falta de registro na CVM e até mesmo um endereço físico ou telefone para contato. Todo o contato com os clientes é feito por meio digital, em sites fechados com senhas, ou por “representantes”, ou “consultores”.

Outra característica importante é que elas oferecem também ganhos para quem traz mais investidores para o esquema. Isso porque faz parte do processo ampliar a base o máximo possível, por meio de premiações, na forma de pagamentos ou comissões cobradas sobre as aplicações dos indicados. Esse processo incentiva o surgimento de “distribuidores”, ou “representantes”, que se esforçam em captar investidores para ganhar comissões sobre seus investimentos. Muitos distribuidores aparecem ostentando carrões, barcos ou mansões que teriam comprado com os ganhos com os grupos.

E nem mesmo casos recentes de empresas do mesmo tipo que quebraram servem de alerta para os investidores, encantados com as promessas de ganhos rápidos e fáceis ou com medo da sensação de que alguém pode estar ganhando muito mais que eles. No começo do ano passado, o Grupo de Investimentos Alcateia quebrou, depois de parar de pagar os resgates e transferir seus investidores para outra empresa, a Maximus Digital, que quebrou pouco depois.

No início, a Alcateia também se apresentava como uma gestora inovadora, que usava robôs para investir no mercado de moedas digitais e outros ativos e obter ganhos muito acima dos de mercado. A empresa não informava sua sede, nem por meio de quais corretoras operava, e muito menos explicava como os robôs só ganhavam, nunca perdiam. E aos que duvidavam de seus resultados, seus consultores respondiam que as críticas vinham de gente que “não entendia dos novos mercados” ou que “fazia o lobby dos grandes bancos”.

Sem poder para impedir atuação

Apesar dos indícios de irregularidades, a CVM não tem o poder de impedir que essas empresas continuem oferecendo as aplicações. O máximo que ela pode fazer é aplicar uma multa, de R$ 1 mil por dia, e divulgar um aviso ao mercado, esperando que os investidores se afastem dessas ofertas. Mas muitos ignoram os avisos, achando que desta vez a coisa é diferente e as empresas continuam captando por muito mais tempo e atraindo mais pessoas.

Nessa situação, o ideal é que o investidor tome cuidado ao aceitar propostas de investimento muito fora da realidade e verifique se a empresa tem registro da CVM ou no Banco Central. É preciso desconfiar também quando a empresa não consegue explicar como consegue ganhar tanto com tanta gente obtendo ganhos bem menores. E tomar ainda mais cuidado quando há oferta de ganhos para quem trouxer mais investidores.

Cabe, portanto, ao investidor evitar entrar nessas histórias de bichos fazendo o papel trágico do pato.

Genbit, do Zero 10 Clube, nega irregularidades e diz que pedirá registro na CVM

A empresa Genbit, controladora da Zero10, enviou nota ao Portal do Pavini a respeito da reportagem. Segundo ela, os serviços de transações com criptomoedas mantidos pelo Programa Zero10 Clube, da empresa Genbit, não necessitam de regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários porque, conforme decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (Conflito de Competência 161.123-SP), as moedas digitais não são valores mobiliários.

A nota destaca também que a plataforma não tem qualquer vínculo com a InDeal Investimentos. E que o Zero10 Clube não responde a qualquer processo sancionatório na CVM, conforme certidão emitida pelo próprio órgão em 24 de abril de 2019.

“Também é equivocado, para não dizer temerário, colocar o Zero10 Clube no rol de serviços e empresas que supostamente agiriam com práticas de mercado questionáveis, como pirâmides financeiras”, diz a nota. A empresa diz também que o Grupo Tree Part, do qual a Genbit faz parte, “desenvolve projetos em outras áreas, tais como saúde e educação, gerando empregos, renda e inclusão social”.
“É importante frisar que o Programa Zero10 Clube pauta suas atividades pela lisura e legalidade. Por isso, mesmo sem a necessidade de se submeter ao crivo da CVM, solicitará seu registro ao órgão, numa demonstração de que conduz seus negócios com a máxima transparência”, diz a nota.

Esta reportagem foi publicada originalmente na Arena do Pavini.

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