Economia

Tabela do frete é ineficaz e aumenta custos e preços, diz BCG

Estudo da consultoria Boston Consulting Group aponta aumento de R$ 500 mil nas despesas com transporte em uma única empresa

Frete tabelado foi criado para minimizar os custos com diesel depois da greve dos caminhoneiros em maio (Ueslei Marcelino/Reuters)

Frete tabelado foi criado para minimizar os custos com diesel depois da greve dos caminhoneiros em maio (Ueslei Marcelino/Reuters)

CC

Clara Cerioni

Publicado em 17 de novembro de 2018 às 08h00.

Última atualização em 17 de novembro de 2018 às 08h00.

São Paulo – A tabela da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que fixa valores mínimos para o frete rodoviário e foi uma das exigências dos caminhoneiros para encerrar uma greve em maio, tem encarecido produtos e aumentado o custo das empresas.

A conclusão é de um relatório feito pela consultoria estratégica The Boston Consulting Group (BCG) com o título Implicações da Crise do Frete para o Setor Privado.

O texto aponta que a criação da tabela, que em tese preservaria a renda dos caminhoneiros, não corrige as origens do problema que levou à greve e ainda traz uma série de prejuízos para os negócios do país.

Na perspectiva do BCG, complementada por entrevistas com cinco grandes empresas, dentre elas transportadoras rodoviárias, ferroviárias, do setor da agroindústria e um grande exportador, a tabela é ineficaz e apresenta uma série de desafios para sua implantação.

“Somente para uma empresa entrevistada, a tabela do frete representou um custo adicional de 500 milhões de reais no ano. E isso afeta muito a sua competitividade. Além disso, o mecanismo não resolveu a causa raiz do problema, de excesso de capacidade de transporte rodoviário. No final das contas, é mais um elemento de complexidade na já ineficiente cadeia logística do país”, disse Thiago Cardoso, diretor do BCG e um dos autores do relatório.

Segundo Cardoso, o caminhoneiro autônomo pode até ganhar mais por uma única viagem, mas ele pode ficar mais tempo ocioso do que quando o valor do frete era regulado pelo mercado.

“Ele não tem acesso à demanda de transporte, é geralmente contratado por um operador logístico ou por um embarcador que, com a tabela do frete, está no processo de formar uma frota própria. Isso quer dizer que o autônomo não necessariamente irá ganhar mais com o preço tabelado”, explicou Cardoso.

Guilherme Bordin, diretor comercial da Ibor Transporte Rodoviário, de Juiz de Fora (MG), conta que os grandes operadores e até mesmo os donos da carga já começaram a adquirir caminhões para uma frota própria, e dessa forma mitigar o aumento dos custos com o frete tabelado.

“O que vemos é que o autônomo está perdendo um pouco o espaço nos grandes clientes. Isso porque os embarcadores estão preferindo contratar o transporte de empresas que operam com frota própria. O custo diminui muito”, afirma Bordin.

Ele explica que quando a empresa contrata o frete de transportadoras que operam com terceiros, ela paga além da tabela do frete, um percentual que configura como lucro da transportadora.

“O autônomo terá que se reinventar, talvez operar em alguns nichos de mercado, como transporte nas cidades, em distâncias menores. Assim, o custo não aumenta de forma substancial para o dono da carga e consequentemente para o produto”, diz o executivo.

A Ibor Transporte Rodoviário realiza 4 mil viagens mensais com uma frota de 370 caminhões, todos próprios.

Custo alto no agronegócio

Para a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a tabela do frete fere a livre concorrência e prejudica a indústria brasileira.

“A dependência do transporte rodoviário para a movimentação de produtos agropecuários é evidente. As más condições das rodovias e o tabelamento obrigatório de fretes rodoviários incorrem em altos custos de transportes e no aumento generalizado dos preços dos produtos”, informa o estudo “O futuro é o Agro”.

Uma das medidas que o estudo aponta como alternativa para melhorar o transporte da produção é, além de implementar programa de recuperação e melhoria das principais rotas de escoamento, manter princípios básicos de livre mercado, no novo marco regulatório do Transporte Rodoviário de Cargas (TRC), priorizando a livre negociação e vedando o tabelamento de fretes rodoviários.

Outro problema apontado pela CNA é a multa que é aplicada ao caminhoneiro autônomo e às empresas que não seguem a tabela da ANTT.

De acordo com a normativa da ANTT publicada no início de novembro, se o caminhoneiro não aplicar os preços da tabela ele pagará multa de 500 reais. No caso do embarcador, esse valor pode chegar até 10,5 mil reais.

A CNA protocolou na última terça-feira (13), no Supremo Tribunal Federal (STF), uma medida cautelar para pedir urgência no julgamento das ações sobre os preços mínimos do frete rodoviário e a suspensão das multas fixadas pela ANTT por eventual descumprimento da tabela.

A Confederação ajuizou em junho uma ação sobre o tema e aguarda a análise da Corte. O relator do caso é o ministro Luiz Fux.

Outro setor que viu os custos aumentarem com a tabela do frete foi o de calçados. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, afirma que o transporte representa de 3% a 4% do valor final do produto.

“A tabela padrão fere a lei de mercado. Os aumentos não são toleráveis e a alta nessas despesas pesa no faturamento das empresas”, diz Klein, acrescentando que a maior parte da produção de calçados no Brasil é escoada por caminhões. “Somos muito dependentes do transporte rodoviário no país.”

A indústria calçadista brasileira viu sua produção cair 3,6% de janeiro até setembro, segundo dados do Abicalçados. Nesse período o consumo também caiu 3%.

“Mesmo com essa queda, esperamos fechar com um faturamento semelhante ao do ano passado, 21 bilhões de reais”, afirma Klein.

Acompanhe tudo sobre:ANTTCaminhoneirosCusto BrasilEstradasSetor de transporteTransporte e logística

Mais de Economia

“Estamos estudando outra forma de financiar o mercado imobiliário”, diz diretor do Banco Central

Reunião de Lula e Haddad será com atacado e varejo e não deve tratar de pacote de corte de gastos

Arrecadação federal soma R$ 248 bilhões em outubro e bate recorde para o mês

Rui Costa diz que pacote de corte de gastos não vai atingir despesas com saúde e educação