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Em meio à pandemia do coronavírus, o show tem que continuar

Quarentena afetou não só músicos, mas toda uma cadeia de profissionais — em geral, terceirizados — que faz shows e eventos acontecerem

Shows: eventos musicais, assim como os de outra natureza, foram adiados por causa da pandemia do coronavírus (Ian Cheibub/Reuters)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 21 de maio de 2020 às 15h40.

Última atualização em 21 de maio de 2020 às 16h03.

No samba-canção Antonico, da década de 1950, o personagem criado por Ismael Silva pede ajuda ao Nestor, que, de acordo com a letra, diz "estar vivendo em grande dificuldade": "Ele é aquele que na escola de samba toca cuíca, toca surdo e tamborim". A paralisação das atividades culturais por causa do novo coronavírus expôs a vulnerabilidade de muitos Antonicos.

Não só músicos, mas toda uma cadeia de profissionais — em geral, terceirizados — que faz shows e eventos acontecerem: roadies, técnicos de som, iluminadores, camareiros, seguranças, carregadores, equipes de limpeza. Assim, empresas e músicos têm se organizado para que os trabalhadores da área possam ser socorridos — e para que o setor tenha fôlego para retomar suas atividades após a pandemia.

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Uma das iniciativas terá início nesta semana. O Nômade Festival vai colocar à venda os ingressos para sua terceira edição, prevista para ocorrer em 3 outubro.

A renda será destinada ao adiantamento do pagamento de profissionais que trabalham nos bastidores — o festival afirma gerar mais de 900 empregos diretos. Com a programação ainda em aberto, o Nômade anuncia Caetano Veloso e Elza Soares como suas primeiras atrações. Os dois artistas concordaram em assinar um contrato que prevê uma possível transferência da data, algo possível de acontecer.

"Em um primeiro momento, fizemos doação de alimentos. Porém, esses trabalhadores têm contas de água, luz para pagar. É uma questão humana ajudar quem sempre esteve conosco", diz Juliano Libman, da Agência InHaus, que, junto com Luiz Restiffe, comanda o Nômade.

De acordo com as projeções da empresa, a venda de 350 ingressos, por exemplo, pagaria equipe de limpeza, que tem cerca de 50 pessoas. Para pagar os 140 seguranças, seria necessário vender 459 ingressos. Outros 400 garantiram 50% dos cachês de toda a equipe técnica.

Os ingressos custam 40 reais em meia-entrada — a modalidade representa 70% ou mais das vendas, segundo Restiffe, que afirma que haverá uma fiscalização por parte da agência para que o dinheiro seja distribuído pelas empresas parceiras para o pagamento dos trabalhadores.

"Será feito um contrato para que haja transparência", diz. Ele também garante que a empresa é saudável o suficiente para fazer o festival acontecer lá na frente.

Outra preocupação da produtora é que o mercado continue vivo para quando tudo voltar à normalidade (ou ao chamado novo normal). "As pessoas vão querer ir a eventos, shows, teatro e cinema depois de tanto tempo em casa", acredita Libman.

Apesar do otimismo, a agência aguarda as orientações das autoridades para confirmar a realização dos eventos nas datas previstas e a capacidade de pessoas que será permitida.

Eles usam como base uma minuta da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo elaborada depois de uma rodada de conversas com profissionais do mercado. O documento cita quatro fases para a retomada das atividades culturais.

A primeira aconteceria 45 dias após o dia considerado como pico da epidemia no estado (data ainda indefinida), e permitiria eventos com 35% do total do público, para municípios com menos de 50.000 habitantes. Já a cidade de São Paulo poderia retomar os eventos 90 dias após o pico, também com 35% da capacidade — e seguindo protocolo de higiene. A liberação do público total só aconteceria 165 dias após o pico da doença.

Apesar da existência desse documento, a Secretaria de Cultura e Economia Criativa informou ao Estadão que o planejamento para a retomada progressiva e segura das atividades ainda está em processo de elaboração pelo governo de São Paulo.

"Os requisitos para a flexibilização vão se basear em critérios técnicos que incluem, como fatores principais, a redução sustentada dos números de novos casos de covid-19 por 14 dias e a manutenção da ocupação dos leitos de UTI em patamar inferior a 60%. As medidas são semelhantes às adotadas por países como Estados Unidos, Alemanha, Áustria e China. A quarentena está mantida até 31 de maio", diz a nota.

Ajuda aos independentes. Entre 30 de abril e 3 de maio, Devassa Tropical Ao Vivo — O Festival dos Festivais reuniu virtualmente, em quatro dias, 34 atrações que representaram oito festivais de diferentes regiões do país. Nomes como Mallu Magalhães, Francisco El Hombre, Chico César, Jards Macalé e Tulipa Ruiz se apresentaram para angariar fundos que serão divididos entre os produtores de cada festival. Foram arrecadados 70.000 reais.

Outro projeto, o Conexão Música, teve como origem um post do pianista e compositor Benjamim Taubkin. Ele alertava para a questão de que muitos colegas de profissão, além de produtores, agentes, roadies e técnicos, estavam passando por dificuldades neste momento de atividades suspensas.

Taubkin se juntou a outros nomes da música, como o guitarrista Nelson Faria e a cantora Socorro Lira, e pretende, por meio de doações, distribuir três parcelas de 150 reais mensais consecutivas para os profissionais do setor.

As contribuições podem ser feitas pelo conexaomusica.com.br. Nesse mesmo endereço será possível, a partir de 25 de maio, fazer um cadastro para se candidatar ao auxílio — o profissional deve ter documentos que comprovem que exerce alguma função ligada à música. Lançado no dia 12 de maio, o projeto recebeu, nos dois primeiros dias, 100 doações.

"Esse movimento é um alerta aos músicos e produtores, para que eles se unam", diz Taubkin. O projeto não tem uma meta de arrecadação, só o desejo de que haja o suficiente para ajudar o maior número possível de profissionais. "Manter essa campanha viva, ao logo do tempo, é o nosso maior desafio", completa. A expectativa é que o pagamento do auxílio comece até o fim de maio.

Os músicos do Samba do Trabalhador, cujas apresentações são lideradas pelo compositor Moacyr Luz, estão igualmente mobilizados para ajudar todos aqueles que fazem o espetáculo acontecer.

Sem as apresentações presenciais — realizadas há 15 anos, toda segunda-feira, no Clube Renascença, na zona norte do Rio de Janeiro —, o dinheiro da entrada, que pagava a turma toda, parou de entrar. A solução foi uma vaquinha virtual ( vaka.me/ 1052539 ), que pretender arrecadar fundos para pagar músicos, produtores, seguranças, bilheteiros, entre outros profissionais.

Enquanto as apresentações presenciais do Samba do Trabalhador não voltam, os fãs podem curtir as lives realizadas no dia já consagrado pelo grupo: às segundas-feiras, a partir das 17h, com um elenco formado por Luz, Alexandre Marmita, Negro Álvaro, entre outros. As lives são divulgadas no perfil de Moacyr Luz no Instagram: @moaluz.

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