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Vacina brasileira contra a covid-19 tem sucesso em teste pré-clínico

A próxima etapa, de acordo com os pesquisadores, é verificar se a via de imunização intranasal será eficiente; testes foram feitos em camundongos

Vacina: UFPR desenvolveu vacina que obteve sucesso em testes pré-clínicos (Marcos Solivan/Sucom-UFPR/Divulgação)

Tamires Vitorio

Publicado em 24 de setembro de 2020 às 11h27.

Última atualização em 26 de setembro de 2020 às 12h50.

Uma vacina contra o novo coronavírus desenvolvida pelo Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da Universidade Federal do Paraná (UFPR) apresentou bons resultados em testes pré-clínicos com camundongos. Os resultados mostraram que a eficácia é mais garantida quando a proteção é administrada em duas doses.

Segundo comunicado enviado à imprensa, os testes foram divididos em três grupos. O primeiro recebeu a imunização com partículas do polímero bacteriano polihidroxibutirato (PHB) recobertas com partes específicas da espícula do vírus (capaz de infectar as células humanas), o segundo grupo recebeu uma versão nas quais a proteína viral foram misturadas ao Adjuvante de Freund, uma solução de antígeno usado como um imunopotenciador e o último grupo, de controle, recebeu apenas o polímero bacteriano polihidroxibutirato (PHB). A segunda dose de todas as vacinas foi administrada depois de 20 dias.

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O que os cientistas observaram é que, após a primeira dose, a imunização contra a covid-19 não foi o suficiente para produzir anticorpos em quantidade "significativamente diferente em relação ao grupo controle". Após a segunda dose, no entanto, os anticorpos foram produzidos em quantidade significativa.

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A principal diferença da vacina, segundo a universidade, é que ela utiliza nanopartículas que imitam os antígenos do vírus em vez de vírus inoculado. Mas o que isso significa? Os cientistas explicam que os antígenos podem ser alterados para outras doenças, o que é um grande benefício. Também não existe partícula viral na fabricação dela, o que tende a deixar a proteção mais segura.

As partículas são produzidas por bactérias, com um polímero que já é usado em algumas aplicações humanas. Para os cientistas, a vantagem é que ele próprio não ativa uma resposta imune, então serve apenas como um veículo para que o antígeno seja reconhecido.

Os cientistas também afirmam que, com a adição do Adjuvante de Freund (solução de antígeno emulsionado em óleo mineral e usado como um imunopotenciado) não causou um efeito "prometor na resposta imune contra as partículas PHB carregadas" e que o grupo de animais que foram testados com as partículas e o adjuvante apresentaram 37 vezes mais anticorpos do que o grupo de controle --- mesmo assim, valor foi mais baixo do que o do grupo imunizado sem o adjuvante.

A próxima etapa, de acordo com os pesquisadores, é verificar se a via de imunização intranasal será eficiente. "Queremos fazer esse teste porque a versão intranasal é mais aceitável por uma parte da população por não ter agulha e pode ter uma eficiência superior à subcutânea", explica Marcelo Müller dos Santos, professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFPR e coordenador do estudo.

Para ele, a importância de desenvolver uma vacina no Brasil é "ter tecnologias nacionais e capacitar recursos humanos nessa área". "Temos nessa equipe diversos estudantes, jovens pesquisadores, pós-doutores, e essa é uma oportunidade para que eles ganhem experiência na área e quem sabe criar um próprio negócio e empreender em uma área que o Brasil ainda tem uma escassez, a de biotecnologia", afirma Santos.

O professor também explica que novas vacinas serão necessárias em novas pandemias e que a tecnologia utilizada contra a covid-19 pode servir também para outras doenças existentes no Brasil.

Os testes em humanos, segundo Santos, também acontecerão a longo prazo. "Os resultados pré-clínicos avançaram rápido, então talvez conseguimaos no segundo semestre do ano que vem ter testes clínicos com esse imunizante", explica. "Se concluirmos os testes pré-clínicos com sucesso, pediremos uma aprovação da Anvisa e já seria um enorme avanço para a ciência testar essa tecnologia em humanos. O objetivo maior é termos ainda mais uma forma de produzir vacinas", finaliza.

Eficácia da vacina nasal

Uma pesquisa recentefeita por cientistas da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, com ratos, mostrou que a vacina contra o novo coronavírus administrada de forma nasal pode induzir uma resposta imune do corpo contra a doença. Ainda sem revisão pelos pares, o estudo mostra que esse tipo de vacina pode ser até mais eficaz do que a opção injetável com os mesmos componentes.

O resultado observado por eles ao expor os animais ao SARS-CoV-2 após uma vacinação injetável foi de que eles não demonstraram nenhum sinal de infecção em seus pulmões, embora tivessem uma pequena quantidade do RNA viral nos órgãos. Já os animais que receberam a versão nasal da vacina não tiveram sequer uma quantidade de RNA viral em seus pulmões — o que, para os autores, mostra que a proteção administrada no nariz dos indivíduos pode ser até mais efetiva do que a comum.

Outra pesquisa feita na China também desenvolveu uma vacina com a espícula do vírus. Nesse caso, tanto a versão injetável quanto a versão nasal foram capazes de proteger os macacos-rhesus de infecções pelo novo coronavírus. Para Ling Chen, um dos autores do estudo,  e seus companheiros, uma vacina dada pelo nariz pode permitir que as pessoas vacinem a si próprias.

Os testes feitos em animais são preliminares e mostram bons resultados de uma vacina nasal contra a covid-19.

No Brasil a Universidade de São Paulo (USP) está desenvolvendo uma vacina por spray nasal contra o vírus. De acordo com a universidade, o modelo de imunização já foi testado – com resultados positivos – em camundongos contra a hepatite B.

Quão eficaz uma vacina precisa ser?

Segundo uma pesquisa publicada no jornal científico American Journal of Preventive Medicine uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia. Para evitar que outras aconteçam, a prevenção precisa ser 70% eficaz.

Uma vacina com uma taxa de eficácia menor, de 60% a 80% pode, inclusive, reduzir a necessidade por outras medidas para evitar a transmissão do vírus, como o distanciamento social. Mas não é tão simples assim.

Isso porque a eficácia de uma vacina é diretamente proporcional a quantidade de pessoas que a tomam, ou seja, se 75% da população for vacinada, a proteção precisa ser 70% capaz de prevenir uma infecção para evitar futuras pandemias e 80% eficaz para acabar com o surto de uma doença.

As perspectivas mudam se apenas 60% das pessoas receberem a vacinação, e a eficácia precisa ser de 100% para conseguir acabar com uma pandemia que já estiver acontecendo — como a da covid-19.

Isso indica que a vida pode não voltar ao “normal” assim que, finalmente, uma vacina passar por todas as fases de testes clínicos e for aprovada e pode demorar até que 75% da população mundial esteja vacinada.

Os tipos de vacina disponíveis

Alguns tipos de vacinas têm sido testados para a luta contra o vírus. Uma delas é a de vírus inativado, que consiste em uma fabricação menos forte em termos de resposta imunológica, uma vez que nosso sistema imune responde melhor ao vírus ativo.

Por isso, vacinas do tipo tem um tempo de duração um pouco menor do que o restante e, geralmente, uma pessoa que recebe essa proteção precisa de outras doses para se tornar realmente imune às doenças. É o caso da Vacina Tríplice (DPT), contra difteria, coqueluche e tétano. A vacina da Sinovac, por exemplo, segue esse padrão.

Outro tipo de vacina é a de Oxford, feita com base em adenovírus de chimpanzés (grupo de vírus que causam problemas respiratórios), e contendo espículas do novo coronavírus.

As outras vacinas em fases clínicas já avançadas também são baseadas em espículas, mas apresentadas em forma de RNA mensageiro, como as da Pfizer e da Moderna.

Como estão as 9 potenciais?

Sinovac Biotech: a vacina chinesa que começou os testes em fase 3 no Brasil na última segunda-feira, 20, pretende fabricar até 100 milhões de doses anuais. Por aqui, 9 mil profissionais da área da saúde receberão a vacina.

Sinopharm (Wuhan e Pequim): a vacina com base em vírus inativado, que se mostrou capaz de produzir resposta imune ao vírus, começou as fases 3 de testes neste mês nos Emirados Árabes Unidos. Cerca de 15 mil voluntários participaram do período de testes e a empresa chinesa acredita que a opção estará disponível para o público já no final do ano.

Oxford e AstraZeneca: os resultados preliminares das fases 1 e 2 da vacina com mais de mil pessoas mostraram que ela foi capaz de induzir uma resposta imune à doença. As fases dois (que ainda está ocorrendo no Reino Unido) e três de testes (acontecendo no Reino Unido, Brasil e África do Sul) devem garantir a eficácia completa dela. A opção é tida como a mais promissora pela OMS.

Moderna: a empresa americana iniciou última fase de testes de sua vacina baseada no RNA mensageiro no dia 27 de julho. O teste vai incluir 30 mil pessoas nos Estados Unidos e o governo investiu pesado: cerca de 1 bilhão de dólares para apoiar a pesquisa. A expectativa da empresa é produzir 500 milhões de doses por ano.

Pfizer e BioNTech: a vacina agora também está na fase três de testes e também usa o RNA mensageiro, que tem como objetivo produzir as proteínas antivirais no corpo do indivíduo. A expectativa é testar a vacina em aproximadamente 30.000 voluntários com idades entre 18 e 85 anos no mundo. Desse total, 1.000 serão testados no Brasil. Se tudo der certo, a expectativa é que a eficácia da vacina seja comprovada até o outubro. A empresa espera produzir até 100 milhões de doses até o fim do ano. Outras 1,3 bilhão de doses podem ser fabricadas no ano que vem.

Instituto Gamaleya: em 11 de agosto a Rússia registrou a primeira vacina do mundo contra a covid-19. A vacina russa é baseada no adenovírus humano fundido com a espícula de proteína em formato de coroa que dá nome ao coronavírus e é por meio dessa espícula de proteína que o vírus se prende às células humanas e injeta seu material genético para se replicar até causar a apoptose, a morte celular, e, então, partir para a próxima vítima. Na última segunda-feira, 31, o país anunciou que o primeiro lote de sua vacina, a “Sputnik V”, estará disponível já neste mês.

Pesquisa aponta que uma vacina precisa ter 80% de eficácia para colocar um ponto final à pandemia

CanSino: a vacina chinesa usa um vírus inofensivo do resfriado conhecido como adenovírus de tipo 5 (Ad5) para transportar material genético do coronavírus para o corpo e, segundo a companhia, conseguiu induzir uma resposta imune nos indivíduos que foram testados. No começo de agosto, a China concedeu a primeira patente da vacina.

Janssen Pharmaceutical Companies: a vacina, em parceria com a gigante Johnson & Johnson conseguiu induzir imunidade robusta em testes pré-clínicos. A tecnologia usada para a produção dela é a mesma utilizada no desenvolvimento da vacina do Ebola, que inclui o uso do vírus inativado da gripe comum, incapaz de ser replicado.

Quais são as fases de uma vacina?

Para uma vacina ou medicação ser aprovada e distribuída, ela precisa passar por três fases de testes. A fase 1 é a inicial, quando as empresas tentam comprovar a segurança de seus medicamentos em seres humanos; a segunda é a fase que tenta estabelecer que a vacina ou o remédio produz, sim, imunidade contra um vírus, já a fase 3 é a última fase do estudo e tenta demonstrar a eficácia da droga.

Uma vacina é finalmente disponibilizada para a população quando essa fase é finalizada e a proteção recebe um registro sanitário. Por fim, na fase 4, a vacina ou o remédio é disponibilizado para a população.

Com isso, as medidas de proteção, como o uso de máscaras, e o distanciamento social ainda precisam ser mantidas. A verdadeira comemoração sobre a criação de uma vacina deve ficar para o futuro, quando soubermos que a imunidade protetora realmente é desenvolvida após a aplicação de uma vacina. Até o momento, nenhuma situação do tipo aconteceu.

 

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