O futuro incerto da maior barreira de corais do mundo
Estresses climáticos crescentes ameaçam sobrevivência de um dos habitats mais preciosos da Terra, a Grande Barreira de Corais Australiana
Vanessa Barbosa
Publicado em 4 de abril de 2019 às 16h06.
São Paulo - Os ecossistemas da Terra são um exemplo de resiliência. Diante de pertubações, eles são capazes de se recuperar e voltar ao seu estado de equilíbrio. Mas essa capacidade é mais ou menos limitada, depende tanto das características ambientais quanto do grau da destruição, e, principalmente, exige tempo para recuperação. Choques recorrentes desestabilizam esse poder restaurativo da natureza, aumentando o risco de colapso ecológico generalizado.
É justamente isso o que está ocorrendo no maior sistema de corais do mundo — a Grande Barreira de Corais Australiana.Considerada uma espécie de "highlander" do mundo natural por sua alta resiliência frente a alterações drásticas nos oceanos( já passou cinco vezes por experiências quase-morte nos últimos 30 mil anos), a Barreira dá sinais de exaustão.
O alerta vem de um novo estudo divulgado na revista Nature por pesquisadores do Centro de Excelência para Estudos de Recifes de Coral da Austrália. A constatação? O declínio atual dos corais, provocado pelo aumento das temperaturas globais ,simplesmente não dá trégua, o que impede a plena recuperação deste habitat considerado patrimônio mundial da humanidade pela Unesco.
Desde 1998, a Grande Barreira de Corais passou por quatro branqueamentos em massa, fenômeno que ocorre quando as condições ambientais se tornam anormais elevam os corais a “expelir” as pequenas algas fotossintéticas, chamadas “zooxantelas”, que vivem sobre sua superfície e lhe dão a cor característica.
Os dois piores foram entre 2016 e 2017, quando oaquecimento das águas acima do normal provocou um branqueamento quematou mais de um terço das partes central e norte da barreira.
Não só muitos dos corais adultos morreram, mas pela primeira vez, os pesquisadores observaram um declínio significativo em novos corais se instalando no recife, comprometendo a capacidade de recuperação do ecossistema.
Eles concluíram que os episódios repetidos de branqueamento afetaram a capacidade de recuperação dos estoques de corais reprodutores adultos, o que, por tabela, prejudicou a produção de novos corais— oassentamento de "corais bebês" no recife declinou 89% no ano passado.
Até onde os corais suportarão estresses térmicos associados às mudanças climáticas é uma questão incerta, dado a estimativa de aumento da frequência de eventos extremos nas próximas duas décadas.
Se as emissões de carbono continuarem no ritmo atual em um cenário sem mudanças ( business as usual ), o branqueamento ocorrerá duas vezes a cada década a partir de 2035, e anualmente após 2044, de acordo com os modelos climáticos da Unesco.
Segundo os cientistas, os corais branqueadospodem se recuperar se a temperatura voltar ao normal, mas esse processo pode levar uma década ou mais.Sem uma redução drástica de emissões, o destino desse ecossistema ganha contornos sombrios. E de tudo aquilo que ele suporta também.
Estendendo-se por mais de 2.000 quilômetros ao longo da costa do estado de Queensland, a Grande Barreira de Corais é composta por quase três mil pequenos recifes e mais de 900 ilhas no oceano Pacífico.
O paraíso natural é lar de 400 espécies de corais, 1.500 espécies de peixes, 4.000 espécies de moluscos e de animais em risco de extinção, como o peixe-boi e a tartaruga verde.