ESG

Cacique da Amazônia pede ajuda para combater a biopirataria e critica falta de ação

Líder Huni Kui reclama da demora no avanço das discussões sobre a exploração ilegal de recursos tradicionais dos povos indígenas

Apropriação: em alguns países, a ayahuasca, que já é vendida em cápsula, se tornou uma lucrativa indústria do turismo psicodélico (Getty Images)

Apropriação: em alguns países, a ayahuasca, que já é vendida em cápsula, se tornou uma lucrativa indústria do turismo psicodélico (Getty Images)

AFP
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Agência de notícias

Publicado em 14 de maio de 2024 às 10h42.

Última atualização em 14 de maio de 2024 às 11h48.

O líder do povo Huni Kui da Amazônia brasileira mantém a "esperança" de que a ONU ajude a combater a biopirataria, a exploração ilegal de recursos tradicionais dos povos indígenas.

Mas os debates para concluir um tratado sobre esta questão avançam "muito lentamente", declarou o cacique Ninawa em uma entrevista concedida esta semana à AFP em Genebra, onde acontece uma reunião da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), uma agência da ONU.

Vestido com traje tradicional, o cacique abençoou a conferência, com cantos e música, em uma cerimônia que contou com a presença de vários diplomatas. Segundo ele, "os povos indígenas do planeta sempre depositaram sua confiança na ONU", mas lamenta que além das "declarações e recomendações aos Estados, as coisas não mudem". Mas "queremos manter a esperança nas Nações Unidas", disse.

O projeto de tratado — negociado durante mais de 20 anos após um pedido inicial da Colômbia em 1999 — estipula que aqueles que fizerem solicitações de patentes devem divulgar o país de origem dos recursos genéticos e os povos indígenas que proporcionaram os conhecimentos tradicionais utilizados nas inovações.

Diversidade

Estes recursos — como plantas medicinais, variedades vegetais e espécies animais — são cada vez mais utilizados em muitas inovações na pesquisa e nas indústrias cosmética, farmacêutica, biotecnológica ou de suplementos alimentares.

Como atualmente não é obrigatório publicar a origem das inovações, muitos países em desenvolvimento temem que patentes sejam concedidas sem o conhecimento dos povos indígenas ou a outras inovações.

"Nós, como conhecedores e protetores desse conhecimento, temos muito a contribuir", afirma o cacique. O líder indígena lamenta que "no Brasil e na América do Sul em geral", "as empresas estejam se apropriando dos conhecimentos tradicionais e genéticos dos povos originários" sem autorização.

"Nosso território está destruído, nosso conhecimento, nosso espírito, nossa vida está destruída, tudo nos é tirado", denuncia.

No entanto, destaca que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva "tem muita vontade de mudar as coisas". Mas, acrescenta, "não depende apenas do presidente Lula".

Ayahuasca

"Muitas plantas são utilizadas como medicamentos tradicionais e empresas estão se apropriando destes conhecimentos para fazer perfumes, remédios...", explica. Cita como exemplo a ayahuasca, bebida ancestral dos povos indígenas, feita com plantas alucinógenas da Amazônia.

Em alguns países, uma lucrativa indústria do turismo psicodélico se desenvolveu devido à planta, que já é vendida em cápsulas ou infusões na internet.

"Há muitos laboratórios que querem estudar [a ayahuasca] para fazer tratamentos para as pessoas com problemas psicológicos ou mentais", explica o cacique Ninawa.

Ameaça

A comunidade que ele lidera — composta de 17 mil membros no Brasil e 4 mil no Peru — sente-se ameaçada pela biopirataria: "a forma como estão entrando em nossa comunidade, em busca de conhecimentos tradicionais e ancestrais, é uma grave ameaça".

"A luta contra a biopirataria poderá atingir um ponto de virada se os mais de 190 Estados-membros da OMPI chegarem a um acordo em Genebra. Têm até 24 de maio para alcançá-lo, encerrando assim mais de 20 anos de negociações.

"Viemos trazer uma declaração dos povos indígenas do Brasil, apontando quais são os problemas que a apropriação do nosso conhecimento está causando à nossa comunidade", explica o cacique do povo Huni Kui.

Estes conhecimentos "fazem parte da nossa espiritualidade e não é um recurso natural para a economia", afirma."É muito importante que os governos e os líderes" saibam que "a nossa relação com a Mãe Natureza não é econômica, mas um meio de nos relacionarmos com a vida".

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