Reskilling, upskilling: as habilidades para "sobreviver" à IA, segundo Martha Gabriel
Em novo livro, futurista destaca que inteligência artificial vai valorizar trabalhos analíticos feitos por humanos, exigindo pensamento crítico
Repórter do Future of Money
Publicado em 19 de janeiro de 2024 às 17h54.
Última atualização em 22 de janeiro de 2024 às 11h47.
O rápido avanço da inteligência artificial generativa nos últimos meses também despertou um medo entre muitos trabalhadores: o de ser substituído pela tecnologia e suas ferramentas. E, apesar da novidade colocar algumas áreas e atividades em risco, existem ações que podem ser feitas para se adaptar à IA generativa. É o que afirma Martha Gabriel , futurista e integrante do Institute for The Future (IFTF), nos Estados Unidos.
Esse processo de adaptação é o tema do novo livro da pesquisadora, chamado "Liderando o Futuro". Em entrevista à EXAME, ela explica que a inteligência artificial, em especial a generativa, traz como grande novidade um "deslocamento do valor na cadeia de produção", ou seja, as atividades consideradas mais importantes notrabalhopassam a ser outras.
"Isso beneficia os [profissionais] analíticos, que ganham ampliação, porque eles estão na origem da utilização da ferramenta [de inteligência artificial]. O valor está na pergunta, no comando, na estruturação. Os profissionais em risco estão na parte final da cadeia, de produção, com trabalhos repetitivos", afirma.
Para a especialista, o cenário é semelhante ao que ocorreu no início do século 20, quando houve uma intensa automação de atividades da "área material, de produção de produtos físicos": "No começo, o valor do produto estava no item final, e quando começa a ter a automação industrial o produto final é barateado e replicável, e aí o valor passa a estar em quem faz os sistemas, as patentes, as máquinas, a criação do processo".
"É a mesma coisa agora, com a inteligência artificial você consegue separar o processo criativo da arte, do conteúdo, final, já que a ferramenta generativa consegue automatizar isso", avalia. A novidade, portanto, passa a ser a capacidade de automatizar os "produtos mentais, cognitivos", ligados à chamada "economia criativa".
"Antes, os sistemas focavam na produção mecânica, agora consegue automatizar processos cognitivos. Você confunde o sistema cognitivo com a máquina, mas, por enquanto, nenhuma máquina tem intenção, precisa de uma orientação, e o humano dá isso", ressalta.
Nesse processo, Gabriel acredita que, um ano após a estreia do ChatGPT , a inteligência artificial generativa vai "realmente entrar na agenda das empresas e das pessoas. E já vemos um impacto maior nas profissões. Na área de geração de conteúdo por exemplo, em dublagem, tradução, criação de conteúdo, já está ocorrendo, mas o potencial é de impactar todas as áreas".
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Como se adaptar?
Ao lembrar de pessoas que afirmaram que o ChatGPT criaria a profissão de " engenheiro de prompt " - os comandos dados à ferramenta - Martha Gabriel compartilha uma visão contrária: "todo mundo vai precisar ser engenheiro de prompt, não vai ser profissão, vai ser habilidade". E ela ressalta que dominar essa habilidade "demanda um repertório enorme. Precisa ter a base para iniciar esses processos e ter com o que comparar, sem isso não consegue fazer um bom prompt, avaliar o que a máquina te entrega".
Esse processo envolve duas habilidades que a especialista acredita serem essenciais no momento: o upskilling -a capacidade de melhorar e aprofundar habilidades na sua atual linha de atuação- e o reskilling -a capacidade de aprender e se concentrar em novas habilidades em outra área, ao se "reestruturar totalmente".
Entretanto, ela ressalta que o pensamento crítico é essencial para ser bem-sucedido nesses dois movimentos. "Às vezes as pessoas acham que, como aprenderam a fazer prompt, fez upskilling. Na realidade, às vezes o que precisava fazer era aprender a fazer uma nova linha de atuação na área dela. É preciso ter esse direcionamento. O reskilling é reestruturar totalmente, é quando está em uma área que é toda automatizada e precisa ir para outra atividade", comenta.
Portanto, Gabriel diz que é essencial "entender para onde está indo a necessidade de trabalho e se adequar de acordo com isso. Às vezes tenta melhorar em algo que vai ser desnecessário". Ela reconhece que esse processo não é fácil, em especial em um cenário "incerto, acelerado e tecnológico", mas é essencial para "garantir a sua relevância agora e no futuro".
E, mesmo destacando a importância das ações individuais nesse processo, ela também reconhece que há um papel importante a ser cumprido pelos governos. "Qual é o maior problema? A educação. O governo tinha que estar com uma ação de educação direcionada para esse novo cenário, e isso começa desde lá de baixo. Ter curso de pensamento crítico, entender o que é a tecnologia. Com esse pensamento você resolve os próprios problemas, todo mundo trabalha pela mesma solução. Sem ele, todo mundo toma a decisão errada", opina.
"O presente cria o futuro, e a nossa visão de futuro modifica as ações do presente. Existem várias visões, uma delas é a apocalíptica, mas existem caminhos de ter uma sociedade avançada, sustentável, inteligente, e esse caminho é possível. Se direcionar, fizer as ações corretas em conjunto, o futuro pode ser maravilhoso. Ele está em aberto. Temos o poder de agir para criar o melhor cenário, mas todos juntos, porque futuro não se cria sozinho", destaca.
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