Invest

A visão de Kenneth Rogoff sobre criptoativos após 3 anos de estudo

Professor em Harvard e ex-economista-chefe do FMI aponta descobertas a partir da análise de 50 milhões de operações com criptoativos

Kenneth Rogoff: parte das operações com criptos é de remessa de recursos, a um custo mais baixo do cobrado por instituições especializadas | Foto: Dado Ruvic/Illustration/Reuters (Dado Ruvic/ Illustration/Reuters)

Kenneth Rogoff: parte das operações com criptos é de remessa de recursos, a um custo mais baixo do cobrado por instituições especializadas | Foto: Dado Ruvic/Illustration/Reuters (Dado Ruvic/ Illustration/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 25 de dezembro de 2021 às 17h42.

Última atualização em 26 de dezembro de 2021 às 09h18.

O bitcoin e outros criptoativos normalmente são avaliados como um investimento altamente especulativo, mas eles estão sendo utilizados em grande medida em transações financeiras entre pessoas, na maioria dos casos em termos nacionais.

A constatação é de Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do FMI, hoje professor na Universidade Harvard e um dos maiores e mais respeitados especialistas em finanças do mundo. Com mais dois acadêmicos, Clemens Graf von LucknerCarmen M. Reinhart, ele analisou 50 milhões de operações com criptoativos durante três anos.

Reinhart e Rogoff escreveram juntos "This Time Is Different: Eight Centuries of Financial Folly", lançado em 2011 e considerado um dos grandes livros da história sobre crises financeiras.

“Talvez um dos motivos para as pessoas fazerem transações com os criptoativos é que não querem que autoridades e outros cidadãos saibam os recursos que possuem, onde e de que forma foram obtidos”, diz Rogoff.

Segundo ele, a maior preocupação relativa aos criptoativos é que podem ser transacionados por pessoas que tentam fugir do pagamento de impostos sobre capitais.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

O estudo aponta que a maioria das transações em vários países, com destaque para Rússia e China, é de operações nacionais. Qual é a principal hipótese do senhor sobre os motivos das transações?

Na Rússia, certamente muitos oligarcas estão sob sanções internacionais de outros países, o que também ocorre com várias nações. Acredito que eles tentam evitar a vigilância financeira dos Estados Unidos. Em princípio, essas operações podem ser rastreadas, mas é preciso a permissão de autoridades para ter tal informação, o que não é disponível para muitos países.

Talvez um dos motivos para as pessoas fazerem transações com criptoativos é que não querem que autoridades e outros cidadãos saibam os recursos que possuem, onde e de que forma foram obtidos. É uma questão de privacidade.

Algumas das operações são remessas de recursos, que são muito mais baratas do que as realizadas pela Western Union e por outras companhias.

Uma das principais razões para as pessoas fazerem transações com criptoativos seria tentar fugir do pagamento de impostos sobre capitais?

Em termos gerais, essa é a maior preocupação em relação ao bitcoin e a outros criptoativos. Não sei se exatamente seria uma questão de impostos, mas pode estar relacionado com ilegalidades. Na China, há uma linha tênue entre o pagamento de tributos e o temor de que o governo vai confiscar os recursos dos cidadãos.

Em muitas vilas na Índia, mulheres compram ouro como ativo de proteção, pois acreditam que o governo vai tomar seus recursos. Os criptoativos podem estar exercendo um papel semelhante. Em alguns casos, podemos até ser favoráveis a esse procedimento, mas é muito difícil apoiar tal comportamento em muitos países onde os impostos são estáveis e as leis são respeitadas. Na prática, esses ativos são utilizados como notas de US$ 100 com esteroides.

O FMI publicou estudo no qual aponta que a regulação de criptoativos precisa ser coordenada em nível mundial. Como o senhor avalia isso?

Não acredito que seja necessário regular todos os países, mas, sim, nas economias mais avançadas e, de forma ideal, nos maiores mercados emergentes. A abrangência das normas dependerá de quão grande é a base de valores analisada.

Hoje, é possível basicamente ter uma conta em bitcoin no JPMorgan e também utilizar criptoativos para comprar mercadorias. Essas práticas permitem lavagem de dinheiro, que precisam ser controladas, embora não seja possível bani-las completamente.

É viável tornar mais arriscadas tais atividades se forem pegas pelos reguladores, mas países como Coreia do Norte e Irã nunca concordarão com tais normas globais. Se elas forem adotadas nas economias avançadas, já será um grande progresso. O problema real está nos Estados Unidos, com os suspeitos de sempre atuando, especialmente os lobistas que defendem esses ativos perante autoridades.

Há ETFS de bitcoin, fundos de pensão comprando bitcoin, grandes instituições de investimento com permissão para oferecer fundos em criptoativos. Isso é loucura. Quando converso com dirigentes de instituições reguladoras e de bancos centrais, vejo que há um forte consenso de que essa situação é um desastre, mas eles já têm muitos problemas para enfrentar.

O senhor avalia que os países do G7 (sete dos países mais ricos do mundo) deveriam se reunir para discutir a adoção de regulações comuns sobre criptoativos?

Esses países têm muitos problemas provocados pela pandemia, mas avalio que, quando estiverem reunidos, deveriam definir como adotar tais regulações. Não defendo que todas as operações com criptoativos devem ser proscritas, mas somente aquelas cujos responsáveis são anônimos.

(Com a Redação)

Empresas e instituições financeiras bilionárias estão em busca de profissionais de ESG. Saiba como entrar neste mercado na série Jornada Executivo de Impacto, inscreva-se aqui.

Acompanhe tudo sobre:Banco CentralCriptoativosCriptomoedasFMI

Mais de Invest

O que é private equity e como funciona?

Quanto rendem R$ 20 mil por mês na poupança?

CD americano x CDB brasileiro: quais as diferenças e qual vale mais a pena investir

Goldman Sachs vê cenário favorável para emergentes, mas deixa Brasil de fora de recomendações

Mais na Exame