Fachada do Gray's Papaya, que fechou as portas recentemente, é vista em 27 de janeiro de 2014 (Stan Honda/AFP)
Da Redação
Publicado em 28 de janeiro de 2014 às 21h35.
Nova York - Adeus, luzes de neon, frases espirituosas e variada fauna noturna: os amantes de cachorro-quente de Nova York se despediram de um dos lugares mais clássicos da cidade, no bairro de Greenwich Village, a mais nova vítima dos altos alugueis da cidade que nunca dorme.
O fechamento do Gray's Papaya - que, reza a lenda, era o lugar preferido do cantor Lou Reed - não é um caso isolado. A cada ano os nova-iorquinos descobrem, com tristeza, que lojas, bares e restaurantes considerados parte da história da cidade sumiram de um dia para o outro.
"Vou sentir saudade desse cachorro-quente da madrugada", disse à AFP Peter Coleman, um ator nova-iorquino de 28 anos, se referindo ao restaurante localizado na esquina da Sexta Avenida com a Rua 8, famoso pelo "especial da crise" - promoção de dois hot-dogs e um refrigerante por apenas US$ 4,95 (cerca de R$ 11,00).
"É triste ver outro lugar tradicional do bairro seguindo os passos da Ray's Pizza", lamentou Coleman, que trabalha na vizinhança, lembrando de uma pizzaria muito querida da região que fechou as portas há quase dois anos.
Outra fã do Gray's Papaya, a escritora e cineasta Ashbey Riley, prestou uma emocionada homenagem ao local na página do The Huffington Post. "Quase não lembro a primeira vez que meu pai me levou lá. eu devia ter uns três anos. Não importa. Gray's se tornou uma parte importante da minha vida. Gray's sempre esteve ali, a cada nova fase", escreveu.
Para o alívio dos amantes do cachorro-quente e da tradicional "papaya" - uma bebida feita com "os mágicos mamões dos trópicos" - a morte de Gray's, aos 28 anos de vida, não foi completa. Ainda existe uma filial da loja em funcionamento no Upper West Side, na Broadway com a Rua 72.
Público heterogêneo
A sede do Gray's Papaya, em Greenwich Village, ficava aberta 24 horas e tinha como principal característica a decoração espalhafatosa, com paredes cobertas por frutas de papel machê que iam até o teto e cartazes onde era possível ler frases espirituosas, citadas pelo fundador do estabelecimento. Além, claro, da clientela variada.
Localizado numa zona repleta de bares no sul de Manhattan, sua fauna era 100% Nova York: meninas de salto alto na saída da balada e pessoas sem teto que contavam moedinhas para comprar comida. Para os turistas que visitavam, era uma das experiências mais autênticas da vida na Big Apple.
A lanchonete já figurou seriados mundialmente famosos, como os cultuados "Sex and the City" e "How I Met Your Mother". Nas telonas, o Gray's aparece em "Os Selvagens da Noite", de 1979, e na comédia romântica de 1998 "Mensagem para Você", com Meg Ryan e Tom Hanks.
Citado pela imprensa local, Nicholas Gray, dono do local, confirmou que o motivo do fechamento foi o aumento abusivo do aluguel. "Queriam aumentar de US$ 30.000 para US$ 50.000", contou Gray.
NY desaparece
No blog "A Nova York que desaparece", o jornalista Jeremiah Moss catalogou as lojas e os restaurantes da cidade que fecharam as portas de 2001 a dezembro de 2013, e contabilizou uma perda de "6.926 anos de história da cidade".
Moss atribuiu grande parte da responsabilidade à administração do ex-prefeito Michael Bloomberg, que deixou o cargo no início de janeiro para dar lugar a Bill De Blasio, após governar a cidade desde 2002. "Foram 12 anos de destruição, desde perdas significativas até inúmeras 'pequenas', como lavanderias de bairro, sapatarias, farmácias", conta.
Em 2013, Moss cita a pizzaria e hamburgueria Big Nick's, que fechou depois de 51 anos no Upper West Side - o aluguel passou de 42.000 a 60.000 dólares por mês. Outra perda da cidade foi a loja de discos Bleecker Bob's Records, também vítima do aumento de aluguéis após 46 anos.
Neste 2014 que mal começou, a lista de perdas já é importante. Além do Gray's Papaya, o "Famous Oyster Bar", 55 anos de existência, e a boutique Camouflage, 38 anos, sucumbiram à guerra dos aluguéis.