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Mudança de embaixada põe em risco comércio entre Brasil e Oriente Médio

Brasil é de longe o maior exportador global de carne halal, produzida de acordo com os preceitos da religião muçulmana

Bolsonaro: mudança da embaixada do país em Israel pode desencadear uma tempestade diplomática no mundo muçulmano (Andre Coelho/Bloomberg/Getty Images)
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Reuters

Publicado em 9 de novembro de 2018 às 11h47.

São Paulo/Brasília - A proposta do presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro , de mudar a embaixada do país em Israel, seguindo a medida do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode desencadear uma tempestade diplomática no mundo muçulmano, ameaçando um importante mercado para as maiores empresas exportadoras de carne do mundo.

O Brasil é de longe o maior exportador global de carne halal, produzida de acordo com os preceitos da religião muçulmana. O presidente eleito planeja mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, o que poderia fortalecer as relações com Israel, mas que já abalou relações com o Egito e pode em breve provocar problemas com outras nações islâmicas.

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"A reação não partirá apenas de um país, mas de todo o mundo muçulmano", disse uma fonte diplomática turca à Reuters em condição de anonimato. "Esperamos que o Brasil aja com a razão e não confronte o mundo muçulmano."

O Brasil exporta 16 bilhões de dólares anualmente ao Oriente Médio e à Turquia, e apenas 3 por cento disso é dirigido a Israel, de acordo com estatísticas do governo.

Mais de um quarto das exportações brasileiras para a região consistem de carne. Tanto a JBS, a maior produtora mundial de carne bovina, e a BRF, a exportadora número um de carne de frango, apostaram muito na crescente demanda por carne halal.

O Brasil exporta mais de 5 bilhões de dólares de carne halal por ano, mais que o dobro ante seus rivais próximos, a Austrália e a Índia, de acordo com a Salaam Gateway, uma parceria entre o Centro de Desenvolvimento Econômico Islâmico de Dubai e a Thomson Reuters.

A proposta de Bolsonaro para a embaixada de Israel é parte de sua revisão da política externa brasileira, que busca se aproximar de grandes potências, como os Estados Unidos, e desfazer o que ele classifica como alianças baseadas em "viés ideológico" de seus antecessores de esquerda.

A decisão de Trump de abrir a embaixada em Jerusalém em maio se provou uma cutucada em um vespeiro no Oriente Médio, e viu alguns aliados seguirem o exemplo. A Guatemala fez o mesmo nos dias seguintes e o Paraguai reverteu uma decisão similar desde então.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, elogiou Bolsonaro pelo plano de mudar a embaixada brasileira, classificando-o como um "amigo".

Mas depois de o Egito ter abruptamente cancelado uma visita de diplomatas e empresários brasileiros nesta semana, Bolsonaro disse que sua decisão sobre a embaixada brasileira em Israel ainda não era definitiva.

Bolsonaro já mostrou que não teme provocar importantes parceiros comerciais, seguindo o exemplo do presidente dos Estados Unidos, a quem ele admira e imita abertamente, tanto no estilo político, quanto na política externa.

Como Trump, Bolsonaro criticou a China em sua campanha presidencial. Entretanto, ele abrandou seu tom desde a eleição no final do mês passado, após o lobby de diplomatas e empresários que querem proteger as relações com o principal parceiro comercial do Brasil.

Viagem cancelada

A pressão do Oriente Médio pode ser mais agressiva.

Na segunda-feira, o Egito cancelou a planejada visita do ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes, e de empresários, o que, segundo fontes diplomáticas, foi uma reposta direta à proposta de Bolsonaro de mudar a embaixada.

A embaixada egípcia justificou o caso como um conflito de agendas.

O incidente soou alarmes na indústria brasileira de carnes.

O presidente da BRF, Pedro Parente, disse na quinta-feira que a questão da embaixada de Israel era "causa para preocupação".

"Temos um comércio muito importante com os mercados árabes e halal", disse Parente a jornalistas. Ele, contudo, comentou estar confiante de que a melhor decisão será tomada quando os ministérios da Agricultura, Comércio Exterior e de Relações Exteriores forem envolvidos.

O segmento de halal da BRF contribuiu com um quarto de sua receita operacional líquida e quase metade de seu lucro operacional no terceiro trimestre deste ano.

O frango halal representou quase metade das exportações totais de carne de frango do Brasil no ano passado, que somaram 7,1 bilhões de dólares, de acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).

"Há um comércio de 2 bilhões de dólares entre o Egito e o Brasil, principalmente no setor alimentício e de agropecuária, e, neste setor, principalmente nos segmentos bovino e de aves", disse o embaixador egípcio no Brasil, Alaa Roushdy, à Reuters.

Ele se negou a comentar a aventada mudança da embaixada ou se ela poderia ter algum impacto no comércio.

A BRF tem unidades de processamento na Turquia e nos Emirados Árabes Unidos para atender a crescente demanda por carne halal. A empresa tem como objetivo dobrar sua produção de produtos processados no Golfo Pérsico até 2023, afirmou seu diretor de operações Halal em um evento em outubro.

A JBS enviou mais de um oitavo de suas exportações para o Oriente Médio e para a África em 2017, ficando atrás apenas da região da China.

Representantes da JBS se negaram a comentar as consequências de uma potencial mudança de embaixada.

A Câmara de Comércio Árabe-Brasileira espera que as exportações totais do Brasil para um grupo de 22 países, que exclui nações muçulmanas não árabes, como o Irã, aumentem para 20 bilhões de dólares até 2022, de 13,5 bilhões em 2017.

Rubens Hannun, presidente da Câmara, acrescentou que o Brasil também pode se beneficiar de investimentos em infraestrutura de fundos soberanos árabes. O Mubadala Development, dos Emirados Árabes, por exemplo, investiu 2 bilhões de dólares no império brasileiro de commodities EBX nesta década.

"Não queremos ruídos nessa relação", disse Hannun. "Tememos que isso abra as portas para a competição."

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