Metade dos alimentos vai para o lixo durante o transporte das lavouras até as cidades (Andrea Pistolesi/Getty Images)
EXAME Solutions
Publicado em 27 de julho de 2023 às 08h03.
Última atualização em 17 de outubro de 2023 às 13h06.
O Brasil está entre os dez países que mais desperdiçam comida no mundo: anualmente, 27 milhões de toneladas de alimentos vão parar no lixo, segundo a ONU. Cada brasileiro joga fora todo ano, em média, 60 quilos de alimentos ainda em boas condições para consumo. Nos supermercados, apenas em frutas, legumes e verduras, o país perde anualmente R$ 1,3 bilhão, conforme levantamento da ABRAS.
Enquanto isso, dados da Rede Penssan contabilizam 33 milhões de brasileiros passando fome ou insegurança alimentar, o correspondente a mais de 15% da população, o que agrava a situação.
Apesar dos números alarmantes, há um paradoxo: 85% dos brasileiros acham que combater o desperdício de alimentos no país é muito importante e 63% consideram a fome no mundo e no Brasil o desafio atual mais preocupante.
Os dados são do estudo O Alimento que Jogamos Fora, realizado pela MindMiners, empresa de pesquisa digital, em parceria com a Nestlé, que ouviu a população em geral e também donos e funcionários de estabelecimentos do setor alimentício.
O objetivo foi desenhar um panorama do desperdício alimentar no Brasil, medindo o impacto e a consciência sobre o problema e o quanto pessoas e empresas estão preocupadas e engajadas com o assunto.
Se somos tão conscientes sobre a questão, em teoria, por que então ainda descartamos tanta comida? “A conta não fecha”, diz o relatório.
A resposta talvez passe pela falta de informação sobre como reduzir de fato o desperdício. Porque quando avaliam a si mesmos, 64% dos indivíduos acham que estão fazendo a sua parte no combate ao problema e, entre os entrevistados de estabelecimentos comerciais, 66% também creem cumprir o seu papel.
Quem mais tem consciência são o público feminino, os mais velhos (especialmente os boomers, geração acima de 59 anos) e as pessoas com filhos. Isso indica que existe uma parcela da população mais sensível ao tema, sendo, portanto, peça-chave para uma mudança efetiva de comportamento.
Outro apontamento do estudo que ajuda a entender o cenário é onde o desperdício se concentra . Ao contrário do que se pensa, a maior fatia está antes de o alimento chegar à mesa do consumidor final: 50% acontecem durante o manuseio e transporte, 30% nas centrais de abastecimento, 10% no campo e outros 10% no varejo e nas residências.
No entanto, 75% das pessoas acreditam que o maior causador do desperdício de alimentos é a população. Para quem é dono ou funcionário de uma empresa do setor de alimentos, a percepção equivocada é a mesma: 66% colocam a população como a grande responsável.
A maioria dos brasileiros prepara suas refeições em casa, de acordo com o levantamento – 37% comem mais na residência do que fora e 35% apenas em casa. Somente 3% usam serviços de delivery com frequência, enquanto que 63% o fazem raramente ou nunca.
Esse perfil pode minimizar o desperdício porque permite que as refeições sejam planejadas, controlando porções e ingredientes, e as sobras sejam melhor aproveitadas, em outra refeição ou no preparo de uma nova receita. Mesmo assim, 82% das pessoas dizem que jogam alimentos fora em alguma medida.
Dentro de casa, a comida preparada é a que mais vai para o lixo, apesar de a maioria relatar que se planeja para comprar e preparar apenas o que será consumido na refeição ou naquele dia. Quando há sobras de comida, 59% guardam na geladeira para comer depois, 29% congelam e 25% fazem outra receita.
A classe C se sobressai na questão do planejamento, o que pode ter mais relação com a limitação financeira do que a conscientização sobre o desperdício. Por outro lado, a classe A é a que descarta alimentos com maior frequência.
Em relação às empresas, 96% afirmam descartar alimentos, e com bem mais constância: 54% o fazem frequentemente e sempre. As principais causas são as sobras de alimentos deixadas pelos clientes (49%) e produtos vencidos (36%).
Sobre os produtos com prazo de validade vencido, mas que aparentam estar bons, 64% das pessoas estão dispostas a consumir esses alimentos dependendo da situação.
Sete em cada dez respondentes se mostram atentos à data de validade, especialmente mulheres e quem tem filhos, e metade dos entrevistados diz fazer compras pelo menos uma vez por semana, o que permite comprar produtos próximos do vencimento, que têm preço mais baixo.
Já nas empresas, o cenário é diferente, já que não podem ser tão flexíveis quanto à validade. Além disso, utilizam mais critérios para o descarte, enquanto que a população é menos criteriosa, jogando fora apenas quando o produto está claramente estragado.
Nas residências, metade dos respondentes descartam os alimentos no lixo comum, quando isso deveria ser feito em lixo orgânico (destinado a restos de comida, cascas de frutas e afins). Nas empresas, o índice desse comportamento é bem menor, de 22%. Mais da metade, 55%, faz o descarte adequado.
No caso de quem faz as refeições fora, 41% costumam ir a restaurantes e 26% levam a marmita feita em casa. Também em restaurantes, não desperdiçar é uma preocupação: só 20% não se incomodam em deixar sobras no prato, apesar de essa ser uma situação que acontece às vezes com a maioria.
Um quarto dos entrevistados até deixa de pedir um prato se a quantidade de comida é maior do que o necessário.
Oito em cada dez dizem sentir raiva ou tristeza quando descartam alimentos ou presenciam alguém fazendo isso. Entre os empresários e colaboradores, a porcentagem também é alta, de 68%.
Além de planejar bem o cardápio e as compras para levar apenas o necessário, atentar-se ao prazo de validade dos alimentos e armazená-los corretamente para prolongar sua vida útil, é possível incorporar outras ações na rotina. Alguns exemplos: