Regulamentação da Lei é considerada ilegal por alguns juristas, por propor regras novas (Alex E. Proimos/Creative Commons)
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.
São Paulo – Aposentados podem manter o plano de saúde coletivo após se desligarem da empresa onde trabalhavam, sob as mesmas condições, desde que arquem com a parte que era bancada pelo empregador. Mas esse direito, assegurado pela Lei dos Planos de Saúde (9.656/98) ainda é desconhecido de muitas pessoas que chegam à aposentadoria e são surpreendidas com aumentos bruscos nas mensalidades. Muitos precisam procurar a via judicial, ainda que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já tenha interpretado a Lei de forma a reafirmar que os planos devem ser mantidos sob as mesmas condições, inclusive de preço.
Os artigos 30 e 31 da Lei dos Planos de Saúde dispõem sobre o direito de demitidos sem justa causa e aposentados manterem o plano de saúde coletivo com co-participação do empregador, nas mesmas condições de quando estavam empregados, desde que passem a custear integralmente a mensalidade. O benefício também se estende aos dependentes, mesmo em caso de morte do titular.
Para aposentados que contribuíram para o plano em função do vínculo empregatício por dez anos ou mais, esse direito se torna vitalício. Já para os que contribuíram por tempo inferior a dez anos, o plano pode ser mantido na razão de um ano para cada ano de contribuição. Finalmente, para os demitidos sem justa causa não aposentados, a manutenção do plano se dá por um período equivalente a um terço do tempo de contribuição, com um mínimo de seis meses e um máximo de 24 meses.
Apesar de o texto da Lei ser claro, muitos aposentados se deparam com aumentos que podem ser considerados abusivos após se desligarem da empresa onde trabalharam por dez anos ou mais. O advogado Périsson Andrade atende a centenas de casos como esse, em que ex-funcionários de um grande banco até conseguiram manter o plano após se aposentarem, mas pouco tempo depois se depararam com reajustes da ordem de 200% ou até 300%. Ele explica que a fundação de saúde que oferecia os planos os segregava em uma apólice especial, apenas para aposentados – portanto, com maior risco para a seguradora e consequente maior preço.
“A Lei tem o sentido de assegurar ao aposentado que trabalhou na empresa por mais de dez anos não seja jogado no mercado como se estivesse contratando o plano de saúde pela primeira vez. Na verdade, nem seria necessário ter essa Lei, pois esse direito já é assegurado pelo princípio da boa-fé objetiva. Aquele segurado não é um cliente novo. Ele foi cliente da seguradora por mais de dez anos. A diferença é que a empresa pagava parte da mensalidade”, explica Andrade.
E de fato, essa interpretação já foi reforçada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em junho do ano passado, durante o julgamento de um recurso de caso semelhante àqueles atendidos pelo advogado. Na ocasião, o Ministro Raul Araujo afirmou que a melhor interpretação para o artigo 31 da Lei dos Planos de Saúde “é no sentido de que deve ser assegurada ao aposentado a manutenção no plano de saúde coletivo, com as mesmas condições de assistência médica e de valores de contribuição, desde que assuma o pagamento integral desta”.
Além de conservar o mesmo preço – apenas com os reajustes cabíveis caso a pessoa ainda estivesse na ativa – os planos de saúde mantidos para aposentados deve ter as mesmas condições da época da ativa, como número de dependentes, tipo de acomodação e coberturas. Ou seja, é vetada a segregação do segurado em um grupo considerado de maior risco, com menos coberturas e preço maior, como se ele fosse um cliente novo. Segundo Périsson Andrade, as decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) têm sido favoráveis aos aposentados e dificilmente são levadas ao STJ.
Operadoras se aproveitam da desinformação
Segundo Andrade, apesar de a Lei datar de 1998, durante muito tempo os aposentados deixaram de pleitear esse direito simplesmente por desconhecerem sua existência. Isso porque, para manter o plano de saúde sob as mesmas condições, é necessário que o aposentado seja avisado dessa possibilidade e que faça a opção pela manutenção conscientemente, em até 30 dias após o alerta. “Essa Lei só está ‘pegando’ agora, porque antes as pessoas não eram nem avisadas de que podiam optar pela manutenção do plano. Agora as operadoras estão avisando com mais frequência”, esclarece o advogado.
Ainda de acordo com Périsson Andrade, mesmo quando os aposentados optam pela manutenção do plano, é comum que desistam da escolha após se depararem com um reajuste de preços que o torna impagável. Essa seria, segundo Andrade, uma forma de induzir ao erro o aposentado que não sabe que deve manter o plano com as mesmas condições. “O aposentado que desistir de optar pela manutenção do plano pode depois entrar na Justiça para pleitear esse direito, argumentando que foi levado a erro”, diz o advogado.
Regulamentação é considerada ilegal
A regulamentação dos artigos 30 e 31 da Lei dos Planos de Saúde entrou em vigor em junho do ano passado, porém é considerada ilegal pelo Tribunal de Justiça de São Paulo por dispor de forma diferente do que diz a Lei. A Resolução Normativa nº 279, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), prevê que aposentados possam ser realocados em carteiras diferentes depois de se desligarem da empresa. Embora não esteja explícito no texto, isso na prática possibilita às operadoras reajustar os preços.
“O TJ-SP vem analisando a Resolução, pois as seguradoras estão se baseando nela para tentar revogar as liminares em favor dos segurados”, diz Périsson Andrade, que explica que uma simples regulamentação não pode propor nada novo em relação ao que diz a Lei que ela regulamenta. O TJ já argumentou que “é absolutamente ilegal a manutenção dos inativos em um grupo à parte dos ativos, devendo os custos e riscos serem compartilhados de maneira solidária”.