A hora de refazer as contas
Especialistas questionam a eficácia da elevação de juros pelo BC
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h27.
O mercado financeiro parou após a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar os juros básicos de 18% para 21% ao ano, o maior valor desde junho de 1999. Os operadores e analistas dedicam-se agora a refazer as contas e a traçar novas estratégias para chegar até a data da próxima reunião - daqui a apenas uma semana.
O impacto da elevação dos juros não está se refletindo imediatamente nos preços por duas razões. A primeira é técnica: as taxas negociadas na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) têm limites de variação diários.
Essas travas protegem investidores e bancos que têm grandes posições apostando na alta ou na baixa dos juros, e são surpreendidos por reversões inesperadas do mercado. Em momentos de crise, as taxas não podem subir ou cair demais.
Foi exatamente isso o que aconteceu: os contratos mais curtos, com vencimento em janeiro de 2003, atingiram 23,68% ao ano, seu limite máximo de alta. Novos negócios só a taxas menores - que ninguém quer - ou amanhã. Os contratos mais longos mostram que o mercado ainda está com dificuldade para estabelecer os preços. Os contratos de abril de 2003 são negociados com um amplo spread de 26% para quem compra e 26,6% para quem vende.
A segunda razão é estratégica. De um modo geral, a decisão repercutiu muito mal no mercado. Não pelo fato de o BC ter usado sua principal prerrogativa, que é a de alterar os juros para conter movimentos de mercado. O que não agradou foi o momento. O comentário de um administrador de fundos resumiu tudo: "O BC quis dizer com isso que a situação está tão ruim que não é possível esperar a próxima reunião ordinária, marcada para a semana que vem?"
Para os especialistas, a eficácia dessa medida é questionável. O aumento dos juros dificilmente vai conter o principal motor da inflação, que é a alta dos preços do dólar. A moeda americana, aliás, era negociada a 3,90 reais logo após a decisão, apenas um centavo abaixo do nível máximo do dia. Não é possível prever um forte ingresso de dólares em busca de juros mais elevados. No mercado de ações, a Bolsa de Valores de São Paulo estava caindo aos níveis mínimos do dia, para 8.500 pontos, baixa de 3,77%.
Para o presidente eleito da CNI (Confederação Nacional da Indústria), deputado Armando Monteiro Neto (PMDB-PE), "o aumento das taxas de juros é, sem dúvida, uma medida drástica". "A atividade produtiva será novamente penalizada, com aumento do custo de financiamento às empresas e retração da demanda. Esperamos que a alta seja temporária, por prazo muito curto, como recurso para conter os movimentos especulativos", disse ele em comunicado oficial. "Atuar sobre as expectativas dos agentes econômicos é uma missão do governo atual e também dos candidatos à Presidência da República."
Histórico
A decisão do Copom elevou a taxa de juros do país para o mais alto nível desde julho de 1999, quando a Selic estava em 21%. Foi a primeira vez, no mandato do atual presidente do BC, Armínio Fraga, que uma reunião extraordinária do Copom foi convocada.
Segundo comunicado do BC, a decisão foi unânime e a justificativa foram os recentes aumentos de preços e a piora da expectativa de inflação - ambos decorrentes principalmente da desvalorização do real em relação ao dólar.
Os únicos encontros extraordinários do BC aconteceram em setembro de 1998 e outubro de 1997, durante as crises russa e asiática, respectivamente. Em março de 1999 aconteceu a última elevação, de 25% para 45%. Em junho do mesmo ano, esse valor já havia caído para 21%.
A ação do BC sobre a taxa de juros veio depois que as medidas tomadas pelo banco para conter a alta do dólar na semana passada não tiveram efeito no mercado de câmbio durante a manhã de hoje. Na sexta-feira (11/10), após o anúncio das medidas, o dólar abandonou a trajetória de alta e caiu mais de 4%.
O BC aumentou o compulsório sobre depósitos a vista, a prazo e sobre a poupança, além de impor novos limites para a exposição de bancos ao câmbio. Estas medidas reduzem consideravelmente a liquidez do sistema financeiro, forçando um ajuste das posições dos bancos. A reunião emergencial do Copom foi convocada nesta manhã, quando o dólar estava em alta de mais de 2%.