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Ventos de Brasília podem desequilibrar mercado em outubro

Indefinição sobre programa social do governo deve se arrastar ao longo do mês, provocando maior volatilidade

Paulo Guedes e Jair Bolsonaro: desalinhamento no governo preocupa investidores (Adriano Machado/Reuters)

Paulo Guedes e Jair Bolsonaro: desalinhamento no governo preocupa investidores (Adriano Machado/Reuters)

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Guilherme Guilherme

Publicado em 2 de outubro de 2020 às 08h46.

Última atualização em 2 de outubro de 2020 às 10h16.

Marcado por incertezas internacionais com a reta final das eleições americanas e segunda onda de coronavírus, outubro deve manter um fato de risco adicional no mercado local: o político. Pressionado pelos temores fiscais e atritos no governo, o dólar iniciou o mês contra o real em sua cotação máxima desde maio, acima dos 5,65 reais – e segundo especialistas do mercado, se depender de Brasília, o dólar tende a se manter em patamares elevados.

A mais recente investida do presidente Jair Bolsonaro em tentar criar um programa social com sua cara e abolir a, talvez, maior marca petista, o Bolsa Família, o Renda Cidadã recebeu uma avalanche de críticas de investidores preocupados com a manobra do governo para financiar o projeto, que seria feito por meio de recursos de precatórios e do Fundeb. As consequências foram sentidas nas taxas de juros futuras, com a de vencimento em 2035 indo a quase 9%, enquanto o Ibovespa chegou a perder mais 3,5% em dois dias.

“O mercado estava esperando a criação de um novo imposto, que seria arrecadaria até mais que o dinheiro que seria usado no Renda Cidadã. Mas o imposto não veio por ser impopular e entrou essa conta maluca, incluindo Fundeb e precatórios. O resultado foi bem pior”, comenta Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo.

A repercussão negativa fez o governo recuar, admitindo que já estuda outras possibilidades de financiamento, mas só confirmou a falta de entrosamento dentro do governo. “Há uma divergência de ideias muito grande dentro do governo, que pode causar tensão ainda maior no mercado. Uma hora o financiamento é de uma forma, outra hora, de outro. Tudo isso justifica toda a volatilidade que estamos vendo”, afirma Gustavo Bertotti, economista da Messem.

Em mais um sinal de descompasso na equipe de Bolsonaro, o vice-presidente Hamilton Mourão cogitou, na quinta-feira, 1, a possibilidade de flexibilizar o teto de gastos para viabilizar o Renda Cidadã, indo contra Bolsonaro e Guedes, que asseguraram, no dia do anúncio do programa, na segunda-feira, 28. Para Arthur Mota, economista da Exame Research, que não descarta essa hipótese, acredita que a flexibilização do teto teria impactos graves para o mercado.

“As consequências de curto prazo com uma flexibilização após esse leque de sinalizações ruins seria um aumento da percepção de risco e mais prêmio sendo cobrado pelos investidores nas curvas de juros de mercado”, afirma Mota.

Fotografia recente das rusgas do governo também foi explicitada em episódio recente, em que o presidente Bolsonaro, em vídeo, chegou a ameaçar dar cartão vermelho para quem sugerisse mexer com pagamentos de aposentados para financiar o então Renda Brasil, que no mesmo vídeo ele proibiu que se falasse dele, após notícias na imprensa. O suposto fim das intenções de implementar o programa chegou a ser comemorado no mercado, mas semanas depois, o programa voltou com outro nome, mas com as mesmas dúvidas sobre o financiamento, que devem se arrastar ao longo de outubro.

Em meio a esse cenário Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos, vê como “muito difícil” a aprovação de reformas, como a administrativa e tributária, ainda neste ano. “A gente vê um desalinhamento muito grande dentro do próprio Executivo e o atrito com o Legislativo é mais um obstáculo”, avalia. Para Abdelmalack, privatizações ficam ainda mais inviáveis nesse cenário. "Precisa de aprovação dentro do Congresso e para isso precisa de um clima politico favorável. Até mesmo a Eletrobras, que parecia estar na boca do gol para ser privatizada, não vai progredir."

Nesta semana, os conflitos entre Planalto e Congresso ganharam mais uma página com o recente desentendimento entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia,  que o chamou de “desequilibrado” e sugeriu o filme “A Queda: As últimas horas de Hitler”, após Guedes ter dito que o parlamentar estava atrapalhando o andamento das privatizações.

“A economia brasileira está muito exposta, então qualquer declaração está sendo suficiente para azedar o mercado. Tudo isso mostra que o Guedes está perdendo força [dentro do governo] o sinal amarelo está ligado. Aquele governo de austeridade que foi eleito, está dando lugar para um mais assistencialista”, diz Franchini.

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