Valter Gonçalves filho, da Totvs: “viajo muito e seria inviável ir até a escola toda semana” (Fabiano Accorsi/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 19 de março de 2013 às 13h23.
São Paulo - Nos últimos dois meses, a movimentação de seis das principais universidades americanas aqueceu a discussão sobre o futuro da educação e os sistemas de aprendizado online e a distância. Em abril, as universidades Stanford, Princeton, Michigan e Pensilvânia anunciaram uma parceria para o desenvolvimento de uma plataforma conjunta de cursos gratuitos online, a Coursera.
Menos de um mês depois, a Universidade Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT) anunciaram o edX, projeto que disponibilizará conteúdos gratuitos pela internet de algumas disciplinas de cursos da graduação presencial de ambas as instituições.
“Vislumbramos um futuro em que as melhores universidades estarão educando não só milhares de pessoas, mas milhões. Nossa tecnologia permite que os melhores professores ensinem dezenas ou centenas de milhares de estudantes. Esperamos dar a todos o acesso à educação que tem sido até agora disponível apenas para um grupo seleto”, diz o site da Coursera.
A entrada das universidades americanas de renome indica que a educação disseminada pela internet está ganhando novas proporções. No mundo moderno, não é possível ignorar o ensino por meio da internet ou de TV como opção para quem deseja adquirir conhecimento. No Brasil, segundo dados da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), dos mais de 6,5 milhões de estudantes universitários brasileiros, aproximadamente 2,7 milhões estão matriculados em cursos a distância.
As iniciativas de maior destaque no Brasil são o Veduca, portal que oferece videoaulas de universidades estrangeiras com legendas em português, e a Univesp TV, uma parceria entre as universidades públicas paulistas (USP, Unesp e Unicamp), que oferece cursos formais e livres. Entre profissionais brasileiros que fazem pós-graduação, a educação a distância, também conhecida como EAD, já é uma opção importante.
Segundo o último censo da Abed, realizado em 2010, 37% dos alunos de pós e Master in Business Administration (MBA) optam por um programa feito por meio da internet. “Para as escolas de negócio, a era digital é uma revolução educacional”, diz Olavo Henrique Furtado, coordenador dos cursos de pós-graduação da Trevisan Escola de Negócios, de São Paulo.
A procura por programas e especializações nessa modalidade de ensino ocorre por diversos motivos. Há pessoas com carreira executiva que desejam aprimorar seus conhecimentos e encontram nos cursos remotos a única opção viável para conciliar estudo com uma agenda apertada.
“Viajo muito e seria inviável ir até uma escola toda semana”, diz Valter Sanches Gonçalves Filho, de 33 anos, analista de canais da Totvs, fornecedora de software de gestão com sede em São Paulo.
Ele precisava do MBA para aumentar o conhecimento em administração e assim crescer dentro da empresa. Valter optou por um MBA a distância do Ibmec, escola que só oferece cursos presenciais em Brasília, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. “O ensino a distância elimina a questão do deslocamento”, diz o analista.
O EAD amplia as opções de quem quer estudar mas não está disposto a arcar com os custos de um curso presencial. No caso dos MBAs, os programas similares a distância chegam a ter metade do valor dos convencionais.
A pós-graduação realizada por meio eletrônico também cresce entre os profissionais que vivem em centenas de cidades brasileiras de médio porte, onde já existem organizações e negócios que demandam especialização, mas faltam programas presenciais.
É o caso de Franciele Brol, de 26 anos, analista de controles da CVi Refrigerantes, fabricante franqueada da Coca-Cola, de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Formada em agronegócios e pós-graduada em engenharia da produção, Franciele foi promovida e sentiu necessidade em ampliar sua base teórica em gestão.
Procurou na cidade onde mora e não encontrou um curso adequado a seu objetivo. “Recorri aos programas a distância para aumentar minhas opções”, diz Franciele, que participa do MBA em gestão estratégica de negócios na Unisinos, instituição que fica em São Leopoldo, também no Rio Grande do Sul, mas a quatro horas de carro de Santa Maria, onde Franciele mora.
No Brasil, ainda existem dúvidas a respeito da qualidade da oferta. Por medo de comprar um produto ruim, muita gente deixa de fazer um curso virtual. No mercado de trabalho, os cursos a distância ainda são vistos com reservas. Quem contrata tem desconfiança a respeito da profundidade de um programa feito de longe.
“Algumas experiências que o aluno teria numa sala de aula não são reproduzidas na modalidade online”, diz Johannes Castellano, diretor de recursos humanos da Azul, companhia aérea com sede em Campinas, no interior de São Paulo.
As próprias escolas de negócio reconhecem que o programa virtual ainda precisa de aprimoramentos. “Ainda estamos na fase de adaptações, mas é importante entender que a tecnologia veio para ficar”, diz Olavo Furtado, da escola Trevisan.
A falta de proximidade entre aluno e professor tem um lado negativo. Para Armando Dal Colleto, diretor acadêmico da Business School São Paulo (BSP), que oferece cursos presenciais, o debate sobre os temas abordados é indispensável para a consolidação de conceitos e é difícil de ser organizado ou reproduzido virtualmente.
“Um professor que tenta decorar tudo o que precisa passar para o aluno nunca vai ser melhor do que um vídeo estruturado e produzido com todo o cuidado técnico para tratar de um tema específico. Por outro lado, não há vídeo que consiga estimular uma discussão produtiva”, diz Armando. “Em um debate em sala de aula se aprende a sustentar argumentos, coisa que um executivo vai precisar muito na carreira.”
O receio das grandes empresas brasileiras vem diminuindo nos últimos anos. Isso ocorre porque o EAD tem se mostrado um recurso eficiente para levar conhecimento a uma mão de obra espalhada por vários pontos do país. Existem cerca de 2 300 universidades corporativas no Brasil e grande parte delas usa meios eletrônicos para ensinar funcionários, oferecendo até mesmo graduação e pós-graduação.
Para Judy Olian, reitora da Anderson School of Business, MBA da Universidade da Califórnia em Los Angeles (Ucla), EAD e qualidade de ensino são duas discussões que não devem ser misturadas. “Online é uma coisa, qualidade é outra”, diz Judy, em entrevista à VOCÊ S/A.
“Se o conteúdo tiver qualidade, o aluno será bem atendido tanto em sala de aula quanto pela internet. Se a qualidade não for boa, o conteúdo não vai funcionar em nenhum método.” Para quem está na dúvida, vale reforçar ainda que o certificado dos programas não discrimina a maneira como eles foram cursados — o diploma do online é igual ao do curso presencial.
Mais dedicação
Distante do olhar do professor e sem a obrigação de se apresentar em sala de aula semanalmente, o curso online exige uma dose maior de disciplina. “O aluno assume um papel mais ativo na aprendizagem”, diz Marisa Eboli, professora da Fundação Instituto de Administração (FIA), de São Paulo, uma das principais especialistas em educação corporativa do Brasil. “Na frente do computador, a disposição da pessoa conta tanto quanto o material oferecido.”
Segundo especialistas, o curso a distância exige que o aluno estude diariamente para acompanhar o programa, tempo que muitas vezes acaba por superar as horas exigidas em um programa presencial. “No online você estuda sozinho, e isso exige mais atenção”, diz Valéria Kessel, de 39 anos, gerente de projetos na empresa de tecnologia IT Convergence, de São Paulo, que gastava de uma a duas horas por dia para estudar.
“Mesmo viajando, eu estudava à noite no hotel, lia o material, assistia às aulas e fazia os exercícios”, diz ela, que fez um MBA em gerenciamento de projetos pela FGV Online, plataforma de cursos de EAD da Fundação Getulio Vargas.
Vale dizer que muitos profissionais que fazem curso presencial reclamam de perder tempo com discussões desnecessárias em sala de aula, coisa de que o EAD os poupa. “Numa sala de aula, o corpo do aluno está presente, mas não necessariamente sua cabeça está ali”, diz Nivaldo Marcusso, diretor acadêmico de educação a distância da Universidade Anhembi Morumbi, de São Paulo
Para defensores do EAD, a troca de experiências entre os participantes é garantida por meio dos fóruns de discussão e do bate-papo virtual. “As ferramentas criam relacionamentos mais objetivos, pois todo mundo está ali para aprender, e essa interação se fortalece nos encontros presenciais”, diz Stavros Xanthopoylos, diretor da FGV Online.
Uma vantagem sobre a aula presencial é a oportunidade de interagir com profissionais de qualquer parte do país. “Isso amplia a visão de negócios em diferentes regiões”, diz Marisa Eboli.
A oferta de ensino a distância não se limita a pós-graduação e MBA. Há uma quantidade ainda maior de cursos de curta duração que podem ser acessados por interessados em desenvolvimento profissional. Vale a pena considerá-los por dois motivos. Primeiro, para experimentar o EAD e ver se ele se encaixa em seu perfil de estudante.
Além disso, o curso digital é uma alternativa para quem pretende adquirir conhecimento e acelerar a carreira, mas está sem horário ou dinheiro para investir num MBA presencial. Afinal, o ensino online não diminui apenas a distância — o tempo também.