Economia

O êxodo do dinheiro na China

Chineses ricos estão enviando dinheiro ao exterior em busca de investimentos mais seguros -- muitas vezes violando os controles cambiais dentro da China


	Chineses ricos estão enviando dinheiro ao exterior em busca de investimentos mais seguros -- muitas vezes violando os controles cambiais dentro da China
 (AFP)

Chineses ricos estão enviando dinheiro ao exterior em busca de investimentos mais seguros -- muitas vezes violando os controles cambiais dentro da China (AFP)

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Da Redação

Publicado em 4 de novembro de 2015 às 10h02.

O número de indivíduos ricos na China continua aumentando. Como sua economia doméstica está mostrando sinais de fragilidade, eles estão enviando dinheiro ao exterior a níveis sem precedentes em busca de investimentos mais seguros -- muitas vezes violando os controles cambiais desenvolvidos para manter o dinheiro dentro da China.

Esse fluxo de dinheiro está sendo sentido em todo o mundo, elevando os preços dos imóveis em Sydney, Nova York, Hong Kong e Vancouver. Os chineses investiram quase US$ 30 bilhões em residências nos EUA no ano que terminou em março passado, o que faz deles os maiores compradores estrangeiros de imóveis.

O preço médio de suas compras? Cerca de US$ 832.000. A mesma tendência é observada em Sydney, onde os investidores chineses abocanham um quarto das novas residências e deverão dobrar seus investimentos até o final da década. Em Vancouver, os chineses ajudaram a duplicar os preços dos imóveis nos últimos 10 anos. Em Hong Kong, os preços dos imóveis subiram 60 por cento de 2010 para cá.

No total, o UBS Group estimou que US$ 324 bilhões deixaram o país asiático no ano passado. Embora os números deste ano ainda não estejam disponíveis, durante as três semanas de agosto depois que a China desvalorizou sua moeda, o Goldman Sachs calculou que outros US$ 200 bilhões poderiam ter saído do país.

Como esses volumes de dinheiro saem do país se os chineses são limitados por regras que permitem um câmbio de apenas US$ 50.000 por pessoa ao ano?

Os métodos incluem bancos clandestinos na China, transferências por meio de casas de câmbio de Hong Kong, transporte de dinheiro vivo pelas fronteiras e reunião de cotas de familiares e amigos -- uma prática conhecida como “smurfing” --. As transferências são realizadas em uma área cinza da legalidade transfronteiriça: o que é perfeitamente legítimo em outro país pode infringir a lei na China.

“Não é legal que as pessoas usem canais secretos para levar dinheiro ao exterior, porque isso é contrabando”, diz Xi Junyang, professor de finanças da Universidade de Finanças e Economia de Xangai. “Mas o governo manteve uma atitude laissez-faire até recentemente”.

Agora, as autoridades estão começando a levar a sério a saída de capital. Embora não esteja prestes a ficar sem dinheiro, a China intensificou a repressão aos bancos clandestinos que canalizam dinheiro ilegalmente para o exterior. O país está tentando também capturar autoridades suspeitas de fugir para o exterior com recursos do governo.

A longo prazo, a China prometeu remover seus controles cambiais e tornar o yuan totalmente conversível por volta de 2020. Listamos alguns métodos comuns a milhões de chineses, que estão usando-os para conseguir uma vantagem perante os demais:

1. Ir a uma casa de câmbio em Hong Kong

Funciona assim: os chineses vão a Hong Kong e abrem uma conta bancária. Depois vão a uma casa de câmbio, que informa ao cliente um número de conta bancária na China continental para a realização de uma transferência doméstica a partir de sua conta dentro da China.

Assim que essa transação é confirmada, normalmente em apenas duas horas, a casa de câmbio de Hong Kong transfere o equivalente em dólares de Hong Kong, dólares americanos ou qualquer outra moeda estrangeira para a conta do cliente em Hong Kong. Tecnicamente, nenhum dinheiro atravessa a fronteira -- ambas as transações são realizadas através de transferências domésticas.

Embora a primeira transação tenha que ser feita pessoalmente, os clientes podem realizar as futuras operações por meio de serviços de mensagens instantâneas, como WhatsApp ou WeChat, e as casas de câmbio não estabelecem limites para a quantia a ser movimentada. Se as agências precisam recarregar as reservas, digamos, em Hong Kong, elas podem transferir dinheiro diretamente da parte continental da China por meio de uma transação comercial, que não está sujeita aos mesmos controles cambiais aplicados aos indivíduos.


2. Levar um cheque de um banco clandestino


Apesar de levar consigo um cheque de US$ 500.000 no bolso, 10 vezes a quantia permitida pela lei, Frank Deng, proprietário de uma fábrica, não teve nenhum inconveniente ao passar pela alfândega chinesa, indo de Shenzhen a Hong Kong, no início deste ano.

Ele recebeu o cheque de um dos chamados bancos clandestinos da província de Guangdong, no sul da China, emitido por uma conta bancária de Hong Kong e denominado em dólares americanos para que pudesse ser descontado depois que ele atravessasse a fronteira.

Para receber o cheque, Deng havia entregado ao “banco”, que opera como parte do sistema bancário informal da China, o equivalente em yuans por meio de sua conta na China. Usando esse dinheiro, somado a outros depósitos feitos em outras viagens, Deng planejava pagar os 50 por cento de entrada em um apartamento avaliado em 10 milhões de dólares de Hong Kong.

Os preços dos imóveis subiram 13,5 por cento em Hong Kong no ano passado e outros 9,5 por cento neste ano e atingiram um recorde.


3. Recrutar ‘smurfs’ para somar suas cotas

Jenny Cai, moradora de Xangai, comprou um apartamento de 1,2 milhão de dólares australianos (US$ 867.000) no centro de Sydney após ver as fotos do imóvel em um evento de marketing em Xangai. Para isso, ela pediu que seu marido e sua filha combinassem suas cotas anuais de US$ 50.000 com a dela para reunir o pagamento da entrada.

Essa prática é chamada de “smurfing” -- em alusão aos pequenos personagens azuis que, coletivamente, compõem um todo. Eles também são conhecidos na China como “formigas que transportam sua casa”, devido aos pequenos grãos de areia transportados individualmente.

O governo começou a restringir as quantias de dinheiro que podem ser movimentadas dessa forma, assim como a frequência com que os bancos podem enviar dinheiro a uma única conta no exterior por meio de diversas fontes.


4. Transportar dinheiro vivo em uma maleta

Os chineses da região continental do país costumam virar notícia ao serem pegos com dinheiro vivo na bagagem ou no corpo: a alfândega de Shenzhen deteve 80 pessoas tentando contrabandear um total de 30 milhões de yuans para Hong Kong nos três primeiros meses deste ano, reportou o jornal Ming Pao.

Em Vancouver e Toronto, os agentes aduaneiros confiscaram US$ 15.019.891 em dinheiro vivo e cheques de 869 chineses entre junho de 2012 e dezembro de 2014, segundo o National Post, do Canadá.

5. Conseguir uma hipoteca no exterior baseada em uma poupança chinesa

Os bancos chineses oferecem às pessoas mais ricas um canal legítimo para destinar dinheiro à aquisição de residências no exterior.

O China Construction Bank Corp., segundo maior banco do país, criou no ano passado um produto que permite que seus clientes de banco privado tomem até 20 milhões de dólares de HK em empréstimos em Hong Kong usando depósitos denominados em yuans e outros ativos da China continental como garantia, segundo uma publicidade. Porta-vozes do China Construction Bank preferiram não comentar a oferta.

6. Fazer uma compra com cartão de crédito ou débito e devolver a mercadoria em troca do dinheiro vivo

Usando um cartão de crédito ou débito UnionPay no exterior, um turista chinês pode “comprar” um produto, como um relógio caro marcado com um preço mais alto, de um comerciante que permita que o item seja devolvido imediatamente.

Em vez de devolver o preço da compra por meio do cartão, a loja reembolsa o cliente em dinheiro, cobrando normalmente uma tarifa de 5 por cento a 10 por cento pelo serviço de devolução em dinheiro.

Usando outro método, o superfaturamento, um dono de empresa na China pode obter dinheiro no exterior aceitando pagar uma margem por um produto vendido fora da China. Após fechar um acordo separado com o vendedor por um preço real, a quantia inflada é transferida legalmente da China para a aquisição e o vendedor devolve a diferença ao comprador em uma conta fora da China.

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