Maria Silvia: "A questão fiscal é a primeira, segunda e terceira maiores urgências no Brasil hoje" (Tomaz Silva/Agência Brasil)
Reuters
Publicado em 23 de novembro de 2016 às 20h07.
Rio de Janeiro - O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) planeja repagar até 100 bilhões de reais em empréstimos devidos ao governo federal usando um mix de caixa e títulos, disse a presidente-executiva, Maria Silvia Bastos Marques, em um esforço para tentar aliviar o rápido crescimento da dívida pública.
Nenhuma participação detida pelo banco por meio do BNDESPar será usado para o reembolso, disse Maria Silvia em entrevista na terça-feira na sede do banco, no Rio de Janeiro.
O reembolso tem sido amplamente discutido entre autoridades do governo, que correm para conter um déficit orçamentário que pode bater um recorde pelo segundo ano.
Maria Silvia concorda com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de que o pagamento deve ser usado para cortar a dívida, e não para ajudar os Estados em dificuldades, como proposto por outros ministros.
"A questão fiscal é a primeira, segunda e terceira maiores urgências no Brasil hoje", disse ela. "Vamos tentar ajudar em benefícios de todos para recuperar a credibilidade e toda economia brasileira."
O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu nesta quarta-feira que o reembolso adiantado é legal. [nL1N1DO14N] Em termos de reembolso acordado com o Tesouro, o BNDES pagará cerca de 40 bilhões de reais no próximo ano e outros 30 bilhões de reais cada em 2018 e 2019.
A presidente do BNDES deixou a porta aberta para agilizar a devolução ou elevar o valor da primeira tranche se o governo federal aceitar aliviar o pagamento do dividendo do banco para o Tesouro.
"Faríamos, mas nunca colocando em risco o BNDES", afirmou ela. O BNDES distribuiu 100 por cento dos lucros nos últimos anos em dividendos para o governo federal.
Desde sua nomeação em maio, a executiva tem liderado uma inversão nas políticas do BNDES, após anos de concessão de recursos em condições privilegiadas a grandes grupos.
Maria Silvia está impondo condições mais rígidas para os desembolsos, pedindo aos membros do conselho do banco para ampliarem as análises e defenderem maior transparência corporativa.
"A imagem do banco foi muito afetada nos últimos dois anos pela discussão com o Tribunal de Contas, pela questão dos campeões nacionais...Isso não se resolve de um dia para o outro, é um processo de reconstrução de imagem que você vai dando os passos, estamos progredindo", disse ela.
Como parte desse impulso, Maria Silvia reafirmou que o BNDES desembolsará empréstimos atrelados a taxas de juros abaixo do mercado principalmente para projetos de investimento que tenham "impacto social significativo", como projetos de saneamento.
Até que os detalhes da nova política de desembolso sejam anunciados no próximo mês, a executiva quer que as empresas com condições de buscar crédito por outros meios tenham menos crédito subsidiado.
Entre 2009 e 2013, o BNDES desembolsou anualmente três vezes mais que o Banco Mundial. Mas o fim de um boom de commodities e os gastos governamentais desenfreados ajudaram a levar o Brasil em uma recessão que já dura dois anos.
A executiva também quer repensar os requisitos de conteúdo local para aprovações de empréstimos, para os quais novas diretrizes foram anunciadas em junho.
Ela quer que o Congresso cancele o sigilo sobre empréstimos subsidiados a empresas para aumentar a transparência.
Como parte da redefinição do papel do BNDES, a Maria Silvia está perto de uma solução para o aumento dos atrasos no pagamento de outorgas de aeroportos concedidos à iniciativa privada.
O BNDES estaria disposto a discutir um pedido dos operadores do aeroporto internacional do Rio de Janeiro para facilitar o pagamento de licenças ao longo do tempo.
As operadoras do terminal - Odebrecht e Changi Airport, de Cingapura - pagariam parcelas menores nos primeiros anos, aumentando gradativamente à medida que o fim da concessão de 25 anos se aproxima.
O acordo depende da aval regulatório, disse ela.
A executiva também está mudando radicalmente as políticas da BNDESPar, que tem participações ou dívidas de 116 empresas e representantes nos conselhos de administração de 45 delas.
"O BNDES será mais vocal, mais ativo nos conselhos das companhias", afirmou Maria Silvia.
Um primeiro sinal dessa mudança de postura foi o veto do BNDES à reorganização global da JBS no mês passado.
A presidente do BNDES disse que o banco e a BNDESPar precisam analisar melhor como sair de algumas de participações, o que ela acredita que às vezes estão sendo mantidas por muito tempo.
"Somos um investidor paciente, mas não eterno. Paciência tem limite", disse Maria Silvia.