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Descubra quais aspectos treinar para uma maratona

Avaliação no Marathon Support Unit (MSU) destaca o que deve ser turbinado no treinamento para chegar ao recorde pessoal nos 42 km


	Maratonas: laboratório recebe corredores amadores que querem turbinar o desempenho na corrida
 (Getty Images)

Maratonas: laboratório recebe corredores amadores que querem turbinar o desempenho na corrida (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 29 de setembro de 2014 às 10h35.

São Paulo - Depois de uma maratona, há uma pergunta inevitável: “Será que eu poderia ter ido mais rápido?”.

Em busca dessa resposta, resolvi apelar para a ciência da fisiologia e passar por uma avaliação no Marathon Support Unit (MSU), da Universidade de Brighton, na Inglaterra.

Até há pouco tempo, instalações como as que encontrei por lá eram exclusividade do atletismo de elite. Paula Radcliffe, quando jovem, procurou o laboratório de ciência esportiva dessa universidade em busca de uma avaliação precisa.

A boa notícia é que a unidade agora recebe corredores amadores como eu, que querem turbinar o desempenho na corrida.

A MSU é dirigida por Alex Bliss, fundador e fisiologista-chefe da instituição. Ele é especialista em determinar o perfil de atletas. “Esse tipo de avaliação geralmente é reservado a atletas de elite, devido ao custo. Mas, como a MSU dá experiência a cientistas esportivos em treinamento, que ajudam nas avaliações, isso compensa parte dos custos”, afirma.

Seduzido pela promessa de que a ciência me faria alcançar todo meu potencial — e o recorde na maratona —, eu me inscrevi no programa.

Corro há 15 anos, já fiz duas provas de 42 km e normalmente fazia quatro treinos semanais: um de velocidade, um tempo run (ritmo), uma corrida de 5 km e um longão de 20 a 32 km em trilha. E esperava bater meu tempo de 3h54, da Maratona de Brighton de 2010.

O plano

Três elementos do meu desempenho seriam avaliados em outubro de 2012 — e cada um deles, eu esperava, seria aperfeiçoado por um treino personalizado: VO2 máximo (captação máxima de oxigênio), economia de corrida (oxigênio necessário para correr em velocidades abaixo do VO2 max) e limiar de lactato (captação de oxigênio necessária para manter um nível baixo de lactato sanguíneo).

Três meses depois, fiz novos testes e recebi outra planilha. Depois disso, duas semanas antes da prova (em abril), veio uma bateria final de exames para identificar em que ponto estava nesse início de polimento (redução no volume de treino).

O programa incluiu seminários sobre nutrição e prevenção de lesões, mas a parte principal se dividiu em testes e treinos ligados a estes três parâmetros: VO2 max, economia de corrida e limiar de lactato.

Testes de fogo

1. Limiar de lactato: É o mais importante dos três marcadores para maratonistas e, espera-se, o mais fácil de melhorar como treino. "O limiar de lactato é o ponto em que essa substância começar a se acumular no sangue", explica Bliss. "Geralmente, corresponde a cerca de 70% da captação máxima de oxigênio [VO2 max] em uma pessoa bem-treinada."

Importância - “O lactato não provoca fadiga, mas seu aumento no sangue mostra que o corpo está ficando mais dependente da produção de energia anaeróbica [sem oxigênio] do que da aeróbica [com oxigênio]”, explica Bliss. “Trabalhar em condições anaeróbicas altera o pH do sangue, e, quando o lactato começa a se acumular na corrente sanguínea, fica mais difícil manter a intensidade do exercício.”

Como maratonistas tendem a correr em velocidades próximas ao limiar de lactato, detectar esse limiar pode ajudar a identificar áreas de aperfeiçoamento e prever o desempenho.

Exame laboratorial - Os exames de limiar de lactato duraram de 15 a 25 minutos. Eu usei um monitor de frequência cardíaca e um bocal para coletar os gases expirados, e comecei a correr em ritmo constante.

A cada 3 minutos, uma amostra de sangue era colhida. E a velocidade era aumentada em 0,8 km/h. Eu me exercitei até cerca de 80% de esforço máximo, até que um pico de lactato sanguíneo foi detectado, revelando meu limiar e ajudando a prever um tempo possível para a maratona.

Estou acostumado com subidas e treino de velocidade, mas achei o teste puxado. Tentei não prestar atenção em como minhas pernas estavam pesadas e me concentrei no relógio.

Resultados - Meu limiar de lactato foi alcançado por volta de 9,8 km/h, quando minha frequência cardíaca era de 158 bpm (batimentos por minuto). Um rápido cálculo mostrou que a 6min/km eu terminaria a maratona em 4h13.

Para alcançar a meta de 3h45, eu deveria elevar o limiar para até 11,25 km/h.

Então, no teste seguinte, Bliss esperava que meu limiar já chegasse em cerca de 10,6 km/h, o que mostraria evolução.

Como melhorar - É preciso treinar para ficar próximo do limiar de lactato. “Você dá um estímulo de treino ao qual seu corpo terá de se adaptar e superar”, explica ele.

Uma maneira de conseguir isso é com uma ou duas corridas semanais em cerca de 70% a 80% da FCM máxima. Comece tentando manter esse ritmo por 20 a 30 minutos e, em seguida, aumente a duração. Para mim, isso seria correr em ritmo de 5min12/km e entre 155 e 167 bpm.

Autoteste - É possível estimar seu limiar de lactato com uma corrida contra o relógio. Aqueça e corra no ritmo mais rápido que puder manter durante 30 minutos. A frequência cardíaca média nos 10 minutos finais será uma estimativa do seu limiar de lactato.

2. VO2 Max: "O VO2 max, ou captação máxima de oxigênio, é a quantidade máxima de oxigênio que o atleta consegue utilizar em 1 minuto", afirma Alex Bliss. "Geralmente, ele é expresso 'em relação' à massa corporal do atleta, ou seja, em mililitros de oxigênio por quilo de corpo, por minuto (ml/kg/min)."

Importância - O VO2 max permite comparações diretas e fáceis com outros números. Todavia, embora os atletas de elite de resistência costumem ter valores altos de VO2 max, ele é um fraco fator preditivo da capacidade de aguentar eventos mais longos, como a maratona.

Ou seja: o atleta que tem o maior valor deVO2 máximo nem sempre é o que tem o melhor tempo de corrida. Um número alto é mais relevante para provas curtas e de mais velocidade.

Basicamente, não se pode correr em ritmo muito difícil durante os 42 km. “Mas um VO2 max alto é útil para identificar em que percentual doVO2 max está o limiar de lactato. Os corredores de elite de maratona elevam o limiar de lactato até cerca de 90% do VO2 max”, afirma Bliss.

Exame laboratorial - Mais uma sessão difícil em esteira, com um bocal coletando o ar expirado. Começando em ritmo rápido, a intensidade foi aumentado a cada minuto.

Bliss me estimulou a usar todas as minhas forças enquanto meus músculos queimavam e, embora eu estivesse um pouco preocupado em acabar o exame totalmente exausto, eu também me sentia curiosamente motivado a explorar os limites mais profundos da minha resistência. No fim, eu estava completamente esgotado.

Resultados - O desgaste foi intenso, mas valeu a pena. Meu esforço de 11 minutos me fez alcançar um VO2 max de 55,32 ml/kg/ min.

Nem sombra dos 80 a 90 ml/kg/min típicos da elite, mas bem acima da média. Todas as corridas em subida que fiz compensaram o esforço. Ainda assim, Bliss queria pelo menos uma melhora de 5% nos exames de janeiro.

Como melhorar - Embora a genética desempenhe um papel significativo na nossa capacidade de VO2 max, podemos alcançar nosso melhor com treinos.

“Como esse parâmetro é medido em relação ao peso corporal, uma mudança de alguns quilos pode ajudar”, afirma o pesquisador. “E treinos intervalados difíceis e repetições em subida feitos regularmente, com 90% do esforço, mostraram melhorar oVO2 max.”

Para mim, isso significava corridas intervaladas curtas na pista de atletismo, elevar a frequência cardíaca para mais de 167 bpm e quilômetros consecutivos em ritmo de 5min12/km.

Autoteste - O Teste de Cooper, usado pelo Exército dos Estados Unidos, é uma maneira de estabelecer o VO2 max fora dos laboratórios. Aqueça e corra quantas voltas conseguir em uma pista de 400 metros, em 12 minutos, buscando manter um ritmo constante. Então, calcule a distância que você percorreu em metros, subtraia 504,9 e divida o resultado por 44,73 para saber seu VO2 max em valor absoluto.

3. Economia de corrida: É a quantidade de oxigênio que o atleta está usando em determinada velocidade. Quanto mais eficiente a corrida, melhor a economia. É como medir a eficiência do combustível em um carro, mas o "combustível" é o oxigênio. "Para corredores amadores, medimos a economia de corrida em mililitros por quilo de peso corporal por quilômetro percorrido - uma medida amplamente usada e independente da velocidade".

Importância - “Assim como o limiar de lactato, essa é uma característica fisiológica importante para atletas de resistência”, afirma Bliss. “A economia depende não só de fatores fisiológicos, como a captação e uso de oxigênio, mas também da mecânica de corrida e da qualidade do movimento.”

Exame laboratorial - De novo, corri na esteira e os gases expirados foram coletados e analisados. Bliss mediu a quantidade de oxigênio que eu consumi, depois usou meu peso e velocidade na qual estava correndo para calcular minha economia de corrida.

Resultados - Com 227 ml/kg/km, minha economia de corrida foi meu indicador de desempenho mais fraco dentre os três parâmetros testados no MSU. “Um escore de 200 ml/kg/km é considerado ‘mediano’ para amadores, sendo cerca de 170 ml/kg/km considerado excelente”, afirma Bliss.

Como melhorar - É difícil. De modo geral, ela deveria melhorar com o aumento no volume semanal de treino. Entretanto, pesquisas indicam que o treino de alta intensidade, com poucas repetições, também pode melhorar a economia de corrida.

Simplesmente correr mais e tentar ser mais eficiente do ponto de vista biomecânico — focando em uma postura mais ereta ou balançando os braços com mais vigor, por exemplo — também deveriam melhorar naturalmente a eficiência de corrida.

Minha planilha mandava aumentar a quilometragem: dez semanas de longões aos domingos em ritmo constante de 6min/km, mantendo a frequência cardíaca abaixo de 155 bpm.

Autoteste - Dos três parâmetros, este é o mais difícil de reproduzir fora do laboratório. Mas você pode tentar: faça uma corrida de 5 km regular e anote os tempos. Busque um padrão e tente considerar fatores que possam afetar a economia de corrida, como vento forte.

Novos testes, nova planilha

Após os exames iniciais em outubro, meu treino foi dividido em “zonas de intensidade”, com base na frequência cardíaca.

Na primeira semana, foram 37 km e um treino em pista, seguido de um “pico” de mais de 54 km na sétima semana, com redução para 32 km na semana anterior ao novo exame.

Não deixei de fazer nenhum treino e tanto minha corrida de 5 km semanal como o treino em pista me mostraram que eu ficava mais rápido.

Nos novos exames em janeiro eu me sentia mais forte e leve (havia perdido 2 kg). O primeiro parâmetro testado foi meu limiar de lactato, que parecia bom: entre o primeiro exame e o de janeiro, a velocidade no limiar passara de 9,8 para 11,4 km/h.

A frequência cardíaca no limiar do primeiro teste foi de 158 bpm (mas, a 11,4 km/h naquele primeiro teste, a frequência cardíaca chegou a 167 bpm).

No segundo teste na mesma velocidade, em meu novo limiar de lactato, a frequência foi de 164 bpm.

A quantidade de sangue que meu coração podia bombear, também chamado de “volume sistólico”, havia aumentado, o que refletia que meu músculo cardíaco havia se adaptado e ficado mais eficiente.

O segundo teste foi o temido VO2 max. Cravei os dentes no protetor bucal para a “corrida para o inferno”, mas os resultados mostraram uma estabilização e não uma grande melhora — e, como eu estava um pouco mais leve, meu máximo foi de 53,96 ml/kg/min. Bliss acreditava que, ainda assim, eu poderia ter mais benefícios.

Por fim, a economia de corrida. Para minha felicidade, era nesse quesito que eu havia feito a melhora mais significativa, passando de 227 ml/kg/km para 190 ml/kg/km.

Então, em velocidade de corrida de 11,4 km/h, meu uso de oxigênio havia diminuído dramaticamente, de 3 para 2,31 litros por minuto. E esse resultado mostrou que minhas corridas lentas e em ritmo constante estavam funcionando.

Em resposta a essas melhoras, Bliss ajustou minhas zonas de treino. Minha Zona 1 constante era agora de 5min44/km e 157 bpm, enquanto a Zona 2 ficou mais puxada, com 5min13/km e 157 a 164 bpm. Já a Zona 3 foi de ritmo de 5min/km e mais de 170 bpm.

Meus treinos rápidos continuaram melhorando e os 5 km que eu fazia em 24min20, quando comecei o programa, consegui fazer em 21min51. Eu me sentia mais forte e recuperado após cada treino.

Sentia uma dor súbita e leve na parte de trás da coxa direita, um possível indicador de muitos treinos de velocidade e muito intensos. Mas consegui alívio com alongamento. Na Meia Maratona de meados de fevereiro, minha meta era 5min/km.

E eu terminei tão bem, em 1h45, que parecia que tinha energia armazenada.

No terceiro teste, meu limiar de lactato estava bastante positivo de novo, com a velocidade no limiar tendo melhorado de 11,4 para 12,2 km/h.

No segundo teste, a frequência cardíaca em 12,2 km/h havia sido de 170 bpm, mas no terceiro exame, na mesma velocidade (meu novo limiar de lactato), a frequência foi de 161 bpm, o que mostrou melhor adaptação cardíaca.

Entretanto, Bliss ficou mais satisfeito com meu VO2 max, que mudou de 54 ml/kg/min para 58,5 ml/kg/min.

Embora minha economia de corrida não tenha melhorado, ele acreditava que os bons resultados nos outros dois fatores iriam compensar esse componente físico no dia da prova.

Os números indicavam que eu podia correr em 3h28, mas, se eu fosse conservador, o tempo seria de 3h32.

A prova

Meu corpo estava em ponto de bala quando pisei na linha de partida, mas a cabeça... Minha mente estava presa ao modo pré-MSU, fixada em 3h45 apesar de toda a melhora que eu tinha conseguido.

Nos primeiros 10 km, fiquei pouco acima de 5min/km. A corrida parecia fácil, revigorante, mas, de certa forma, impossível de ser mantida. Então, diminuí o ritmo. Meu relógio marcava 1h46min17 na metade do caminho e eu me sentia forte. Mas especialmente pressionado.

Os dados laboratoriais sinalizavam que eu poderia acelerar sem quebrar, mas aquela vozinha de alerta na minha cabeça insistia para que eu continuasse pisando no freio.

Resolvi ignorar as precauções e acelerei. Não ousei olhar meu GPS até cruzar a linha de chegada e ver os dígitos 3h41min12. Missão cumprida! Eu estava em êxtase.

Tinha uma meta e consegui superá-la. Está certo, Bliss acredita que eu poderia ter sido ainda mais rápido e os dados dão respaldo a essa opinião. Mas é difícil ser muito duro consigo mesmo quando se consegue reduzir 13 minutos do recorde pessoal.

Acho que essa experiência me trouxe benefícios que se manterão em longo prazo.

Eu tenho um programa feito sob medida, testado no asfalto, que pode manter minha corrida consistente por vários anos.

Aprendi que um treino mais estruturado dá resultados. Agora sei que meu corpo é capaz de correr mais rapidamente. Tudo que eu tenho de fazer é convencer meu cérebro a ter um pouco mais de fé. Dicas de um bom psicólogo esportivo?

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