CVC (CVC Corp/Divulgação)
Repórter Exame IN
Publicado em 25 de maio de 2023 às 19h16.
Última atualização em 26 de maio de 2023 às 07h59.
A CVC (CVCB3) anunciou, nesta quinta-feira, Carlos Wollenweber, ex-Even, como novo CFO da companhia. Desde 2020, Wollenweber atuava como diretor financeiro na Even e, posteriormente, de sua controlada MelnickEven. O executivo é o primeiro nome escolhido para o alto comando no desafio da companhia de reestruturar seu capital, enquanto precisa vencer a disputa com as agências de turismo digitais.
O conselho de administração da CVC constituiu um comitê de transição, liderado pelo conselheiro Sandoval Martins, responsável pela direção do grupo até a chegada de um novo CEO.
Durante seu mandato na Even ele liderou o IPO de sua investida MelnickEven, a reestruturação da dívida da companhia, bem como a gestão de crise no início da pandemia. Também atuou como conselheiro de uma das empresas investidas pelo Pátria Investimentos, que já foi uma das acionistas da CVC.
A CVC não estava com vida fácil, mas o cenário ganhou tons ainda mais dramáticos a partir da noite de quarta-feira, 24. Leonel Andrade, que comandava a empresa desde abril de 2020, renunciou, deixando a empresa sem CEO, CFO e diretor de RI. A novidade motivou o Bank of America a rebaixar o papel para venda e fixar o preço-alvo em R$ 1,60 — ainda no começo da tarde desta quinta-feira, a página de relações com investidores da CVC apontava o preço-alvo de R$ 9,00. "As saídas da administração podem minar as relações entre franqueados e fornecedores, acrescentando mais complicações", diz o relatório.
A saída de Andrade deixa o cenário mais complexo porque a CVC vinha passando por uma forte reestruturação. Nesta quinta-feira, 25, o papel caiu 4,63%, acumulando perdas de 36% desde o começo de 2023. Depois do rebaixamento pelo Bank of America, a empresa acumula duas recomendações de venda para sua ação, quatro neutras e apenas uma de compra — da Eleven Research.
Os problemas da CVC se agravaram na pandemia de covid-19, mas a verdade é que vieram de muito antes. No início de 2020, a companhia identificou erros contábeis nos seus balanços de R$ 362 milhões de 2015 a 2019. Também teve de lidar com a crise da Avianca.
Em abril de 2020, uma luz no fim do túnel apareceu quando a companhia anunciou a contratação de Leonel Andrade para o alto comando. Ex-Smiles, Andrade era apontado como um dos melhores executivos do mercado e, possivelmente, o mais adequado para lidar com o tamanho do desafio. No fim de daquele ano, ainda com Maurício Montilha como CFO, a empresa negociou a dívida com debenturistas para prolongar os títulos para vencimentos em 2022 e 2023.
No até então pior momento da empresa, o valor de mercado rompeu o piso de R$ 1 bilhão de valor de mercado e chegou a R$ 900 milhões. Com retomada das vendas e melhoria de margens do lado operacional e dívida negociada, os investidores voltaram. Em meados de 2021, o valor de mercado já passava dos R$ 5 bilhões. A gestora Opportunity é um exemplo de quem apostou no negócio. No começo de 2021, a gestora detinha 15% do capital social da empresa, que é uma corporation e, por isso, não tem controlador definido. Atualmente, a gestora tem cerca de 4% do capital social.
As melhorias operacionais continuaram em 2022. As vendas, que incluem reservas confirmadas, chegaram a R$ 14 bilhões e a receita a R$ 1,2 bilhão, valor 48% maior do que um ano antes. Andrade, já ao lado de Marcelo Kopel (que deixou o cargo de CFO em abril de 2023), continuava a reduzir o endividamento da empresa: ao fim de 2022 a dívida bruta era de R$ 896 milhões, bem abaixo do R$ 1,8 bilhão de 2019.
O contexto macroeconômico, porém, era o desafio que a CVC não precisava nessa retomada. Os juros escalaram para os atuais 13,75%, dificultando o saneamento financeiro e deixando mais custoso o investimento de R$ 400 milhões em uso de tecnologia e digitalização entre 2020 e 2022. O saldo com debenturistas chegou aos R$ 925,9 milhões e um novo reperfilamento se fez necessário. Em março, a companhia conseguiu aprovação dos debenturistas, com os números do acordo ficando claros em maio, na divulgação dos números do primeiro trimestre.
Para estender os milhões em dívida, a companhia se comprometeu a fazer um aumento de capital de pelo menos R$ 125 milhões até novembro, seguido de 'tender offer' de pelo menos R$ 75 milhões para as debêntures existentes reperfiladas. Caso não ocorra o supracitado aumento de capital, a companhia se obriga a aprovar um aumento de capital limitado a R$ 200 milhões com o objetivo de capitalizar as debêntures.
Para a equipe de análise do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME), há, sim, onde a companhia se beneficiar, mas admite que o caminho fica mais complexo no curto prazo. "Apesar de ter atingido o fundo do poço em 2020, espera-se que a CVC seja uma das principais beneficiárias da reabertura econômica, graças ao forte relacionamento com a fragmentada indústria hoteleira e companhias aéreas no segmento B2B. Valorizamos sua retomada desde 2020 e sua enorme escala e poder de barganha com fornecedores, especialmente operadores hoteleiros", escreve a equipe de Luiz Guanais.
No entanto, o banco mantém a recomendação neutra, refletindo "grandes desafios futuros", como alinhar sua base de franqueados com o crescimento online e a concorrência com agências digitais, como Booking, Airbnb e Decolar, por exemplo. "A estrutura de capital da empresa também continua sendo uma preocupação, tornando este um investimento mais arriscado do que outras."
No primeiro trimestre de 2023, o take rate da CVC caiu de 9,7% para 7,4%. O indicador é importante porque é percentual da receita líquida sobre as reservas e funciona como uma espécie de margem do negócio. "Alto impacto no take rate não é bom, mas a performance do trimestre foi positiva. O take rate [do trimestre] é fruto do passado, de viagens já consumidas", explicou Andrade em teleconferência sobre o balanço. O executivo admitiu a fraqueza do índice e assumiu para si a responsabilidade do que podem ter sido escolhas de impacto negativo.
Segundo ele, houve um desempenho abaixo do esperado nos produtos exclusivos negociados com take rate inferior ao projetado, e perdas com não ocupação no montante de R$ 4,8 milhões. "Fechamos contratos diferentes e eu como CEO assumo a responsabilidade. Eles podem ser muito bons para o mercado, mas não são para CVC, como Fórmula 1, Cirque du Soleil e Rock in Rio". Outro impacto negativo para o take rate foi a participação de viagens compradas durante a Black Friday e, portanto, com preços promocionais.
Por fim, outro impacto negativo para o take rate foi o aumento de participação de cruzeiros entre as vendas, mas isso é um fator que não preocupa o grupo. "Cruzeiros cresceram muito, mas, embora tenham take rate baixo, têm zero consumo de capital, o que é importante no atual momento do país", explicou Andrade.
Ainda assim, a receita líquida do grupo cresceu 0,9% frente ao mesmo período do ano passado, por crescimento das reservas. As reservas confirmadas tiveram aumento de 43,8% em comparação ao primeiro trimestre, com a continua procura por destinos internacionais. Considerando ajustes de itens não recorrentes, o Ebitda (lucro antes de juros, impostos depreciação e amortização) mais que dobrou somando R$ 25,5 milhões e o prejuízo da CVC caiu 23%, para R$ 128 milhões.