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Tragédia aérea sacode o Quênia, das favelas aos arranha-céus

Remessas de recursos superam exportações de chá e turismo como principais fontes de moeda estrangeira do país africano e ajudam a impulsionar a economia

Tragédia aérea: parente carrega uma fotografia de retrato do piloto da Ethiopian Airlines Yared Getachew enquanto ele chora na cena do acidente. 14 de março de 2019 (Tiksa Negeri/Reuters)

Ligia Tuon

Publicado em 17 de março de 2019 às 08h00.

Última atualização em 17 de março de 2019 às 08h00.

Uma vez por ano, Abdullahi Ibrahim Mohammed juntava dinheiro suficiente para voar da Arábia Saudita de volta para casa, no Quênia , para visitar a esposa, os pais e os três filhos, sustentados por suas longas horas de trabalho.

Neste ano ele não conseguiu.

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O trabalhador da indústria láctea, de 36 anos, foi uma das 157 pessoas que morreram no domingo na queda de um avião da Ethiopian Airlines com destino à sua cidade natal, Nairóbi, em um campo perto da capital da Etiópia. A tragédia chocou o mundo e provocou o cancelamento de voos com o jato Boeing 737 Max, mas foi sentida em especial no Quênia, que perdeu 32 cidadãos -- mais do que qualquer outro país.

“Ele me ligou na sexta-feira e disse que deixaria a Arábia Saudita no sábado”, disse a mãe de Mohammed, Kaltuma Yahya Abdallah, em entrevista, em sua casa, em Kibera, Nairóbi, um dos maiores assentamentos informais da África. “Ele perguntou o que eu queria que ele trouxesse para mim e eu disse que qualquer coisa estava bom.” Foi a última vez que conversaram.

Professores universitários; um especialista em doenças; funcionários da General Electric e da TechSoup Global; um funcionário da federação nacional de futebol; trabalhadores migrantes levando remessas vitais -- estas foram apenas algumas das vítimas quenianas do acidente. Suas histórias de vida apontam para a riqueza de iniciativas, sonhos e talentos encontrados no centro empresarial da África Oriental, que também abriga a sede regional da Organização das Nações Unidas.

Influência regional

“A influência regional do Quênia pode ser vista desta forma -- no calibre das pessoas que morreram”, disse Macharia Munene, professor de História e Relações Internacionais da Universidade Internacional dos Estados Unidos em Nairóbi.

Havia pessoas de outras 34 nacionalidades a bordo do avião etíope, cujo acidente foi o segundo envolvendo um jato 737 Max 8 em apenas cinco meses. A rota programada, com saída de Adis Abeba, sede da organização União Africana, a torna popular entre diplomatas e viajantes de negócios, o que gerou o apelido de “transporte da ONU”. Muitos dos mortos deveriam participar de uma cúpula da ONU.

A capital do Quênia abriga também a sede regional de empresas como Toyota Motor, Alphabet, dona do Google, e Coca-Cola.

Assim como Mohammed, muitas vítimas quenianas haviam deixado o país para seguir carreiras, mas mantinham fortes ligações com sua terra natal. As remessas de recursos superam as exportações de chá e o turismo como principais fontes de moeda estrangeira do Quênia e ajudam a impulsionar essa economia de rápido crescimento. Elas chegaram a US$ 2,94 bilhões em 2018, cerca de 50 por cento mais do que no ano anterior.

Em Kibera, cercada por membros da unidade comunidade núbia, a família de Mohammed disse que sua esposa e seu tio tinham partido para a Etiópia para obter mais informações sobre o acidente. A família aceita o fato de não haver restos mortais para enterrar.

“Nossa vida vai mudar, mas o que eu posso fazer?”, disse Abdallah, descrevendo um filho que contava piadas, nunca guardava rancor e enviava dinheiro e remédios regularmente para o pai diabético. “Temos que aceitar o que aconteceu.”

Em muitas outras famílias e empresas de todo o país, os quenianos estão começando a processar perdas semelhantes.

“É um período traumático para o Quênia”, disse Munene, o professor. “As pessoas não devem perder a esperança, apesar da tristeza. Como país, nós vamos nos recuperar.”

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