Economia

De que lado: suprimento, demanda ou inovação?

NOVA YORK – É impossível negar a existência da assim chamada estagnação secular que assola as economias mais desenvolvidas do mundo: a riqueza aumenta, enquanto salários reais sobem muito pouco e a participação da força de trabalho declina. Pior ainda, quem faz as políticas não tem ideia do que pode ser feito a respeito. Por […]

RONALD REAGAN E MARGARET THATCHER: para eles, a estagnação paralisou as economias nos anos 70; hoje cortes do tamanho dos que foram realizados na época acabariam em aumentos nos déficits fiscais / Ron Galella / Getty Images

RONALD REAGAN E MARGARET THATCHER: para eles, a estagnação paralisou as economias nos anos 70; hoje cortes do tamanho dos que foram realizados na época acabariam em aumentos nos déficits fiscais / Ron Galella / Getty Images

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Da Redação

Publicado em 7 de junho de 2016 às 10h35.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h39.

NOVA YORK – É impossível negar a existência da assim chamada estagnação secular que assola as economias mais desenvolvidas do mundo: a riqueza aumenta, enquanto salários reais sobem muito pouco e a participação da força de trabalho declina. Pior ainda, quem faz as políticas não tem ideia do que pode ser feito a respeito.

Por trás da estagnação está a desaceleração do crescimento da produtividade desde 1970. A fonte do aumento na produtividade – o autodesenvolvimento – está parada desde o fim da década de 60 (principalmente em indústrias já estabelecidas) e muito mais ainda até 2005.

Ronald Reagan e Margaret Thatcher vislumbraram que a estagnação estava paralisando as economias nos anos 70, do lado do suprimento. Forçaram cortes nos impostos sobre lucros e salários para impulsionar o investimento e crescimento, com resultados controversos.

Porém, hoje, com impostos muito mais baixos, cortes daquele tamanho resultariam em grandes aumentos nos déficits fiscais. E com os níveis da dívida já altos, além de grandes déficits à frente, essas medidas do lado do suprimento seriam, no mínimo, imprudentes.

Portanto, agora a melhor e mais lúcida maneira de enxergar as coisas do ponto de vista da demanda, seria utilizar a teoria construída por John Maynard Keynes em 1936. Quando “demanda agregada” – o nível real de gastos com produtos nacionais finais que famílias, empresas, governo e compradores estrangeiros estão dispostos a fazer – fica aquém da produção a pleno emprego, a produção fica limitada à demanda. E a inovação não acontece.

Mas o conceito de economia por parte dos adeptos da demanda é estranho. Para eles, a demanda do investimento privado é autônoma, governada por forças que Keynes apelidou de “espírito animal”. A demanda do consumidor é essencialmente autônoma também, porque a conhecida parte induzida é atrelada ao investimento autônomo através da “propensão ao consumo”. Assim, as medidas governamentais são a única maneira de estimular o emprego e o crescimento quando a demanda autônoma diminui e o emprego desaparece.

Esse conceito não abrange nem crescimento nem recuperação. Em economias saudáveis um choque contracionário de demanda causa dois tipos de reações estimulando a recuperação.

As adaptações para oportunidades emergentes são uma das duas reações. Sempre que as empresas são atingidas por operações de contração na demanda, o espaço desocupado fica disponível para uso de empreendedores com melhores condições de conduzir os negócios – ou que têm negócios melhores. Alguns funcionários demitidos irão começar seus próprios negócios (e empregar pessoas). Com cada recessão, muitas lojas do ‘comércio tradicional’ desaparecem; e, com o tempo, novas lojas – geralmente melhor sucedidas – surgem.

A outra resposta é o autodesenvolvimento, ou seja, novas ideias que brotam das cabeças de vários empreendedores. Sempre que empresas são atingidas pela fraca demanda, elas param de contratar por algum tempo. Pessoas contratadas por empresas sólidas aproveitam a situação para idealizar novos produtos ou métodos, e organizar startups para desenvolvê-los.

O crescente número de aspirantes a inovadores que trabalham nas garagens de suas casas podem produzir sozinhos seus produtos. Mais importante, a acumulação de novas iniciativas irá gradualmente gerar aumento da demanda de investimento – demanda induzida! E crescimento, também.

Alguns duvidam disso. Será que novos produtos e métodos serão bem-sucedidos no mercado se a demanda for insuficiente? Como um inovador me disse em meio a uma crise financeira, seu objetivo era de ocupar o mercado – não importava muito se o mercado almejado fosse apenas 90% do seu tamanho anterior.

É possível levantar capital quando os ganhos estão contidos? Pequenas empresas e startups sempre precisam lutar para obter crédito e a Grande Recessão, que veio depois da crise financeira de 2008, tornou ainda mais difíceis as coisas para elas. Contudo, a recessão não impediu esses milhares de empresas de buscar financiamento no Vale do Silício, em Londres e em Berlim. Não é surpresa que a Alemanha, os Estados Unidos e o Reino Unido já tenham se recuperado parcialmente. Nos Estados Unidos, o crescimento da produtividade bateu recordes nos anos 30, quando a economia caiu e então saiu da Grande Depressão.

A recuperação, lamentavelmente, diminuiu em dois tipos de economias. Na França e na Itália faltam jovens com ímpeto empreendedor ou inovador, e os poucos que existem acabam aprisionados pelas corporações e pelos grandes interesses. Na Grécia, não há falta de potenciais empreendedores e inovadores, mas o país não tem um sistema de investidores anjos ou de capital de risco. Alguns empreendedores gregos já formaram suas startups, mas não na Grécia.

Os teóricos da demanda dizem que a inovação apenas torna a recuperação mais difícil, pois precisa atender à demanda existente com menos funcionários. Assim, eles exigem do setor público investimentos até o nível necessário para o emprego pleno. Mas esse investimento em infraestrutura vai muito além do que jamais foi realizado, caso permitissem a economia recobrar o alto nível de emprego por meio do funcionamento de atividades adaptativas ou inovadoras. Na verdade, esse investimento é muito dispendioso porque não leva em conta a adaptação e a inovação que poderiam elevar os níveis do emprego e do rápido crescimento.

Além disso, uma vez que a inovação no ocidente ainda está muito confinada, o comprometimento por parte da demanda em um grande e sustentado fluxo de investimento em infraestrutura – e, da mesma forma, o compromisso por parte da oferta com um fluxo semelhante de investimento privado – devem trazer retornos cada vez menores, até que, inevitavelmente, a economia atinja um estado quase paralisado.

Fornecer mais dos mesmos antigos produtos nunca irá “criar sua própria demanda”, como pensava Keynes. Mas oferecer novos produtos, sim. São os empecilhos à adaptação e à inovação – não austeridade fiscal – os causadores da estagnação. E somente o dinamismo renovado – e não mais irresponsabilidade fiscal – pode oferecer esperança de uma saída duradoura.

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