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Com Guedes no governo, Brasil é berço do renascer dos Chicago boys

Arquitetos das políticas econômicas de Pinochet,os "'Chicago Boys" vivem um ressurgimento pelas mãos do novo governo do Brasil

Guedes: essas políticas ressurgiram após a chegada ao poder de Jair Bolsonaro e a nomeação de Paulo Guedes (Valter Campanato/Agência Brasil)
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AFP

Publicado em 21 de fevereiro de 2019 às 06h00.

Última atualização em 21 de fevereiro de 2019 às 08h10.

Eles foram os arquitetos das políticas econômicas implementadas no Chile pela ditadura de Augusto Pinochet. Os "'Chicago Boys" vivem um ressurgimento pelas mãos do novo governo do Brasil, que vê na doutrina neoliberal a salvação para sua economia asfixiada.

Dois anos após o golpe de Estado que derrubou o socialista Salvador Allende (1970-1973) após uma primeira tentativa de estabilizar a economia, finda a fracassada experiência marxista, economistas pós-graduados da Universidade de Chicago persuadiram Pinochet — um militar estatista — a aplicar suas "políticas de choque".

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Em resposta a uma queda do PIB que em 1975 atingiu 12,9%, os discípulos do ultraliberal Milton Friedman aplicaram um 'programa de recuperação', que privatizou 400 empresas, reduziu o sistema público e liberalizou quase totalmente a economia.

Em uma segunda etapa, as áreas da saúde, educação e previdência foram privatizadas.

Naqueles mesmos anos, a ditadura conduziu um feroz extermínio de opositores, que resultou em 3.200 mortes e desaparecimentos.

Sem sindicatos, parlamento ou imprensa de oposição, os "Chicago boys" conseguiram aplicar no Chile um modelo liberal que jamais havia sido implementado em outro país.

"São reformas inimagináveis em um contexto democrático pela profundidade que teve", declarou à AFP o jornalista Manuel Delano, um dos autores do livro 'A Herança dos Chicago Boys', de 1989.

"A probabilidade de realizarem no Chile, em 1973 e na democracia, reformas tão profundas quanto as feitas durante o regime militar, seria extremamente baixa. Mas hoje isso mudou", diz o economista de Chicago Rolf Lüders, ex-ministro da Economia da ditadura (1982-1893) e um dos pais das reformas chilenas.

"A queda do Muro de Berlim e a experiência positiva de muitos países, especialmente na Ásia, mas também na Europa, África e América Latina, incluindo o Chile, tornaram perfeitamente possível a existência de episódios econômicos liberalizantes na democracia", acrescenta este 'Chicago boy'.

Milagre econômico

Relegadas por décadas, essas políticas ressurgiram após a chegada ao poder de Jair Bolsonaro e a nomeação de Paulo Guedes como ministro da Economia, ele mesmo formado em Chicago e com uma passagem pelo Chile na década de 1980.

Guedes anunciou que vai impulsionar um grande plano de privatização, reduzirá o tamanho do Estado -para aliviar a dívida pública - e aumentará a abertura comercial da maior economia do continente para replicar o que ele considera o "milagre econômico chileno".

Seu primeiro grande teste começou nesta quarta-feira, com a apresentação de uma reforma do sistema previdenciário.

"O Brasil tem 30 anos de expansão descontrolada de gastos públicos (...), este modelo corrompeu a política, fez subir os impostos, juros e fez a dívida crescer como uma bola de neve", declarou Guedes após a vitória de Bolsonaro em outubro.

Mas as reformas da ditadura chilena e sua influência sobre a economia do país - que registra uma das mais altas rendas per capita, mas com enorme desigualdade - ainda estão em discussão.

"O mito do sucesso é baseado, em grande parte, em considerar as recuperações ignorando as quedas", diz o economista Ricardo Ffrench-Davis, que estudou em Chicago na mesma época que os pais das reformas chilenas mas que é um crítico delas.

"O dinamismo das exportações, alguma ordem fiscal e recuperação da atividade econômica foram acompanhadas por importações excessivas, desindustrialização, duas recessões graves (1975 e 1982), baixo investimento produtivo e alto investimento especulativo, deterioração da educação edo investimento público em saúde, desemprego e aumento da desigualdade", explica.

Em média, a ditadura experimentou um crescimento anual de 2,9%, com drásticas quedas em 1975 (-12,9%) e 1,982 (-14,1%), e picos de expansão entre 1977 e 1981. Ao fim do regime, a pobreza chegava a 40% e a inflação a 18%, embora o PIB per capita em relação ao dos Estados Unidos tivesse se ampliado para 33% (de 17% em 1981).

Se considerarmos apenas o crescimento do PIB per capita chileno, os dados "não são particularmente notáveis", aponta Luders, que ressalta que "julgar assim os resultados das reformas sócio-econômicas chilenas é um grave erro, uma vez que não considera o contexto interno nem o ambiente internacional", nem tampouco que começaram após uma grave crise.

"Se você der a um paciente um remédio e o remédio tiver que agir em 15 dias e você medir em cinco, (o resultado inicial) será ruim, e depois bom", exemplifica.

Na democracia, sustenta Delano, o crescimento mais que dobrou o da ditadura, a inflação reduziu e a pobreza caiu (de 40% para 8,6%). "O 'milagre econômico' no Chile, se houve, ocorreu em uma democracia, não em uma ditadura", afirma.

O Brasil pode replicar as reformas chilenas

"O Brasil não deve replicar o modelo sócio-econômico e político chileno, mas aplicar à sua realidade os princípios que guiaram a institucionalização econômico-social chilena a partir de 1973. Esses princípios são universais, não as políticas públicas específicas, que dependem das características do país e da situação internacional", diz Lüders.

Para Ffrench-Davis, a tentativa brasileira "é preocupante por seus efeitos nas conquistas alcançadas pelo povo brasileiro para melhorar sua qualidade de vida e direitos".

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