No cenário desafiador para as companhias de e-commerce, com custos pressionados pela inflação, o crescimento deixou de ser perseguido a qualquer custo. Para algumas delas, rentabilidade e margem passaram a ser o foco. A safra de resultados do quarto trimestre tem sido uma amostra da execução da estratégia em diferentes níveis.

Para a Mobly (MBLY3), maior plataforma digital de venda de móveis e acessórios do país, a rentabilidade foi o destaque do período. O Ebitda ajustado (métrica de resultado operacional) ficou positivo — um dos objetivos comunicados ao mercado — em R$ 1,8 milhão. O resultado reverteu o Ebitda ajustado negativo de R$ 6,4 milhões no mesmo período de 2020.

"Sofremos no segundo e no terceiro trimestres com a inflação dos insumos. Com o mercado em baixa, foi um desafio repassar esse aumento. Fizemos isso ao longo do segundo semestre e, no último trimestre, conseguimos repassar totalmente. A margem bruta veio saudável, na casa dos 41%", disse Victor Noda, CEO e cofundador da Mobly, à EXAME Invest.

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"O resultado foi especialmente forte porque esse é o trimestre das ofertas, com Black Friday. Ficamos três pontos acima do mesmo período em 2020 [que ficara em 37,9%]", disse Noda. Houve melhora também em relação ao terceiro trimestre de 2021 (39,1%).

O CEO da Mobly apontou que houve ganho de margem em diferentes frentes ao longo do demonstrativo de resultados (o P&L), como na logística, com o aumento da participação de lojas próprias e da MoblyLog nas entregas, reduzindo os custos. A MoblyLog é o braço de logística da própria companhia.

Impacto da inflação

A notícia de alerta é que o cenário segue desafiador em 2022, com a inflação como um dos principais pontos de preocupação e de impacto sobre a demanda. "O mercado de móveis como um todo vem 'rodando' com crescimento negativo desde agosto, setembro de 2021, na comparação com o mesmo mês do ano anterior", disse Noda.

Do lado das vendas, o GMV (volume bruto de mercadorias transacionadas) da Mobly recuou 4,5% no quarto trimestre, ainda que, no ano inteiro, tenha avançado 6,4%.

"Foi um trimestre desafiador, com a base de comparação mais forte com o quarto trimestre de 2020, quando as vendas estavam 'bombando' com a pandemia. A Black Friday no ano passado foi mais fraca e, em dezembro, todos os marketplaces, inclusive nós, reduziram o investimento em marketing e olharam mais para a rentabilidade."

"Conseguimos manter [as vendas] próximas [do que foi no quarto trimestre de 2020], com crescimento de 4,4% nas receitas líquidas nessa comparação, mas com um nível de eficiência e de margens muito melhores", disse Noda. As receitas somaram R$ 721,4 milhões no ano inteiro de 2021, com avanço de 19,6% em relação a 2020.

O executivo apontou dois fatores para a expansão da receita mesmo em ambiente adverso. O primeiro, a adoção do Pix no começo do trimestre, "roubando" share do boleto, em que a taxa de não pagamento chega a 50% — o consumidor faz a compra, emite o boleto e acaba desistindo depois. No Pix, a taxa de cancelamento fica em torno de 5%.

O segundo fator foi a contínua redução do prazo médio de entrega, que atingiu o menor patamar nos dez anos de operação da empresa e, portanto, reduziu as taxas de cancelamento de pedidos.

"Aproximadamente 56% das vendas são entregues em até seis dias. Além dos CDs [centros de distribuição], nossas lojas físicas também auxiliam no processo, oferecendo milhares de produtos disponíveis para retirada aos clientes e assumindo um papel importante em nossa estratégia de distribuição", disse o CEO da Mobly.

O prazo médio de entrega da Mobly no quarto trimestre ficou em 12 dias; um ano antes, o prazo médio era de 18 dias.

O empreendedor faz referência ao plano de expansão de lojas físicas, que complementa a plataforma digital: foram inauguradas três megastores nos três meses finais de 2021, além de uma no modelo store-in-store, totalizando oito novas unidades em 2021. A expansão da rede física tem continuado neste ano, com cinco novas lojas.

"A multicanalidade da Mobly permanece proporcionando uma base sólida para o crescimento da marca e confirma que estamos no caminho certo, mesmo considerando as diferentes interferências externas, macroeconômicas ou específicas do setor, que têm sido mitigadas pela variedade de canais nos quais atuamos", disse Marcelo Marques, CFO (executivo-chefe financeiro), diretor de relações com investidores e cofundador da Mobly.

No ano, as ações da Mobly acumulam alta de cerca de 10%, embora a queda acumulada desde o IPO (oferta pública inicial de ações), há mais mais de um ano, esteja na casa de 75%, na esteira da desvalorização de ações de crescimento no mercado local com o aumento das taxas de juro e outros fatores.