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Sustentabilidade na moda: movimento Fashion Revolution, criado em 2014, atua no Brasil e em mais de outros 80 países (Reprodução/Getty Images)
Repórter de ESG
Publicado em 14 de julho de 2023 às 11h24.
O setor da moda é um dos que mais poluem os rios e descartam resíduos em grandes lixões a céu aberto – como acontece com os rios indianos que mudam de cor de acordo com os tingimentos usados nas coleções da estação ou no deserto do Atacama, localizado no norte do Chile. Foi pensando em reverter este cenário que surgiu o movimento global Fashion Revolution (do inglês, revolução da moda), que propõe mudanças estruturais na moda através de diferentes intervenções. “Temos o objetivo de revolucionar a moda para que ela preserve e regenere o meio ambiente, valorizando as pessoas e a natureza acima do crescimento e do lucro”, disse Isabella Luglio, coordenadora educacional do Fashion Revolution em entrevista para a EXAME ESG.
Segundo dados de 2022 do Observatório de Complexidade Econômica (OEC), o Chile é o maior importador latino-americano de roupas usadas, recebendo 90% dessa categoria de produtos. Outro dado relevante, dessa vez da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), é que o Brasil produz mais de quatro milhões de toneladas de resíduos têxteis, dentre eles, retalhos da indústria e peças de couro.
Então, repensar os caminhos da cadeia de produção da moda é extremamente relevante. Luglio conta que o Fashion Revolution nasceu em 2014 e que, em 2018, o movimento se tornou o Instituto Fashion Revolution Brasil. Hoje, o movimento está presente em 90 países e, no Brasil, conta com mais de 300 voluntários, segundo Luglio, e faz um chamamento voltado para conscientização de designers, marcas, produtores, líderes de negócios, fabricantes, trabalhadores e consumidores.
Para a coordenadora, pensar em sustentabilidade significa gerar uma mudança sistêmica e holística, que tem urgência para, assim, preservar e regenerar o meio ambiente. Outro ponto importante é que essa mudança propõe, além da transparência, valorização das pessoas envolvidas durante os diferentes processos da cadeia produtiva, além da valorização da natureza – além da visão de crescimento e lucro. No Manifesto Fashion Revolution, o movimento apresenta os dez pontos de prioridade para que a sustentabilidade na moda seja aplicada, dentre eles, está trabalho digno, respeito às heranças culturais e sem descartes.
Os desafios do projeto tem sido aumentar a diversidade dos participantes e conseguir financiamentos voltados para a manutenção do Instituto. “O Fashion Revolution vem realizando um processo de reestruturação da governança em âmbito global, com uma maior participação de todas as regiões nas tomadas de decisão e o apoio no desenvolvimento de um olhar local para o contexto de cada país para que todos trabalhem em prol do mesmo objetivo mas com ações e campanhas alinhadas com os seus contextos”, disse Luglio.
O processo de conscientização também permeia os impactos negativos causados pela moda, e a questão dos resíduos é um dos pontos focais do movimento. O Fashion Revolution produz um estudo chamado Índice de Transparência da Moda Brasil, que analisa o impacto das marcas do setor.
Segundo o levantamento, 72% das marcas analisadas não divulgam o processo utilizado para definir um material como sustentável e apenas quatro marcas das 60 que participaram do estudo (7%) divulgam o que estão fazendo para minimizar o impacto dos microplásticos.
Pensando em circularidade, o índice diz que 23% das marcas participantes divulgam como investem em soluções circulares que permitam a reciclagem de peças – além da reutilização e do downcycling (que é um processo usado para reciclar e produzir novos objetos de qualidade menor). Enquanto, 75% das marcas não divulgam a quantidade do que é produzido anualmente, o que levanta um alerta sobre os resíduos gerados pelas produções e sobre uma possível superprodução das marcas.
“Seja curioso, descubra e faça algo”, Luglio reforça a frase como mote para a construção de uma moda melhor para todos. De acordo com o índice, a economia circular responde a um tripé composto por economia, meio ambiente e sociedade. O projeto circular pode ser sustentável mas não obrigatoriamente, pensando em circularidade o ponto principal é o fechamento do ciclo de recursos.
E quando o assunto é transparência, toda marca deve reportar seus impactos com detalhamento pensando em energia limpa, circularidade e carbono zero, características essas que garantem, segundo o estudo, que o planeta seja habitável e com condições justas.
O movimento Fashion Revolution se desdobra em uma série de iniciativas, dentre elas a Semana Fashion Revolution, campanha que existe desde 2013 e que tem como questionamento central “Quem Fez Minhas Roupas?”, para dar espaço para discussões de transparência e ética na moda.
Há também o Projeto Cidade Tiradentes, que começou neste ano para levar a moda como manifestação cultural e profissionalizante para espaços periféricos como Ferraz de Vasconcelos, Guaianases e Itaquaquecetuba; e a Escola de Moda Decolonial Fórum Fashion Revolution, que se propõe a descolonizar o pensamento da moda e teve a primeira edição ainda neste ano e contou com 500 inscrições, o Índice de Transparência da Moda Brasil, um índice anual das maiores marcas e varejistas de moda no Brasil – além do Fórum Fashion Revolution 2023, uma plataforma voltada para pesquisa e desenvolvimento sustentável voltado para o estudo e produções artísticas que, mais tarde, se transforma em um e-book, e está na 5ª edição.
Esse último, que conta com inscrições para a submissão de trabalhos até o dia 24 de julho, tem como objetivo posicionar o Brasil como eixo gerador de conhecimento, promovendo a reflexão crítica com foco em transparência sobre a produção e o consumo da moda.
Apesar de existir desde 2018, em 2020, o projeto aconteceu de maneira digital por conta da pandemia e em 2021, houve o adiamento por conta de congelamentos de projetos ligados à Lei Rouanet. Os projetos escolhidos serão apresentados em um evento que acontecerá em outubro e as participações são gratuitas.
“O Fórum existe para incentivar essa produção e ser esse espaço para diálogo, discussão de soluções honrando nosso passado e discutindo sobre o nosso futuro. Existe também para valorizar os pensadores de moda brasileiro, os trabalhos inscritos são avaliados pelo Comitê Científico do Fórum Fashion Revolution composto por incríveis e respeitados acadêmicos pensadores de moda e sustentabilidade do país com representantes de todas as regiões”, afirma Leal.
O e-book produzido como resultado das submissões tem registo de ISSN 2675-6560, código de registro internacional de documentos periódicos, reconhecimento importante para quem está desenvolvendo pesquisas de artigos e dissertações e busca a comprovação de publicações.
“Celebramos a moda como uma influência positiva, ao mesmo tempo em que examinamos as práticas da indústria e aumentamos a conscientização sobre os problemas mais prementes da indústria da moda. Queremos mostrar que a mudança é possível e incentivar quem está nessa jornada para criar um futuro mais ético, sustentável e transparente”, disse Luglio.